O gasto médio diário de estrangeiros que visitaram Brasília no ano passado foi de R$ 353,99, de acordo com a Secretaria de Turismo (Setur). Com a novidade da TAP, o GDF espera até 20 mil turistas estrangeiros a mais na capital ainda em 2019. No entanto, para receber essa demanda, há melhorias a fazer. O Correio percorreu diferentes pontos da cidade para fazer um raio-x sobre os problemas do setor e tentar descobrir como pessoas daqui e de fora enxergam o turismo brasiliense.
Difícil comunicação
Terceiro maior do país em movimentação internacional de passageiros, o Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek é a porta de entrada dos estrangeiros em Brasília. Em relação à sinalização, o terminal deixa pouco a desejar. No entanto, ele não tem um Centro de Atendimento ao Turista (CAT) e poucas lojas contam com profissionais bilíngues.
Responsável por um restaurante na praça de alimentação, o empresário Pedro Bergamo, 40 anos, tem dois funcionários estrangeiros que o ajudam no atendimento ao cliente estrangeiro, um chefe de cozinha haitiano e um garçom peruano. ;Temos cardápio em português, inglês e em braille. Não obrigamos nossa equipe a fazer cursos, mas, quando isso está no currículo deles (dos candidatos a um emprego), incentivamos. Eles devem estar preparados para o básico;, ponderou o empresário.
Jean Toussaint, 36, o haitiano, conta que não enfrentou muitos problemas quando chegou a Brasília por receber apoio da equipe de um projeto vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU). ;A maior dificuldade que tive foi para aprender o idioma. Até hoje, me atrapalho um pouco com o português. Mas, em geral, não tenho do que reclamar. Sempre aprendi para tentar ajudar;, conta ele, que consegue se comunicar em cinco línguas.
Diretor de assuntos corporativos do Aeroporto JK, Rogério Coimbra acredita que o acordo da TAP com o GDF vai atrair mais turistas, além de contribuir positivamente para a economia local. ;Provaremos que aqui é um destino atrativo para turistas, pois tem muitos locais para passeio e uma ótima gastronomia. Teremos sucesso com esse programa, pois as pessoas funcionam com o boca a boca e promovem a cidade umas com as outras. Quanto mais gente vir, mais gostarão daqui.;
Sem diálogo
Ainda no terminal, turistas que não sabem falar português podem enfrentar dificuldades na hora de pedir um táxi. Dos motoristas disponíveis nas 31 vagas para esse tipo de serviço no terminal, quando a reportagem esteve lá, só um se comunicava em outro idioma. Claudio Feitosa, 53, taxista há 17 anos, conversou em inglês e espanhol com a reportagem. ;É o meu diferencial. Conheço apenas uns três ou quatro taxistas que também falam outras línguas. Entre os outros, alguns tentam;, contou.
O motorista trabalha vinculado ao Sindicato dos Permissionários de Táxis e Motoristas Auxiliares (Sinpetaxi). O presidente da entidade, Suéd Silvio, afirma que, dos 7 mil associados, apenas mil falam um segundo idioma, de acordo com levantamento realizado há dois anos. ;Estamos avaliando, junto ao Sesc e ao Senac, que promovem o curso de reciclagem de taxistas, para inserir idiomas como opção. Queremos fazer uma reunião com o GDF para cobrar essa matéria;, comentou Suéd.
Para melhorar os serviços, ele conta que pretende fazer uma reunião com a categoria para orientar os profissionais a usar serviços de tradução pelo celular. ;Em uma das aplicações, é possível usar o modo conversação. A ferramenta detecta a língua e a converte para o idioma-raiz;, comentou o presidente do Sinpetaxi.
O aeroporto de Brasília também conta com táxis executivos. O sistema é oferecido pela Inframerica, empresa que administra o terminal, e conta com a opção de consulta de preço e pagamento antes da corrida. Os totens disponíveis para pedir um carro, que custam um pouco mais que o táxi comum, podem ser consultados em português, inglês e espanhol. Há quatro vagas para motoristas da empresa no terminal, mas nenhum dos que estava lá quando a reportagem chegou falava outro idioma.
Pouco ônibus
As linhas de ônibus que saem do terminal aéreo para o Plano Piloto se resumem a três. Os coletivos circulam pelos eixinhos L e W sul até a Esplanada dos Ministérios e setores hoteleiros. As saídas são a cada 35 minutos e os pagamentos das passagens, que custam R$ 12, são apenas em dinheiro. O horário de funcionamento é das 6h30 às 23h55.
Além de táxis e ônibus, há o sistema de bicicletas compartilhadas %2bBike ; oferecido por meio de parceria do GDF com a Serttel ; e a recém-chegada Yellow, que inclui patinetes elétricos entre as possibilidades. As duas plataformas são acessíveis por aplicativos para celular e oferecem preços variados. Para quem visita Brasília e deseja conhecer os pontos turísticos da capital, há cinco roteiros criados pela Setur para quem anda a pé ou prefere pedalar, são os Bike Tours e os Walking Tours.Bares e restaurantes mobilizados
Bares e restaurantes mobilizados
Os mais de 9 mil bares e restaurantes de Brasília têm adotado medidas para incentivar o turismo na capital, segundo o diretor executivo da Associação de Bares e Restaurantes do Distrito Federal (Abrasel-DF), Fábio Estuqui. Ele diz que, entre as iniciativas a serem tomadas até o segundo semestre, há a distribuição de um guia turístico nos hotéis. O mapa será em inglês. ;Reuniremos todos os proprietários dos estabelecimentos para orientá-los sobre a entrega desses informativos;, observou.
A Abrasel-DF não tem dados de quantos funcionários do setor falam mais de um idioma, mas reforça que orienta empresários sobre o processo de seleção. ;Nosso objetivo é que haja ao menos um profissional na empresa que fale uma ou outra língua. Isso melhorará a qualidade da recepção ao turista;, frisou Estuqui.
Outro projeto em andamento é a oferta de um curso de capacitação junto ao Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) para funcionários de bares e restaurantes. ;Ainda estudamos essa medida, mas o Sebrae está empenhado. Queremos disponibilizar um curso de inglês básico mais para a frente;, acrescentou.
Ainda com a intenção de atrair turistas, a Abrasel-DF incentiva os donos de restaurantes a oferecer pratos promocionais com ingredientes do cerrado. Descontos para estrangeiros também estão nos planos do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília (Sindhobar). Para o presidente da entidade, Jael Antônio da Silva, o acordo com a TAP trouxe otimismo e deve alavancar o setor na capital da República.
;Faremos algumas parcerias para oferecer preços diferenciados e benefícios na rede hoteleira, em restaurantes e bares. A ideia é oferecer um diferencial para que os turistas permaneçam na cidade;, afirmou. ;Queremos mudar o turismo no Brasil, e temos de começar pela nossa capital. Será uma ótima oportunidade para mostrar quem é Brasília;, ressaltou Jael Antônio.
O presidente do Sindhobar acredita serem necessários incrementos em outras áreas relacionadas ao turismo. ;Esperamos que o governador melhore os CATs, a mobilidade e a atratividade de alguns pontos. É preciso que o governo se mobilize para ajudar o setor produtivo;, ressaltou. Ele acredita que a cidade está preparada para receber gente de fora, pois oferece cerca de 16 mil leitos. ;Temos uma capacidade de atendimento muito importante. E a pessoa não precisa ficar restrita ao Plano Piloto. Há atrativos na região do Entorno e em cidades de Goiás para serem explorados;, completou Jael.
Impressões
As construções e a atmosfera são capazes de conquistar quem sequer conhece atrativos brasilienses. É o caso do francês Benjamin Busson, 24 anos. Brasília é a primeira cidade do país que ele conheceu. O assessor jurídico chegou à capital há pouco mais de uma semana e se apaixonou de imediato. ;Amei a arquitetura. Alguns amigos até me perguntavam por que eu queria vir para Brasília e me recomendavam outras cidades. Quero conhecer outras, mas voltarei para cá. Aqui, será a minha base;, destacou o turista, que ficará oito meses no Brasil.
A receptividade dos brasilienses foi, inclusive, elogiada. ;O acolhimento me chocou. As pessoas foram muito legais. Há um calor humano impressionante;, comentou. Mas ele tem as suas queixas. ;É difícil falar sobre coisas negativas com apenas uma semana de chegada, mas senti falta de lixeiras. Às vezes, tenho algum lixo e preciso guardar no bolso até encontrar uma;, completou.
O subsecretário de Planejamento da Secretaria de Mobilidade (Semob), José Soares de Paiva, disse que a pasta se preocupa em melhorar aplicativos como o DF no Ponto. ;Trabalhamos na implantação do VLT na W3 Sul e Norte, com um ramal até o aeroporto, que será objeto de uma Parceria Público-Privada (PPP);, ressaltou. No entanto, não há prazos nem verba garantida para a construção dom VLT.
Em relação à preparação de motoristas e cobradores, José Soares afirmou que programas de incentivo ao aprendizado de novos idiomas dependem da Setur. ;A Semob faz um trabalho relacionado às linhas, aos veículos e à documentação dos motoristas. O treinamento e acolhimento de quem chega não são de nossa competência;, esclareceu.
* Estagiária sob a supervisão de Renato Alves