Ana Viriato, Deborah Fortuna
postado em 01/11/2017 06:00
Mais de 33 funcionários do Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe), antigo Cespe, foram demitidos da instituição devido às fraudes realizadas pela Máfia dos Concursos. Apesar de não haver indícios da participação de outros servidores, a instituição decidiu desligar a equipe de organização e digitalização das provas ainda em março deste ano, quando as suspeitas de fraude começaram. O ex-funcionário do Cebraspe Ricardo Silva do Nascimento foi preso na última segunda-feira, durante a segunda fase da operação Panoptes, deflagrada pela Polícia Civil do Distrito Federal. Ele trabalhava na instituição desde 2014 com o grupo.
A PCDF não quis comentar se outros empregados serão investigados, mas não há nenhum indício de que Ricardo contava com ajuda dentro do órgão para fraudar as avaliações. Para o diretor-geral do Cebraspe, Paulo Portela, a decisão foi tomada para evitar a perda de credibilidade da instituição, já que, à época, ainda não havia confirmação de crime ou de autores. ;Por conta do Ricardo, tivemos que fazer o desligamento desses funcionários. A gente agiu na parte do processo que poderíamos;, afirmou o diretor-geral.
[SAIBAMAIS]Entre os funcionários estavam servidores, terceirizados e pessoas cedidas pela Universidade de Brasília (UnB) para atuar junto à instituição. Desde o início das suspeitas, o Cebraspe contribuiu com as investigações. Em uma das evidências, Ricardo foi flagrado pelas câmeras de segurança em atitude suspeita. ;Encaminhamos todos os vídeos para a polícia e, ontem, descobrimos que era um crime por causa da operação;, explicou Paulo Portela.
Quadrilhas
Apesar de não fazer parte da aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano, o Cebraspe é realizador de grandes concursos no DF. A empresa afirmou que atualiza com frequência o sistema de segurança. ;Percebemos que estamos em um ambiente em que as quadrilhas se especializam para fraudar os concursos, e as instituições precisam estar preparadas;, afirmou Paulo Portela.
Com essa nova operação, eles afirmaram que vão apostar em mais tecnologia. Um dos equipamentos promete detectar qualquer tipo de ponto eletrônico e bluetooth, em um raio de 100 a 150 metros. ;Temos uma equipe de rastreio de ondas eletromagnéticas, que permite bloquear tanto a informação que possa vir de fora para dentro, quanto de dentro para fora do ambiente de prova;, disse Portela. ;
Câmara Legislativa
Em meio à onda de desconfiança provocada após a descoberta da Máfia dos Concursos, para afastar burburinhos sobre a possibilidade de fraudes relativas ao certame da Câmara Legislativa, a Casa exonerou, ontem, o secretário parlamentar do bloco Sustentabilidade e Trabalho, Mário Gomes da Nóbrega. Segundo investigações da Polícia Civil, ele manteve conversas com o líder do esquema, Helio Ortiz, durante o período em que acontecia a escolha da banca examinadora que organizaria a seleção, a Fundação Carlos Chagas (FCC) ; à época, o ex-comissionado era chefe da Polícia Legislativa.
Apesar de a Polícia Civil não ter apontado, até o momento, máculas na escolha da banca examinadora responsável pelo processo seletivo, o Ministério Público de Contas do DF (MPC/DF) o fez. Por falhas administrativas, o órgão recomenda que o Tribunal de Contas anule o contrato entre a Câmara Legislativa e a Fundação Carlos Chagas e que a Casa adote, no prazo de 30 dias, as medidas necessárias, conforme a lei, para a contratação da banca examinadora. Apesar do cumprimento de todas as etapas necessárias ao julgamento das representações, ainda não há data definida para que o processo passe pelo crivo do TCDF.
Em parecer entregue à Corte de Contas em 26 de outubro, o procurador Demostenes Tres Albuquerque afirmou que ;a instrução processual da contratação demonstrou falhas, inconsistências, obscuridades e inconformidades que revelaram um cenário de violação aos princípios da impessoalidade, julgamento objetivo e transparência;.
O relatório do MPC consta no processo que levou à suspensão do certame, com previsão de 86 vagas, em 31 de agosto. O MPC justifica, por exemplo, que ;as informações apresentadas pela Casa não serviram para justificar a ausência de critérios objetivos no processo de seleção e tampouco a de motivação contundente que abonasse, com base nos princípios norteadores da Administração Pública, a contratação da FCC;.
O Ministério Público frisa, ainda, a necessidade da avaliação jurídica prévia não apenas do projeto básico do certame, mas de toda a documentação relacionada ao procedimento de dispensa/inexigibilidade de licitação pela Procuradoria-Geral do Legislativo local. ;Na mesma linha, a ausência de transparência no procedimento de contratação direta, que alijou injustificadamente possíveis interessados na prestação dos serviços, também conduzem à irregularidade da contratação;, descreve o parecer.
Foragido
Ontem, a Deco prendeu um dos líderes da máfia que estava foragido. Antônio Alves Filho foi preso em uma fazenda, onde estava escondido, em Formosa (GO). Ele é um dos suspeitos que teve a prisão preventiva decretada pela Vara Criminal e do Tribunal do Júri de Águas Claras. A investigação apontou que foi Antônio Alves Filho quem aliciou Ricardo da Silva Nascimento.
Uma das candidatas do concurso que admitiu ter comprado o resultado de um certame público promovido pelo Cebraspe disse que se encontrou com Antônio dois dias antes da prova, na residência de Hélio Ortiz, líder da organização. Na casa, o acusado teria chegado com a prova dela em branco dentro de um envelope para que ela fizesse o concurso. Ela escreveu a redação, e Antônio concluiu as respostas.
Fraudes desde 2012
Temos como bloquear tanto a informação que possa vir de fora para dentro, quanto de dentro para fora do ambiente de prova;
(Paulo Portela, diretor-geral do Cebraspe")
Entenda o caso
Fraudes desde 2012
Em 21 de agosto deste ano, a Deco havia deflagrado a Operação Panoptes, que apura esquemas de fraudes em concursos públicos do DF, que ocorrem, pelo menos, nos últimos cinco anos. A suspeita era de que uma nova máfia tivesse se formado e estivesse prejudicando os candidatos. À época, os policiais civis cumpriram quatro mandados de prisão preventiva contra Bruno de Castro Garcia Ortiz, Johann Gutemberg dos Santos e Rafael Rodrigues da Silva Matias, e o conhecido Hélio Garcia Ortiz, o líder da Máfia dos Concursos, que havia sido descoberta havia 11 anos. Ele e o filho Bruno haviam sido presos em 2005 na Operação Galileu.
A investigação apontou que o mandante nunca se afastou do esquema de fraudes em concursos. Eles atuavam desde 2013. O estopim das investigações decorreu de uma série de denúncias de irregularidades no concurso para o Corpo de Bombeiros do DF, há alguns meses.