Jornal Correio Braziliense

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Estoques começam a ser repostos no DF, mas preços abusivos continuam

Apesar de as revendedoras de gás de cozinha e as centrais de abastecimento começarem a receber produtos, muitos consumidores reclamam de alta nos preços. Procon e Polícia Civil autuam quatro distribuidoras de botijões


O estoque de gás de cozinha, frutas, verduras e legumes deve voltar à normalidade no Distrito Federal em pelo menos uma semana. Nos últimos dois dias, distribuidoras receberam 18 mil botijões de GLP. O setor produtivo agropecuário também começou a reagir ao desabastecimento e, ontem, a movimentação na Central de Abastecimento do DF (Ceasa) se mostrou equivalente a 75% de um dia normal. O problema, no entanto, são os preços. Com as reservas em baixa, muitos revendedores se aproveitam para cobrar valores acima do praticado antes da crise. Consumidores ainda encontram botijões com preço superior a R$ 100 ; o máximo deveria ser R$ 95. Além disso, banana, mamão, limão e laranja continuam caros.

A casa do aposentado José Bernardino, 64 anos, está sem gás desde sábado. Na busca pelo produto, ele se deparou com botijões ao custo de R$ 130 a R$ 180. Ontem, em uma revenda do Guará 2, ele esperou quase 9 horas à toa. ;Eu moro com a minha esposa e três filhos. É um abuso o que estão fazendo, além de ser humilhante;, reclamou. Para contornar o problema, a família usa panelas elétricas, emprestadas por uma vizinha. Mesmo assim, José está preocupado: ;A minha mulher tem diabetes, então, a alimentação tem de ser regrada. Ela não pode comer qualquer coisa;.


O Instituto de Defesa do Consumidor do Distrito Federal (Procon/DF) e a Polícia Civil estão em operação especial para coibir práticas abusivas em depósitos de gás de cozinha desde o último fim de semana. Até agora, quatro distribuidoras receberam autuações. De acordo com o Procon, valores de botijões acima de R$ 100 devem ser esclarecidos. ;É um momento delicado e nada justifica a alteração dos preços;, alertou o presidente do Sindicato das Empresas Transportadoras e Revendedoras de GLP do DF (Sindvargas), Sérgio Costa.

Apesar do desabastecimento, Sérgio acredita que a situação deve ser resolvida logo. ;Os motoristas (caminhoneiros) estavam sendo barrados no caminho às refinarias do Sudeste. Esse era o nosso maior problema. Contudo, as pistas estão sendo liberadas. Acredito que as carretas voltarão a circular sem restrições e conseguirão chegar a Brasília mais rapidamente;, disse.
A prioridade do sindicato é a comercialização de botijões para uso residencial. Por dia, cerca de 20 mil recipientes de 13kg são consumidos no Distrito Federal. Ele acrescentou que hospitais, escolas e centros comerciais também serão abastecidos. ;Somente ontem, 60 toneladas de gás foram destinadas para esses serviços. Todos estão recebendo a quantidade necessária;, garantiu.

Um carregamento do produto chegou às distribuidoras da cidade na quarta-feira. Ontem, mais 14 mil botijões alcançaram as revendas. A quantidade, porém, é inferior à demanda diária. ;Apesar de estarmos em uma crise, temos de ter calma. O cenário vai mudar. Seremos reabastecidos. As pessoas não precisam estocar gás. Muitos foram comprar mais de um botijão, sendo que um produto pode durar entre 20 e 45 dias para uma família. Não há necessidade disso;, concluiu.

Demora

Enquanto isso, muita gente ainda sofre atrás de gás. A aposentada Eva Carneiro, 69, saiu ontem do Recanto das Emas para tentar comprar um botijão no Guará 2. Ela esperou 8h e voltou para casa sem nada. ;Os funcionários disseram que não têm previsão de quando chegarão mais botijões. Tentei comprar no Guará 2, porque lá no Recanto estava um absurdo. Tem gente que vende a R$ 145;, denunciou. Sem gás, ela come fora de casa. ;Mas não quero continuar fazendo isso. Não tenho dinheiro para pagar marmita todos os dias;, queixou-se.

Assim como ela, o bombeiro civil Flávio Sabino, 39, voltou para casa com o recipiente vazio. ;Fico muito chateado. Moro com o meu pai, que tem 85 anos, e com a minha mãe, que tem 60. É uma situação complicada, tenho medo de eles se alimentarem mal por causa da idade avançada;, desabafou. ;Nós temos de manter a esperança, mas está difícil. Não vou sossegar enquanto não conseguir esse gás;, acrescentou.

Mais metrô

A escassez de combustível forçou motoristas a deixarem os veículos em casa. Enquanto muitos brasilienses enfrentaram filas atrás de gasolina e álcool, teve quem optou por outro meio de transporte. O metrô tem sido a principal escolha. Na última semana, houve aumento de 25% no número de passageiros, segundo informações da Companhia do Metropolitano do Distrito Federal. A média diária de 160 mil passageiros subiu para 200 mil.

Otimismo no setor produtivo

;O pior já passou. Agora temos de calcular o prejuízo.; Assim o secretário de Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento do Distrito Federal, Argileu Martins da Silva, resumiu o momento do setor produtivo no DF. A greve dos caminhoneiros prejudicou quem planta, cria, transporta e revende, além do consumidor, que pagou mais caro pelos alimentos. Com as rodovias liberadas, abacaxi, tomate e batata voltaram às prateleiras. Alguns preços recuaram, mas também há produtos com valores cobrados bem acima da tabela. Pelo menos no varejo, a expectativa é de que a situação se normalize até a próxima quinta-feira.

Para criadores de aves e suínos, porém, serão necessários meses até que as contas saiam do vermelho. ;A greve interferiu no ciclo de produção, desde o nascimento até o abatedouro. A ação que fizemos juntos impediu que morressem 10 milhões de frango de corte e 1,8 milhão de matrizes que colocam os ovos férteis. Mesmo assim, em um momento de crise, até estruturar o setor, o desempenho zootécnico diminuiu;, explica Argileu. ;Hoje (ontem), aqueles que exportam a pintainha, o pintinho de um dia, enviaram os caminhões para o Nordeste. E temos suinocultores que foram buscar farelo de soja para a criação em Anápolis (GO);, completa.

Frutas e legumes

Os preços de frutas como banana, mamão, limão, laranja, maçã e pera, que chegam de outras unidades da Federação, permanecerão entre 20% e 30% mais altos por mais dias. Os valores do tomate e da batata, bastante afetados na crise, no entanto, recuaram. No primeiro caso, a caixa de 20kg passou de R$ 50 para R$ 130 e, agora, voltou para R$ 50. Quanto à batata, o preço da saca de 50kg saiu de R$ 100 para R$ 200, chegando a R$ 250, mas caiu para R$ 160. ;Na Central de Abastecimento do DF (Ceasa), o prejuízo foi de R$ 10 milhões. Na Feira de Ceilândia, cerca de R$ 5 milhões. Apesar disso, há otimismo. Os produtores voltaram a colher, voltaram a carregar os caminhões;, destacou o secretário Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento.

O presidente da Ceasa, José Deval, disse que a movimentação na central ontem foi equivalente a 75% de um dia normal. Segundo ele, sábado, o abastecimento deve chegar a 99% se comparado com fins de semana anteriores à greve dos caminhoneiros. ;Para normalizar mesmo, ainda precisaremos de alguns dias. A nossa maior preocupação é com a maçã e com a pera, que vêm do Sul. Podemos dizer que o mercado varejista está funcionando dentro da normalidade. A preocupação maior é com o atacadista. A população pode fazer compras com tranquilidade;, disse.