Helena Mader
postado em 03/06/2018 07:50
No Parque Nacional, o verde dá lugar ao cinza do concreto, dos piquetes e do cerrado desmatado. Na região do Morro da Cruz, em São Sebastião, os barracos se multiplicam, a despeito das frequentes operações de derrubadas. Os grileiros também agem livremente na Ponte Alta do Gama, onde negociam frações irregulares de chácaras. Essas três áreas estão entre as mais visadas pelos criminosos que faturam com o parcelamento ilegal do solo no Distrito Federal. Para as autoridades, as regiões são prioridade, especialmente às vésperas da disputa eleitoral ; época em que, tradicionalmente, os grileiros agem com ainda mais ousadia e liberdade.
Um exemplo disso é a expansão das construções em 2014, entre a eleição e o início do atual governo. Houve um boom de grilagem, como indicam imagens aéreas, obtidas pelo Correio. Naquele ano, 104 pessoas foram presas por parcelamento irregular de terras e houve 173 ocorrências policiais. De janeiro a maio de 2018, a Delegacia Especial do Meio Ambiente (Dema) prendeu 25 grileiros e abriu 102 ocorrências para investigar a atuação de criminosos que lucram com a exploração de terras públicas e particulares.
Os anos eleitorais são vistos como oportunidades para os grileiros. Muitos apostam que as autoridades não vão tomar medidas impopulares, como derrubadas de casas, e se apressam em desmatar novas áreas para habitação. Ciente dessa prática, a Agência de Fiscalização garante que não vai afrouxar o controle, apesar da campanha eleitoral. A diretora adjunta da Agefis, Ana Cláudia Borges, diz que o cronograma de operações está mantido e deve ser até intensificado. ;De julho de 2014 até o início de 2015, houve um agravamento dos casos de grilagem, as pessoas se aproveitaram do período eleitoral. Mas, agora, não vamos reduzir a intensidade dos trabalhos, pelo contrário, nosso foco é não deixar que esse problema se repita;, afirma a diretora adjunta.
Segundo Ana Cláudia, as operações são realizadas em todas as regiões do Distrito Federal, especialmente naquelas mais visadas pelos grileiros. ;As pessoas arriscam e apostam muito nesse período de campanha, mas vai ser grande a frustração, a ordem é não parar. As operações continuam;, acrescenta. A Agefis realiza, em média, quatro operações por dia. ;A maioria é fruto do nosso próprio trabalho de monitoramento, mas também atuamos com base em denúncias e em imagens de drone, além de vistorias;, conta Ana Cláudia Borges.
Este ano, a Agência de Fiscalização já realizou 116 operações. Em 2017, haviam sido 503. O foco dos fiscais é identificar as construções e derrubá-las antes que haja moradores. Quando as casas estão habitadas, as operações são muito mais complicadas e, frequentemente, a Justiça concede liminares impedindo as demolições. ;Se não conseguimos derrubar imediatamente, apreendemos o material de construção;, conta a diretora adjunta da Agefis.
Entre a campanha eleitoral de 2014 e o início de 2015, segundo levantamento realizado no início da atual gestão, 10 novas ocupações surgiram ou cresceram rapidamente, entre elas, uma na DF-280, outras em São Sebastião, Sobradinho e Ceilândia. As ocupações na região do Assentamento 26 de Setembro estão entre as mais preocupantes, por conta da fragilidade ambiental do parcelamento, que fica na Floresta Nacional de Brasília (Flona) e é vizinho ao Parque Nacional de Brasília. O assentamento foi criado em 1996, para abrigar trabalhadores rurais. Há 15 anos, a Justiça determinou a remoção de invasores, mas, com o crescimento rápido dos condomínios no local, a recuperação completa da área tornou-se impossível. Hoje, as autoridades atuam para que as ocupações não saiam do controle, o que poderia comprometer ainda mais o abastecimento de água na capital.
Prisões
Na semana passada, a Polícia Civil prendeu um servidor do GDF e mais oito pessoas acusadas de grilagem na área do 26 de Setembro. Na Operação Herdade, os agentes da Delegacia de Meio Ambiente flagraram um auditor-fiscal tributário da Secretaria de Fazenda do Distrito Federal em atuação, acusado de invadir uma área avaliada em R$ 30 milhões.
Para a delegada-chefe da Dema, Marilisa Gomes, a mobilização contra a grilagem deve evitar ;o caos; registrado em 2014, durante e após o período eleitoral. ;No fim de 2014, houve uma situação muito grave. Atualmente, o quadro está mais controlado mas, infelizmente, a grilagem parece ser algo intrínseco ao Distrito Federal, graças a outros governos que fecharam os olhos e até estimularam. As invasões afetam o meio ambiente de maneira drástica;, comenta a delegada.
Sobre o Assentamento 26 de Setembro, uma área visada, Marilisa lembra que a região conta com bacias hidrográficas que garantem o abastecimento da cidade. ;A área está na APA do Descoberto. O parcelamento irregular afeta de maneira drástica o problema da água. É um crime muito sério;, acrescenta.
A delegada conta que o uso de documentos falsos ainda é uma das principais táticas dos criminosos. ;Eles compram áreas de chacareiros e colocam em nome de laranjas. A partir daí, começam a vender os lotes para várias pessoas;, explica Marilisa.
O presidente da Terracap, Júlio César Reis, conta que a aposta das autoridades agora é a tecnologia no combate à grilagem. ;Temos uma ferramenta de detecção de mudanças, que compara imagens de satélite com diferença de 15 dias e identifica novas construções. A tecnologia é hoje uma das grandes aliadas para evitar novos parcelamentos irregulares;, conta Júlio.
NÚMEROS
116
Total de operações realizadas pela Agefis em 2018
6,8 milhões
Total de metros quadrados derrubados este ano
25
Número de grileiros presos pela Dema este ano