Os efeitos econômicos do escândalo que tem João de Deus como protagonista atingem o acanhado comércio de Abadiânia (GO), onde o médium prometia curas, e põe em suspense o maior investimento da região, um resort. Ele está em construção a 37km da Casa Dom Inácio de Loyola, onde o líder espiritual atendia, até ser preso, em 16 de dezembro, em meio a mais de 300 denúncias de abusos sexuais.
Distante 113km de Brasília e com 19,6 mil habitantes, Abadiânia depende do movimento da casa Dom Inácio de Loyola. Com o escândalo envolvendo o médium, a economia do município entrou em colapso. A prefeitura prevê uma queda de até R$ 150 mil por ano na arrecadação de tributos e taxas. Cerca de 2 mil pessoas devem perder o emprego nas lojas e hospedarias que atendem, principalmente, as pessoas que vêm do mundo inteiro para serem atendidas no centro espírita.
A cidade, que tem 69 hotéis e pousadas, registrou ao menos 400 demissões apenas no primeiro mês após a prisão de João de Deus. Entre 3 mil e 5 mil pessoas eram atendidas semanalmente na Casa Dom Inácio de Loyola, até o escândalo envolvendo João de Deus vir à tona, em 7 de dezembro, por meio do Conversa com Bial, da TV Globo. Aproximadamente 25% dos frequentadores vinham do exterior. Quase a totalidade dos demais atendidos morava em outras cidades. Abadienses frequentando o local eram poucos. Agora, não mais que mil pessoas procuram o centro a cada semana.
Desemprego
Prefeito de Abadiânia, José Diniz (PSD) diz que 30% da receita do município vinha do pleno funcionamento do centro espírita. O que ele mais teme o é o desemprego. ;Nos arredores da Casa, mais ou menos 2 mil pessoas que trabalhavam nas pousadas, comércio e restaurantes devem ficar desempregadas. Eles atendiam quase exclusivamente o povo do João de Deus;, comentou. ;A rua que dá acesso a Casa está vazia. A maioria das pousadas atendia esse público. Praticamente acabou a demanda. Se a Justiça decidir mesmo por fechar o lugar, o desemprego vai para as alturas;, prevê Diniz.
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Na tentativa de propor soluções para os problemas econômicos em torno do centro espírita, 40 empresários se reuniram com o prefeito de Abadiânia na semana passada e discutiram o futuro dos empreendimentos. A maioria, incluindo estrangeiros, decidiu permanecer na região, mesmo com o pessimismo latente. O encontro acabou sem propostas para o rearranjo do comércio na cidade.
Abadiânia tem um Produto Interno Bruto (PIB) de aproximadamente R$ 300 milhões anuais. O setor de serviços é responsável por quase 50% desse volume, seguido pela administração pública (20%), agropecuária (15%) e indústria (5%).
Um dos principais pontos de lazer de Abadiânia é o lago artificial formado pela usina hidrelétrica de Corumbá IV, que gera energia para o Distrito Federal. No entanto, não há política para explorar o reservatório como atrativo turístico. Sequer há área pública às margens do lago. O que não é de propriedade de fazendeiros, tem sido loteado, sem planejamento e qualquer estudo de impacto ambiental.
Entenda o caso
Justiça aceitou denúncias do MP
João de Deus está preso no Núcleo de Custódia do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia (GO), desde 16 de dezembro de 2018. Na quarta-feira, a juíza Rosângela Rodrigues Santos, da comarca de Abadiânia, aceitou a segunda denúncia do Ministério Público de Goiás (MPGO) por crimes sexuais contra o médium, que sempre negou os crimes.
Uma força-tarefa do MPGO investiga as acusações de abuso sexual desde 8 de dezembro. Na mais recente denúncia feita à Justiça, constam depoimentos de 13 mulheres, dos quais cinco não prescreveram e devem ser julgados. Os crimes teriam ocorrido entre 1990 e 2018, durante atendimentos espirituais realizados em Abadiânia.
Dos cinco não prescritos, quatro vítimas são de Goiás e uma de São Paulo. As mulheres tinham entre 19 e 47 anos na época dos abusos, de acordo com os promotores de Justiça. Esses casos teriam ocorrido entre 2009 e julho de 2018.
Em relação aos casos prescritos, as oito mulheres são do Distrito Federal, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Maranhão e Rio Grande do Sul. Segundo o MPGO, eles foram incluídos por ajudarem a embasar a denúncia.
No mesmo documento, o MPGO faz um novo pedido de prisão para o médium, por estupro de vulnerável e abuso sexual mediante fraude.
Plano inclui spa e centro de convenções
Assinado pelo Studio Gaia, sediado em Nova York, o projeto do Tauá Resort & Convention Alexânia se destaca pela modernidade, com atrações tecnológicas para as crianças e bares luxuosos para os adultos. A diária deve custar, em média, R$ 1,2 mil, com café da manhã, almoço e jantar.
O projeto prevê um centro de convenções para até 2,5 mil pessoas, além de bares, restaurantes, pista de boliche, cinema, salão de jogos, duas quadras poliesportivas, duas quadras de tênis, campo de futebol, piscina térmica, sauna, spa, academia e dois espaços temáticos para crianças.
A construção do segundo bloco, com término previsto para dezembro de 2020, interligará os prédios. Em ambos haverá um foyer, com 780m;, um salão de 600m; e quatros salas, duas com 300m; e outras com 65m;. A ideia é construir um parque aquático indoor neste segundo momento.
Aposta no público brasiliense
A construção do Tauá Resort & Convention Alexânia começou em 2017, às margens da BR-060, distante 60km da divisa de Goiás e Distrito Federal. Pelos planos, será uma das maiores hospedarias das duas unidades federativas. Com investimento de R$ 130 milhões, deve criar 500 empregos diretos e 750 indiretos.
No entanto, à época do anúncio do empreendimento, os investidores diziam apostar na demanda de estrangeiros, em função da Casa Dom Inácio de Loyola, a instituição fundada por João de Deus em 1976. Pertencente ao Grupo Tauá, o Tauá Resort & Convention Alexânia prevê 412 apartamentos, em um terreno de 56,7 mil m; (leia Para saber mais).
No lançamento do resort, a direção da rede Tauá disse que a inauguração da primeira parte do complexo ocorreria em dezembro de 2019, com 206 apartamentos. A estrutura completa, ficaria pronta em 2022. Permanece a expectativa para a entrega de parte do resort neste ano. Para isso, os investidores pretendem aumentar de 300 para 500 o número de trabalhadores que colocam os prédios em pé.
Tendo assumido o grupo em 1; de janeiro, Daniel Ribeiro, herdeiro do patriarca João Pinto Ribeiro, garante que, no caso do resort, o público-alvo são os moradores de Brasília. ;Não escolhemos a região pelo aspecto econômico, pensamos nas proximidades. O nosso público não mora em Alexânia, Luziânia ou Abadiânia, mas sim em Anápolis, Goiânia e, principalmente, em Brasília;, destacou.
Daniel está otimista com o empreendimento. ;A gente investe muito em eventos nacionais, como fizemos em Atibaia (SP) e Caeté (MG). Como Brasília está no centro, geograficamente e do poder, teremos grande demanda;, aposta Daniel. ;São 30 anos construindo a boa imagem da empresa que temos hoje em todo o Brasil. Há uma expectativa do nosso público. Será um marco o lançamento do espaço;, acredita.