Cidades

Agrofloresta destruída causa revolta em alunos da UnB

O ecossistema era um projeto de alunos das Ciências Ambientais para estudo e divulgação de agricultura sustentável

Gláucia Chaves
postado em 11/03/2017 12:36
O terreno devastado em que funcionava a agrofloresta dos alunos da UnB.
Os alunos de Ciências Ambientais da Universidade de Brasília (UnB) tiveram uma surpresa desagradável na manhã deste sábado (11/03). O dia estava reservado para apresentar a agrofloresta criada pelos estudantes em 2010 para os calouros do curso, mas no lugar das bananeiras, canas-de-açúcar, jacarandás e mais uma infinidade de espécies de ávores e plantas, os alunos encontraram toras de madeira e terra limpa. A agrofloresta era usada não só como uma forma de praticar os ensinamentos da sala de aula, mas para projetos de cunho social, de acordo com Gustavo Cobelo, 25 anos. ;Conversamos com a equipe de servidores e parece que a ordem veio da diretoria da universidade;, completa. ;Queremos uma justificativa para uma atrocidade como esta.;
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A ideia dos futuros cientistas ambientais é apresentar uma alternativa ao sistema de monoculturas, diminuindo o desmatamento e o uso de venenos e agrotóxicos. Provar que é viável a produção alimentícia sem dano ambiental, de uma forma economicamente sustentável, também é um dos principais objetivos do projeto, também conhecido como GAIA, sigla para Grupo de Articulação e Interface em Agrofloresta. A essência é comunitária: o Centro Acadêmico propõe o movimento, mas a responsabilidade -- e a distribuição dos frutos -- é coletiva, inclusive para estudantes de outros cursos ou áreas.

Gustavo Cobelo conta que o espaço já sofreu outras quatro depredações. ;A gente vê que alguns departamentos, a reitoria e principalmente a prefeitura não reconhecem o projeto. Talvez eles achem que seja só mato e não um projeto que contem uma diversidade grande de plantas e riqueza de solo;, opina. ;É como se a gente perdesse um filho. Estou sem palavras. Não sabemos se é ignorância, mas, se for, queremos correr atrás para disseminar o conhecimento. Estamos fazendo uma carta de repúdio que queremos fazer chegar à reitoria.;
O projeto, segundo Gustavo, é um potente laboratório de pesquisa. ;Posso dizer que 50% do que eu aprendo no curso é aqui, porque é a prática;, reforça. ;Estudamos questões de solo, vegetação, microbiodiversidade e troca de saberes, porque enquanto estamos manejando, estamos trocando conhecimento.; O espaço também funcionava como projeto social: no dia 16 de março, estava agendada uma visita de alunos da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais DF (Apae). ;Já fizemos trabalhos lá com deficientes visuais também, explorando cheiros e texturas das plantas. Agora, não há mais nada para ser mostrado.;
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Caio Macedo, 27 anos, faz parte do projeto desde 2011. Para o também estudante de Ciências Ambientais, a devastação foi uma ;atividade cruel e desumana;. ;Eu acreditava que não veria mais essas cenas horríveis, de ver a agrofloresta no chão, mas depois de tanto tempo sem ataques, voltamos para um clímax como nunca antes;, desabafa. Segundo ele, os estudantes procuraram a reitoria para conversar com o mandante do ofício, mas foram informados de que só teriam uma resposta na segunda-feira pela manhã.
;Estamos reunindo contatos e queremos conversar com o diretor. Temos como finalidade aqui uma alternativa de produção agrícola e fazemos disso uma vitrine. Não só como uma bandeira, mas fazemos desse espaço um laboratório para gerar dados;, justifica Caio Macedo. ;É mais do que uma atividade bonita. Temos um fim acadêmico, científico.;

O outro lado


De acordo com Paulo César Marques, chefe de gabinete da reitoria da UnB, a retirada da agrofloresta se deu por uma ;falha de comunicação;. Segundo ele, até mesmo o termo ;agrofloresta; era desconhecido pela administração da universidade, que não teria conhecimento de que ali havia um projeto acadêmica em curso. ;Foi uma atividade de rotina da prefeitura, de fazer a limpeza e de cuidar do terreno;, completou. ;Reconhecemos que houve prejuízos, mas não há nenhum registro de que qualquer atividade estivesse acontecendo ali. Isso aconteceu por absoluta falta de conhecimento da administração.;

Paulo César Marques disse ainda que, além da falta de registro, a preocupação da reitoria é de que houvesse alguma instalação hidráulica irregular no espaço. ;Tinha uma pia lá, onde parece que até o pessoal dos quiosques lavava pratos;, detalhou. ;A prefeitura está fazendo uma revisão de todas as instalações hidráulicas do campus, por conta da crise hídrica.; Mesmo com a justificativa da pia irregular, Paulo Marques disse à reportagem não ter certeza de que a pia, de fato, estava sendo usada. ;Não estou dizendo que era uma instalação que estivesse em uso, mas encontramos essa pia lá;, justificou.

O chefe de gabinete da reitoria da UnB disse ainda que entrou em contato com o prefeito e com a reitora, Márcia Abrahão (ex-aluna de geologia da universidade) para conversar sobre o caso. ;Vamos orientar toda a comunidade para que qualquer experimento ou atividade comunitária seja comunicada à administração;, resumiu.

Paulo César Marques faz parte do gabinete da reitoria desde novembro de 2016. No dia 25 de julho de 2016, a UnBTV, veículo feito pela Secretaria de Comunicação (Secom) da UnB, veiculou uma reportagem sobre a agrofloresta. Mesmo com o registro, Paulo César afirma que nem a reitoria nem a administração da universidade tinham conhecimento do projeto. ;A vida na universidade é muito rica. A UnBTV e os veículos de comunicação da Secom têm autonomia para cobrir o que acontece na universidade. Mas se não está cadastrado, registrado, os funcionários têm que fazer a capinagem, a roçagem e a limpeza de terrenos. Não existia uma comunicação formal.;

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