Uma artista do cerrado brasileiro encantou o papa Francisco com seu trabalho, uma imagem de Nossa Senhora do Menino Jesus, que une simplicidade e sofisticação. A escultura foi um presente da artesã Maria de Fatima Dutra Bastos, a Fatinha, cheia de detalhes feitos com fibras de bananeira e palha de milho, levada ao Vaticano por representantes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Apesar de ter oferecido a obra ao papa, quem se sentiu agraciada foi a artista. ;Foi meu maior presente em 58 anos. Uma bênção de Deus! Quando as coisas têm simplicidade, são feitas com humildade, as peças voam com amor;, diz Fatinha. ;É a maior honra da minha vida fazer uma santa para o papa. Eu tenho muito amor à arte, faço com a alma, fiz com muito amor, com muito carinho. Eu me emocionei muito, vi a foto, chorei com o bispo. Chorei em ver tanta homenagem. Cada frase mais linda que a outra;, completa.
A artesã confeccionou a peça ; entregue ao pontífice em 21 de outubro passado, durante uma visita de dirigentes da CNBB ao Vaticano ;, após sugestão do secretário-geral da entidade, dom Leonardo Steiner, que viu uma obra dela na sala de um desembargador em Brasília. ;Eu vi que ele tinha uma peça bonita de um anjo, então perguntei: ;De onde veio?;. Ele falou: ;É de uma artista chamada Fatinha;. Eu disse que a conhecia, que achei bonita e que, se fizesse uma Nossa Senhora, talvez a gente pudesse entregar ao Papa;, relata dom Leonardo.
Essa conversa aconteceu há dois anos. O reencontro entre eles ocorreu no meio do ano passado, quando o desembargador apareceu já com uma peça pronta, medindo 1 metro de altura. ;Um dia, ele chega com essa imagem e diz: ;Está aqui o presente do papa;. Ele encomendou com a Fatinha, sem eu saber. Quando eu vi, pensei: ;Meu Deus! Como vou levar isso no avião? Talvez pra viagem seja um pouco grande;, afirma o religioso. O desembargador pediu então uma peça menor, e a escultura de 1m permaneceu em Brasília, exposta na recepção da CNBB.
Ofício de família
Fatinha é artesã desde a infância. Filha e neta de artistas, começou a fazer suas obras para uma feira de artesanato de Olhos D;água, povoado de Alexânia (GO), onde vive até hoje. As primeiras esculturas foram seus próprios brinquedos. ;Eu sempre trabalhei com a fibra da bananeira, com palhas de milho. Fazia bonecas para brincar, não tinha dinheiro. Comecei a expor na Feira do Troca, que incentivou muito o artesanato aqui em Olhos D;água.;
Desde então, ela diz ter se voltado inteiramente para a sua arte, criando as peças e pesquisando matérias-primas, em especial a semente da palha do milho colorido. Um trabalho dela pode ficar pronto entre um dia e uma semana, e os valores das esculturas variam de R$ 35 a R$ 2 mil. O processo de criação envolve a preparação da fibra e a confecção em si, tudo feito com o coração, como ela diz, para tocar aqueles que adquirem as peças.
;Quando eu soube que poderia fazer uma imagem para o papa, fiquei muito feliz. Falei com dom Leonardo que queria mandar uma foto para discutir como seria, mas ele disse para eu fazer com o meu coração;, conta Fatinha. Não demorou muito e a imagem de 60cm feita pela artesã especialmente para o pontífice chegou às mãos do bispo. ;Essa eu embalei, conforme as indicações que a Fatinha tinha dado, e levei no colo;, conta dom Leonardo.
Chegada ao Vaticano
A entrega do presente ao líder máximo da Igreja Católica ocorreu durante a visita ao Vaticano de padres brasileiros que estudam em Roma. O reitor do colégio Pio Brasileiro, de Roma, padre Geraldo Maia, e o presidente da CNBB, dom Sérgio da Rocha, foram os intermediários.
Ao ouvir a notícia sobre o encontro, Fatinha ficou eufórica e, ao mesmo tempo, ansiosa para saber se o presente havia sido aprovado. ;Disse dom Leonardo que ele gostou demais;, celebra.
;Dom Sérgio explicou para ele do que era feito. Ele ia dizendo assim: ;Muy lindo;;, explica dom Leonardo. ;Normalmente, ele fala em espanhol, e nós falamos em português. Disse que era uma obra delicada. Ficou muito agradecido.; O bispo contou que os olhos do papa brilharam diante de uma obra tão simples e, ao mesmo tempo, tão cheia de detalhes e de significado artístico. ;Ninguém imagina que são folhas, parece renda. É um material muito delicado, muito bonito. É preciso estar atento para ver que é tudo natureza, que não tem nada de artificial;, observa o religioso. ;Não é uma obra feita de qualquer jeito, você percebe que ali tem arte, expressão, beleza, implicação, rumo, sentido. Uma obra de arte sempre expressa uma determinada realidade, uma determinada beleza, e as obras dela transmitem isso.;
Para aqueles que, como ela, se dedicam ao artesanato com paixão, Fatinha deixa um recado: ;Vale a pena lutar pela qualidade do seu trabalho, pelo seu sonho, porque você chega a lugares maravilhosos. É só aprimorar e fazer com amor e dedicação.;