Hellen Leite
postado em 12/04/2018 06:00
A Polícia Civil do Distrito Federal apura as agressões contra uma mulher transexual em uma lanchonete, em Taguatinga. O crime ocorreu em 1; de março, mas só na terça-feira e tornou um inquérito. Essa é a primeira vez que um caso de agressão contra uma mulher trans será enquadrado como tentativa de feminicídio pela Delegacia Especial de Repressão aos crimes de Intolerância (Decrin) da capital.
A decisão de equiparar a agressão da estudante Jéssica de Oliveira, 28 anos, às das mulheres cis (que nasceram no corpo feminino) foi da delegada Gláucia Cristina, da Decrin. Segundo ela, é cabível dizer que Jéssica sofreu uma tentativa de feminicídio, pois os agressores se valeram da vulnerabilidade da vítima como mulher. ;Ela apanhou na condição de mulher, inclusive falaram que ela deveria virar homem, então ali foi usada a peculiaridade de desvantagem de gênero;, explicou Gláucia.
Registrado originalmente na 12; Delegacia de Polícia (Taguatinga Centro), o caso foi repassado à Decrin pelo caráter delicado do tema. Desde então, a equipe de investigadores da unidade especializada identificou e ouviu os quatro suspeitos da agressão. Um deles tem menos de 18 anos. Os três adultos acusados podem ser condenados a até 15 anos de prisão. O adolescente será autuado por ato infracional análogo a tentativa de feminicídio e terá o caso encaminhado à Vara da Infância e Juventude.
A agressão contra Jéssica aconteceu na madrugada do Domingo de Páscoa, em uma lanchonete de Taguatinga Norte. Nas imagens das câmeras de segurança, é possível ver quatro homens perseguindo a vítima. Nas primeiras cenas, ela aparece entrando na lanchonete, caminha para trás e dá a impressão de querer fugir dos agressores, que entram em seguida. Primeiro, o grupo atinge Jéssica com socos e pontapés. Um dos homens parece ter uma pedra na mão, outro carrega um pedaço de pau. O grupo sai da loja, mas volta em seguida e as agressões continuam com cadeiradas.
Ao Correio, Jéssica afirmou que foi vítima de transfobia. ;Um deles disse que ia me bater até me matar. Depois eles foram para fora, mas dois voltaram e me acertaram cadeiradas;, lembra a vítima. Este não foi o primeiro episódio de violência sofrido pela estudante. Ela tem outros três registros por injúria e discriminação. Assustada com a agressão, Jéssica está com medo de sair de casa. ;A violência está ao nosso redor, ainda mais para transexuais e travestis. Estou aterrorizada. Pensei até na possibilidade de não sair mais de casa.;
As marcas das cadeiradas ainda estão visíveis pelo corpo, dois hematomas roxos e alguns arranhões nas pernas marcam o braço de Jéssica. Ainda se recuperando do susto, a estudante diz querer justiça. ;Tem muitas outras agressões que eu não registrei em boletim de ocorrência. São violências diárias, dentro de casa e na faculdade, por exemplo. Tenho medo de nunca acontecer nada com os agressores. Até a repercussão desse caso, eu já estava me acostumando a ser agredida;, comenta.
Emblemático
Para Paula Benett, da Coordenação de Diversidade, grupo que debate políticas públicas para pessoas LGBTs no Distrito Federal, o enquadramento do caso de Jéssica no crime de feminicídio é emblemático e deve ser comemorado. Ela elogia a Polícia Civil do DF. ;A polícia e a Justiça estão enxergando e respeitando essa identidade. Mulheres trans são perseguidas por serem mulheres. Por isso, todas as leis aplicadas ao gênero feminino também comportam mulheres transexuais e travestis;, defende a ativista.