Na última quinta-feira (11/5), o Tribunal do Júri de Taguatinga condenou Constantino e outros três réus pelo assassinato de Márcio Leonardo da Sousa Brito. O líder comunitário morreu aos 26 anos, em 12 de outubro de 2001, com três tiros, por causa da disputa por um terreno. O empresário é o mandante do crime, segundo a acusação do Ministério Público e o entendimento dos jurados.
O envolvimento de Constantino com pistolagem contrasta com o perfil austero e discreto consolidado ao longo de 60 anos como homem de negócios bem-sucedido. Ele sempre fez questão de não esconder o jeitão de interior no meio empresarial. Aos poucos, a habilidade fez com que acumulasse conquistas na área de transportes rodoviários e, mais recentemente, aéreos. Em 2008, a revista Forbes divulgou que a fortuna de Nenê Constantino e sua família eram de mais de US$ 5 bilhões (dólares).
[SAIBAMAIS]Mesmo assim, o mineiro de Paracatu manteve os hábitos simples. Tem até hoje ex-rodoviários como melhores amigos. Filho de lavrador, não concluiu o primário. Constantino nasceu em uma família humilde. Quando menino, ajudava o pai trabalhando na lavoura e vendendo verduras na rua.
Aos 18 anos, comprou o primeiro caminhão, com o qual montou uma empresa de transportes. Ele entrou no ramo após levar uma carga de manteiga de Paracatu para Recife (PE). Na busca do que trazer de volta para encher o caminhão, Nenê recebeu a sugestão de levar passageiros. Colocou uma placa ;Rio-São Paulo; no veículo e transportou um grupo no pau de arara para a Região Sudeste. Vendeu o caminhão e comprou duas jardineiras (veículo de transporte de passageiros) para abandonar o transporte de cargas e se dedicar ao de passageiros. A partir de então, passou a comprar pedaços de empresas de ônibus em dificuldades.
Nenê dividiu seus negócios entre os filhos (Henrique, Joaquim, Ricardo e Júnior) em 1994. Os quatro irmãos se juntaram e as três irmãs ficaram com empresas de transporte em Brasília, além de shoppings e hotéis. Em 2000, os Constantinos já tinham a maior frota de ônibus do país e uma das maiores do mundo. Eram quase 6 mil coletivos espalhados por sete estados e o DF. Transportavam 1,2 milhão de passageiros por dia.
A família Constantino é dona do Grupo Áurea, hoje Grupo Comporte, composto pelas empresas Transportes Coletivos Intermunicipal Pássaro Marron, São Paulo São Pedro, Princesa do Norte, Breda, União, Piracicabana, Empresa Cruz, Manoel Rodrigues, Itamarati, Transportes Coletivos Grande Londrina (em Londrina), Transportes Coletivos Grande Bauru (Bauru), além de empresas de transporte coletivo em Cuiabá, Maringá (PR), Vitória da Conquista (BA) e, em Blumenau (SC) sob caráter emergencial. A Comporte fez sua estreia nos trilhos, em dezembro de 2014, ao vencer a licitação para operar o VLT de Santos.
Inovação nos céus
Constantino mora na capital do país desde 1977. Manteve-se longe dos holofotes até o fim da década de 1990, quando entrou no ramo da aviação. Em janeiro de 2001, o empresário confirmou o perfil ousado e fundou a Gol Linhas Aéreas. Enveredou em um ramo marcado por experiências malsucedidas de colegas especializados em transportes urbanos. A família Canhedo, por exemplo, dona da Viplan ; que já foi a maior empresa do mercado no DF e quebrou ; arriscou investimentos no setor aeroviário, mas a iniciativa acabou com a falência da Viação Aérea de São Paulo Sociedade Anônima (Vasp).
Já a Gol Linhas Aéreas começou a operar inovando no mercado aéreo brasileiro. Voos com tarifas baixas e sem gastos com alimentação chamaram a atenção no início dos anos 2000. A empresa deu início às atividades com apenas quatro aviões. Com 122 aeronaves em operação, é a segunda maior do mercado brasileiro, atrás apenas da binacional Latam, que tem 159 aviões (os números são de 2016). A data de fundação da Gol, porém, coincidiu com os crimes que envolvem o nome do empresário. Desde então, os negócios da família Constantino alcançam fazendas, concessionárias de veículos e empresas de engenharia.
Dívidas com o fisco
Além da fundação da Gol, uma investigação do fisco levou Constantino à mídia. Em 2001, o INSS conduziu investigação das companhias de ônibus da família. Na época, o cálculo era que as dívidas seriam de cerca de R$ 240 milhões. Outra polêmica envolvendo o empresário foi o fato de seu nome constar em cadastro de empregador que explora trabalho escravo. Isso acontecia em uma fazenda da qual era sócio. Nenê disse que desconhecia a situação e que deixou a sociedade.
Bezerra de ouro
O empresário também apareceu na mídia por causa de um amigo influente, o ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz. O político renunciou ao mandato de senador em 2007 depois que se abriu investigação por conta da partilha de um cheque de R$ 2,2 milhões ; o documento continha a assinatura de Constantino. O caso veio a público durante a Operação Aquarela, da Polícia Civil do Distrito Federal. A ação desmontou um suposto esquema de desvio de dinheiro do Banco de Brasília (BRB).
Durante a apuração do caso, a corporação flagrou uma conversa na qual o senador Joaquim Roriz (PMDB-DF) e o ex-presidente do BRB Tarcísio Franklin de Moura tratam da divisão da cifra milionária. Roriz decidiu renunciar ao mandato para evitar uma cassação e preservar direitos políticos. A origem do dinheiro sacado em uma agência do BRB seria um cheque do empresário Nenê Constantino, presidente do Conselho de Administração da Gol Linhas Aéreas. Na época, o ex-governador do DF alegou que parte do dinheiro seria usado para a compra de uma bezerra. Constantino chegou a perder a compostura no dia em que foi chamado a depor sobre o caso e agrediu um fotógrafo.
Benefícios da Justiça
A velhice tem garantido benefícios a Constantino. Em março de 2012, ele passou a cumprir prisão domiciliar. Em agosto de 2012, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) revogou a prisão, mas determinou recolhimento domiciliar noturno e em fins de semana.
Nenê Constantino já foi julgado e absolvido em outra ação, que tratava da tentativa de homicídio de seu ex-genro, Eduardo Queiroz Alves. Ele foi inocentado em 16 de agosto de 2015, pelo Tribunal do Júri de Brasília, que analisou a denúncia do Ministério Público, segundo a qual, em 2008, Constantino teria contratado um pistoleiro, por meio de um policial militar, para matar Queiroz. Na ocasião, o pistoleiro teria atirado diversas vezes contra o carro da vítima, que sobreviveu.