Cidades

Promotor: acusados de racha seguem dirigindo em excesso de velocidade

Promotor considera grave o fato de os dois envolvidos em acidente terem sido multados por excesso de velocidade meses após a morte de mãe e filho. Laudo mostra que acusados participavam de pega, que culminou no acidente fatal

Júlia Campos - Especial para o Correio
postado em 06/10/2017 06:00
Carro onde estavam as vítimas: atingido por veículo em alta velocidade

O Ministério Público quer a prisão preventiva de dois dos motoristas envolvidos na morte de mãe e filho, na noite de 30 de abril, na L4 Sul. O bombeiro militar Noé Albuquerque de Oliveira, 42 anos, e o advogado Eraldo José Cavalcante Pereira, 34, são acusados de disputar um pega e provocar a colisão fatal. Eles foram denunciados à Justiça por homicídio triplamente qualificado ; por motivo torpe; recurso que dificultou a defesa das vítimas; e perigo comum e tentativa de homicídio, pelas vítimas que sobreviveram ; , além da omissão de socorro e embriaguez ao volante.

A denúncia partiu do promotor Marcelo Leite, da Promotoria de Justiça do Tribunal do Júri de Brasília. Ele dedidiu pedir a prisão após constatar também que os dois indiciados têm registros de multas por excesso de velocidade, mesmo após a tragédia que levou à morte de Cleusa Maria Cayres, 69, e Ricardo Cayres, 46. Para Leite, a detenção dos motoristas é necessária por haver elementos que mostram que ambos apresentam perigo à sociedade. ;Tudo foi baseado no fato de eles continuarem incidindo em transgressões de trânsito. Acuso justamente de um crime de racha e eles continuam andando em alta velocidade pelas vias do DF. Além disso, é um caso que teve consequências muito graves;, afirmou.

[SAIBAMAIS]O Correio entrou em contato com Alexandre Queiroz, advogado de Noé e Eraldo. Ele disse não estar em Brasília e se sentir surpreso com a notícia. Afirmou que vai esperar a leitura da denúncia na íntegra para dar um melhor posicionamento hoje. ;Meus clientes sempre compareceram quando solicitado, prestaram todos os esclarecimentos, possuem residência fixa e são trabalhadores. Não tem fundamento nenhum esse pedido. Eles não apresentam nenhum perigo ao andamento do processo. Nunca passou pela nossa cabeça que algo como isso pudesse acontecer;, admitiu.

Ação cível


Defensor da família Cayres, Thiago Pugsley ressaltou que, pelo laudo e elementos apresentados no inquérito, o pedido do promotor era esperado. ;Para nós, não foi nenhuma surpresa. Até a prisão era uma matéria que trabalhávamos, mas não tínhamos uma posição bem colocada para oferecer. Acredito que existam reais condições de ser deferida pelo juiz ainda nesta sexta-feira ou no início da próxima semana;, argumentou. Tiago espera o acesso a laudos, imagens e outros documentos para ajuizar uma ação cível de reparação de danos.

A viúva, Fabrícia Gouveia, ficou surpresa com a rapidez da denúncia. ;Essa resposta do MP e da Polícia Civil é importante, pois significa que ainda podemos confiar. As pessoas acham que a Justiça funciona apenas para os ricos, mas não temos dinheiro e ninguém influente que nos ajudou até aqui;, destacou.

Fabrícia disse ainda que, desde o início, amigos e parentes lutam para que Ricardo e Cleusa não virar mais um número de estatística. ;Vamos continuar nessa estrada, que é longa. Não é uma questão de vingança, mas de Justiça.;

Para ela, a divulgação de casos como esse alerta a população sobre a relação álcool e direção. ;As pessoas acham que não dá nada e aí está um exemplo de que dá sim. Muita gente relativiza, acham que é comum beber e dirigir.;

Impunidade


Para o presidente da Comissão de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), Maurício Januzzi, o fato de a população saber que vai se livrar de uma possível prisão após acidentes que envolvem álcool e direção faz com que os casos de homicídio em vias e rodovias aconteçam com mais frequência. ;São leis que sujeitam o indivíduo a não ser preso nem no momento, nem durante e depois, se livram rapidamente;, afirmou.


Três perguntas para


Marcelo Leite,
promotor do Tribunal de Júri de Brasília

Por que a denúncia de dolo eventual?
Porque (os acusados) faziam um racha. Temos, pelo menos, três testemunhas muito enfáticas que disseram que eles cometeram esse delito. Falaram sobre o perigo e o susto que levaram quando viram o modo que os motoristas conduziam os carros no momento do fato. Além de estarem em alta velocidade e embriagados. Eles assumiram o risco de matar, e assim fizeram com duas pessoas.

Por que não houve uma denúncia direta e a investigação voltou para a delegacia?
Quando retornou da vara para mim, já ia denunciar, tinha elementos suficientes para fazer isso. Mas o delegado entrou em contato comigo e pediu que o inquérito voltasse para que fossem feitas as últimas diligências, pois queria encerrar o trabalho.

Quais são os próximos passos?
O juiz vai avaliar o pedido. Pedi mais algumas diligências. Requisitei oficiamento do Detran pedindo as imagens de um pardal próximo ao local do acidente, pois é estranho não termos informações de alta velocidade nele.


Memória


Mortes na Ponte JK

Em outubro de 2007, Paulo César Timponi conduzia o Golf que bateu na traseira de um Corolla, na Ponte JK. Laudo da Polícia Civil apontou que o Golf estava a 130km/h e o Corolla a 60km/h. No carro dele foram encontradas uma lata de cerveja, uma garrafa de uísque e vestígios de cocaína. Com o impacto, Antônia Maria de Vasconcelos, a irmã dela, Altair de Paiva, e a amiga Cíntia Cysneiros de Assis, que estavam no Corolla, foram arremessadas para fora e morreram na hora. O julgamento do réu deve voltar a juízo ainda este ano. Timponi conseguiu reclassificar a acusação para homicídio culposo (sem a intenção de matar) ; e, assim, também não foi levado a júri popular. Mas, após recursos da acusação, o processo está previsto para voltar a juízo ainda este ano.

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