A diferença chama a atenção de especialistas e militantes do movimento negro, que pedem soluções para alcançar a igualdade racial no poder. Nacionalmente, o número de deputados federais negros eleitos no último pleito cresceu 5%: eles serão 125 dos 513 cargos disponíveis na Câmara dos Deputados. Mas nenhum é do DF. Diante disso, o Correio pediu que Rodrigo Rollemberg (PSB) e Ibaneis Rocha (MDB), que disputam o segundo turno pelo GDF, destacassem as principais ações que tomarão para combater o racismo e promover a igualdade de oportunidades. Entre as ações prometidas estão as cotas para concursos públicos e a criação de um Fundo de Promoção da Igualdade Racial (leia Propostas).
Os desafios do próximo governador são grandes. O levantamento População Negra, da Codeplan, mostrou que a desigualdade racial e social está diretamente interligada no DF. No Lago Sul, região com a maior renda domiciliar média, é onde há o menor número de afrodescendentes na capital ; são apenas 20,1% da população. Na Estrutural, cidade com a menor renda domiciliar, eles são maioria: 77,6%. Assim como 70,4% dos brasilienses que moram em aglomerado subnormal ; conjuntos habitacionais carentes de serviços públicos essenciais. No DF, o número de negros analfabetos com mais de 25 anos é o dobro que o de brancos da mesma faixa etária.
Minoria no Legislativo
O distrital Chico Vigilante (PT) exemplifica o entendimento do professor Carlos Machado. Ele foi eleito duas vezes deputado federal, além de três para a Câmara Legislativa ; a última delas em 7 de outubro. Chico conta que, durante os mandatos, sempre fez parte da minoria negra nas casas parlamentares. ;Isso me dá mais força para que eu lute. E será ainda mais difícil com a ameaça de termos eleito um presidente racista no próximo domingo;, ressalta o distrital reeleito.
Chico afirma que a situação de Brasília não é diferente de outras unidades da Federação. ;O racismo continua entranhado na sociedade brasileira. Nós éramos escravos há pouco mais de 100 anos. Então, ainda é um processo de aprendizagem longo, no qual a gente tem de ir lutando para ganhar espaço no parlamento e também no Judiciário;, explica.
Novato na Câmara Legislativa, Fábio Felix destaca que o enfrentamento da desigualdade racial será uma das prioridades do mandato. ;A baixa representatividade é resultado de um processo político que tenta excluir o negro. O Estado é racista, e vivemos em uma sociedade racista, na qual não há políticas públicas que visem mudar esse cenário;, argumenta. O distrital do PSol também é favorável que o TSE instaure um número mínimo de investimento em candidaturas negras, assim como no caso das mulheres.
Aliados
Como minoria no Legislativo local, Fábio explica que espera apoio de parlamentares brancos para emplacar projetos em benefício ao público negro. ;Se você é negro, vive o racismo e percebe os olhares estranhos na rua, você vai se importar mais por essa luta. Mas isso não quer dizer que um parlamentar branco não possa ajudar. Vamos buscar aliados para investir nessas políticas públicas;, adianta.
Uma questão também histórica
Neste ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que pelo menos 30% do fundo partidário deve ser usado para investir em campanhas de mulheres. O resultado disso foi o aumento de 10% no número de deputadas federais ; só no DF, cinco foram eleitas. Para o professor Carlos Machado, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), uma medida como essa poderia aumentar a representatividade negra. ;O problema não é a ausência de candidaturas de negros, mas como elas são lançadas. A maioria vem de partidos menores ou recebem menos verba; com isso, não tem competitividade dentro do pleito;, explica.
O especialista destaca que há uma discrepância entre se candidatar e se eleger. A nível nacional, cerca de 40% das candidaturas para deputados federais, estaduais e distritais e senadores vieram de pessoas que se autodeclararam negras, mas, entre as eleitas, chega-se a apenas 4%. ;São diversos os motivos que podem explicar esse fenômeno. Um deles é que, por décadas, tivemos uma política com baixa representatividade negra, o que criou elites políticas brancas, que tentam se manter no poder e não abrem espaço para a competitividade;, avalia Carlos Machado.
Prioridade
Na teoria, não há privilégios na disputa por um cargo eletivo. A Constituição Federal estipula as regras para se candidatar a um cargo eletivo como o de governador: ter acima de 30 anos; ser registrado no domicílio eleitoral onde disputará o cargo por pelo menos seis meses; ser alfabetizado; naturalização brasileira; e não ter os direitos políticos suspensos. A diferença que pode levar um candidato ou outro a ter prioridade ocorre dentro dos partidos, como na quantidade de verba que a sigla investe na candidatura, como explica o professor de direito eleitoral da Universidade Católica de Brasília Alessandro Costa. ;Os candidatos têm de convergir dentro da sigla, ter força partidária e ser conhecidos. Daí, começam a sair as prioridades dentro do partido;, detalha.
O professor Carlos Machado destaca que o baixo número de negros eleitos não pode ser interpretado como se a população não os quisesse na política. ;Essa ideia de que os candidatos negros têm menos votação é errada, o que falta é conhecimento sobre eles. Prova disso é que, quando concorrem à reeleição, com nome conhecido, eles costumam conseguir votações consideráveis;, argumenta o especialista.