Cinco policiais militares, que deveriam prestar serviços à segurança pública, foram denunciados à Justiça por cobrar propina para fazer vista grossa a irregularidades no transporte pirata no Paranoá e Itapoã. De acordo com a ação penal que tramita na Auditoria Militar do Distrito Federal, um major, três sargentos e um soldado faturavam aproximadamente R$ 30 mil por mês exigindo dinheiro de ;loteiros;, motoristas em situação irregular. Quem pagava tinha vida tranquila. Circulava livremente sem repressão policial. Quem se recusava a atender à chantagem era alvo dos rigores do Código de Trânsito Brasileiro.
A investigação foi conduzida pela Corregedoria da Polícia Militar, e os policiais militares estão afastados do policiamento ostensivo, designados a trabalhos burocráticos. Eles foram alvos de mandados de busca e apreensão em casa, em 4 de setembro do ano passado, quando os investigadores encontraram na residência de um dos envolvidos anotações sobre placas, que seriam a contabilidade do esquema. Seriam veículos que circulavam amparados na proteção da PM.
Ao longo da apuração, houve também interceptações telefônicas, com autorização judicial, que reforçaram as suspeitas de que havia a exigência de pagamento no transporte irregular entre 2016 e 2018, no governo anterior. No dia da busca e apreensão, os policiais foram presos, mas liberados pouco tempo depois pela Justiça.
Esquema
Na denúncia, o promotor de Justiça Nísio Tostes aponta que o major Nelimar Nunes de Sousa, ex-subcomandante da Seção Operacional do II Comando de Policiamento Regional Leste da PMDF, arregimentou ao menos oito civis para fazerem a cobrança dos loteiros para arrecadação do dinheiro. Ele é apontado como o líder do grupo. Cada motorista pagava R$ 150 por veículo por semana, de acordo com o Ministério Público, e as transações ocorriam dentro de comércios, como açougues frequentados por PMs em viaturas policiais.
Segundo depoimentos de testemunhas, ao menos 50 veículos foram coagidos a participar do esquema, o que rendia uma receita mensal de R$ 30 mil ao grupo de militares. Motoristas que se negavam a pagar tinham os documentos retidos por um longo período e não podiam circular. Eram também autuados por infrações, enquanto os colaboradores tinham multas canceladas.
Escutas
Em conversas telefônicas, os policiais militares se referem ao esquema e falam do receio de uma intervenção do governo. Em um dos diálogos, o major informa a um dos civis envolvidos que estava alijando da combinação um dos policiais que receberia propina sem dividir o dinheiro com os demais: ;Se ele fosse um cara mais companheiro e dividisse a sopa, ele tava em casa hoje quietinho, sossegado, de boa, mas foi olho grande;.
Na ação, o Ministério Público do DF conclui: ;Diante do exposto, percebe-se a associação ativa dos policiais militares denunciados em uma organização estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, diretamente, vantagem pecuniária indevida, mediante a prática de diversas infrações penais, tais como a concussão (art. 305 do CPM) e prevaricação (art. 319 do CPM), entre outras;.
O Correio tentou contato ontem com a Polícia Militar pelo e-mail da corporação, mas não obteve retorno. Os denunciados negam participação e asseguram que vão provar a inocência.
Sem armas e com tornozeleiras eletrônicas
Os cinco policiais militares foram presos em setembro de 2018. Em fevereiro, a Justiça decidiu soltá-los, mas com algumas restrições, como usar tornozeleiras eletrônicas por 90 dias e ficar em casa à noite nos fins de semana.
O porte de armas também foi suspenso e eles ficaram proibidos de se comunicar com testemunhas e ex-colegas de batalhão. Todos foram afastados do policiamento ostensivo, devendo trabalhar na área administrativa da corporação ; longe da unidade do Paranoá.