Sob a sensação de insegurança e de crescimento de crimes de ódio, grupos de WhatAapp foram criados pela comunidade LGBT de Brasília para acolher pessoas que sofrem violência por conta da orientação sexual. Apoio psicológico e jurídico, rodas de conversa e aulas de defesa pessoal são oferecidos aos participantes.
Alexandre Dias, 31 anos, é policial militar e integra um dos grupos. Segundo ele, todas as assistências são feitas por voluntários e visam preservar a integridade física e moral dos participantes frente à crescente onda de homofobia. Outras instituições governamentais, como a Polícia Civil, a Defensoria Pública e o Ministério dos Direitos Humanos já foram contatados para possíveis parcerias.
"Essa é uma demanda de todos nós. O grupo surgiu de maneira orgânica e também cresceu espontaneamente. Eles estão sendo autogeridos, não tem ninguém está direcionando as coisas", diz Alexandre. Ele afirma que a grande adesão não o surpreende. "A comunidade já tem em comum sofrer violência, desde a infância, e isso nos identifica. Quando surge uma onda de violência maior do que o normal, a nossa união é como que natural", explica o policial.
Nos dois últimos fins de semana, aulas de defesa pessoal são oferecidas aos integrantes dos grupos. Exercícios para melhora do reflexo diante de riscos, movimentos básicos de esquiva e base, além de dicas comportamentais em situações de perigo são ensinadas. Alexandre é quem comanda as atividades e diz ser satisfatório o desempenho inicial dos alunos.
"Os participantes, em geral, têm boas respostas e reflexos, possuem baixa agressividade e senso de autopreservação saudáveis capazes de se proteger a si próprios e a terceiros. Em geral, os participantes já se sentem mais seguros com as orientações e, por estarmos juntos, o senso de integração e comunidade fortalece bastante", garante o policial.
Segundo dados obtidos pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) pelo Disque 100 ; canal que recebe denúncias de violações de direitos humanos ;, em 2017, o Distrito Federal foi a unidade da Federação que mais registrou casos de crimes contra a população LGBT, com uma taxa de 2,02 a cada 100 mil habitantes, seguido por Ceará (1,27) e Paraíba (1,22).
Entre as denúncias, 35% são de violência psicológica, 32% são discriminação e 21% são de agressões físicas. Apesar de não ser o mais frequente, o número de casos de violência física despertam maior atenção, uma vez que a cada 19 horas uma pessoa LGBT é morta no Brasil, segundo dados da ONG Grupo Gay da Bahia.
"Estamos preocupados em proteger as pessoas, em unificar para garantir a segurança da maioria dos LGBT daqui. Só quem está passando por esse momento consegue entender a nuvem negra que está pairando no ar", afirma a estudante Mariana Andrade, 22 anos, que também participa do movimento.
Mariana entrou no grupo no fim do primeiro turno das eleições e, para ela, é preciso ter calma e união para enfrentar a violência. ;As pessoas estão com medo", afirma a estudante.
Enfrentamento
Júlio Cardia tem 34 anos, trabalha com relações públicas e é administrador de um dos seis grupos. Ele afirma que participa de movimentos em defesa da comunidade há tempos, inclusive como organizador da Parada do Orgulho LGBT de Brasília, e acredita que a troca de experiências entre participantes de diversas faixas etárias é importante para criar uma cultura de autodefesa e de enfrentamento do medo.
"Mostrar para os mais novos que a gente já passou por momentos piores que esses, anterior a instâncias de defesa de discriminação e de uma discussão mais ampla da pauta LGBT, e dizer que temos suporte para nos defender, é muito importante. Manter a calma e conseguir respirar é o primeiro passo para enfrentar as situações", assegura Júlio.
*Estagiário sob supervisão de Roberto Fonseca