Alan Rios
postado em 12/05/2019 08:00
É almoço de Dia das Mães. Cada parente leva um prato e aproveita para distribuir presentes e abraços às homenageadas da família. A cena comum a cada segundo domingo de maio será repetida hoje por Sueli Silva, 56 anos, mas de uma forma bem diferente. A mãe reencontrou Ricardo Araújo 38 anos depois do dia em que ele foi tirado de seus braços, na porta do Hospital Regional do Gama (HRG). Agora, ela passará a data com ele e seus outros dois filhos, finalmente reunidos. ;Será o melhor Dia das Mães que já tive!”, celebra.
Sueli, Ricardo, Julia Christina Gomes, 23, e Marco Antônio Gomes, 21, já se preparam com ansiedade para a reunião de toda a família de Brasília neste domingo. Só não foi possível juntar cada parente porque o número cresceu recentemente: ;Agora também sou avó, já que conheci os três filhos do Ricardo, mas eles ficaram na Paraíba por causa da escola;, contou a goiana. Quem está na capital vai para Águas Claras, no apartamento onde mora uma das quatro irmãs de Sueli, que receberá a festa.
;Estou me sentindo a mãe do ano, com o bebê do ano! E esse vai ser um dia muito especial, porque vamos reunir toda a família, as tias do Ricardo, os tios, os primos, os sobrinhos; Estou muito feliz e emocionada! Parece até que o tempo com ele está voando;, brinca. O sentimento não poderia ser outro, já que a história da pedagoga com os filhos teve episódios tristes antes do final feliz. A primeira gravidez de Sueli aconteceu quando ela era uma adolescente de 15 anos e sofria abuso sexual por parte do filho da dona do abrigo em que morava. O estuprador não assumiu a criança, mas Sueli deu nome à pequena Juliana e decidiu criá-la com todo amor que não havia recebido.
A menina nasceu em 1979 e ficou com a mãe na instituição na qual vivia. Um ano depois, a goiana engravidou de um ex-namorado, mas só soube do bebê depois que o homem se despediu, rumo aos Estados Unidos. Determinada a criar mais uma criança sozinha aos 17 anos, em fevereiro de 1981, nasceu Luís Miguel, nome escolhido pela mãe. ;Lembro de ficar olhando as mãozinhas dele, os pezinhos; Era um sonho.;
Dois dias depois do nascimento, veio mais um episódio violento. Uma funcionária do abrigo no qual Sueli morava tirou o pequeno do seu colo e desapareceu com a criança depois de dizer à mãe que ela não teria condição de criar o bebê. Aflita, a jovem não entendia o que estava acontecendo e ninguém respondia suas perguntas. Foram 38 anos de silêncio.
Fim da espera
Sueli ficou quase quatro décadas passando o Dia das Mães sem saber onde estava o filho. Nesse período, algumas pessoas disseram que era para ela esquecer o garoto, que ele poderia, inclusive, estar morto. Além da dureza dessa possibilidade, a realidade também não foi doce com a mulher. Em 1996, ela perdeu Juliana: ;Ela faleceu quando tinha 15 anos, devido a uma asfixia de glote por alergia à medicação. Naquele mesmo ano, conheci o céu e o inferno. Em janeiro, nasceu a minha outra filha, Júlia, e, em julho, a Juliana se foi. Hoje, tenho um casal lindo, uma boneca de 23 anos e um filho de 21 que adora jogar futebol;, conta. Sempre que os dois ouviam a história da mãe, alimentavam esperanças de conhecer o irmão desaparecido.
Quando chegou a notícia de que o bebê, agora um homem, havia sido encontrado, foi uma festa. ;Achei que eu era a filha mais velha, aí ele apareceu e mudou tudo, para melhor. Quando nos vimos, nos abraçamos como se a gente se conhecesse desde sempre;, comemorou Julia Christina. O nome escolhido por Sueli ficou para trás, mas sem ressentimentos. Luís Miguel foi registrado como Ricardo, nome falado com emoção pelos familiares que o conheceram apenas este ano. A tia Suelma Gomes, 51, não aguentou nem esperar a reunião de hoje e buscou o sobrinho no aeroporto na semana passada. ;Chegou uma hora em que a gente não imaginava mais que poderia encontrá-lo, então, foi muito emocionante vê-lo chegando a Brasília com a minha irmã. E eu também tenho um filho que se chama Ricardo, então, esse momento é incrível!”, vibrou a cozinheira.
Se depender de Suelma, o sobrinho terá mais um motivo para se apaixonar pelos ;novos; parentes. ;Quero fazer uma comida especial para ele, perguntar o que ele gosta e caprichar;, disse. Sueli contou que o almoço será inesquecível para o filho, já adiantando que o cardápio terá pernil, bacalhau, salpicão e muito mais. Ricardo, então, nem se aguenta de ansiedade. Brincando que já entregou o presente de Sueli, que é ele mesmo, o corretor de imóveis acredita ainda em motivação divina para poder estar ao lado da mãe em uma data de celebração da maternidade. Em dezembro do ano passado, ele perdeu a mãe de criação em um acidente de trânsito, na Paraíba.
;Eu creio que tudo em nossas vidas está escrito por Deus. Se nossa história tinha que acontecer assim do jeito que foi, tudo bem. Eu aceitei isso e sempre acreditei que Ele tem um propósito na vida para cada um de nós. Faz seis meses que perdi minha mãe de criação e agora tenho minha mãe biológica, então acho que tudo estava conspirando para isso acontecer;, se emocionou. Outro fato que mexe com Ricardo é ser acolhido por uma nova família: ;Não vejo a hora de juntar todo mundo, nos abraçarmos e fazer uma foto, que será histórica;, garantiu.