Walter Gomes, supervisor da seção de colocação em família substituta da Vara da Infância e da juventude, relata que o recorde no cadastramento se deve à nova rotina estabelecida pela Vara da Infância e da Juventude do DF quanto às avaliações dos processos de crianças em situação de acolhimento institucional. As equipes responsáveis pela avaliação do processo de crianças e adolescentes que se encontram protegidas em abrigos conseguiram acelerar o trabalho para que o futuro da criança, seja a adoção, seja o retorno à família, se defina rapidamente. Com a nova rotina, as avaliações no DF são feitas no prazo máximo de 9 meses, possibilitando um aumento de chances de adoção.
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;As crianças são encaminhadas às instituições de acolhimento porque, em algum momento, tiveram seus direitos violados e encontram no abrigo um espaço de garantia. Elas foram negligenciadas, vítimas de violência sexual, emocional ou física;, explica Walter. Antes da inscrição no Cadastro Nacional de Adoção, há um esforço por parte da Vara da Infância para que essas crianças voltem para as famílias. Isso acontece porque a Lei entende que o melhor para a criança seria estar com a família biológica, mas elas não podem retornar até que o problema com a família seja resolvido ou que o risco seja eliminado. Quando o juiz conclui que não existe a possibilidade de a criança voltar para o convívio familiar, autoriza o cadastramento para adoção. A partir desse momento, a criança é desvinculada da família biológica e fica disponível para a formação de uma família com base no afeto. Apesar de estarem protegidas, essa decisão deve ser tomada de forma rápida, porque, quanto mais tempo essas crianças ficam sob a responsabilidade do Estado, menores as chances de serem adotadas. Segundo o supervisor, isso acontece porque ;a maioria das famílias habilitadas querem acolher uma criança com menos de 2 anos;.
A rapidez na decisão de destituição familiar poderia ter definido de forma mais ágil o futuro do pequeno Gabriel Luiz Ribeiro, 7 anos. Demorou um ano e meio, depois de sua chegada a um abrigo no Mato Grosso do Sul, o seu cadastramento para a adoção. No entanto, uma revisão na escala de prioridades de Luciana Ribeiro Brandão, 34 anos, que a princípio desejava uma menina de até 4 anos, deu uma nova família a Gabriel, aos 5 anos.
Aos 32 anos, Luciana, que tinha o sonho de ser mãe, decidiu adotar uma criança. Candidatou-se na Vara da Infância e da Juventude do DF e fez o curso obrigatório para o lançamento da habilitação. Em dois meses, durante a instrução que orienta o processo de adoção e deixa claro o perfil de crianças disponíveis e necessitadas de uma nova família, ela fez uma revisão de seus conceitos. Segundo Walter Gomes, essa mudança de pensamento em relação à adoção é fundamental. O padrão clássico é de uma criança de até 2 anos, branca e sem irmãos, estabelecido pelos pais habilitados.
Filhos sem padrão
Gabriel já saía dos padrões, por ter 5 anos, ser negro e ter irmãos. O pequeno também tem um Transtorno do Espectro Autista. Nada disso desanimou a futura mamãe. Luciana havia feito alterações no perfil do provável filho. ;Eu mudei a idade para 6 anos e que podia ter irmãos;, relata. Mas, quando conheceu Gabriel, os irmãos já haviam sido adotados.
Luciana encontrou o garoto por um sistema de ;busca ativa;, restrito para pais habilitados, que, de acordo com ela, ;é um esforço das varas de infância, grupos de apoio e da sociedade civil para encontrar famílias para as crianças fora do perfil preferido pela maioria dos pretendentes;. No sistema, são disponibilizados cadastros de crianças com informações como cor, idade, sexo, além de informar se tem alguma doença ou limitações físicas. Ao ver o perfil de Gabriel, ela entrou em contato com a Vara da Infância do estado de origem do pequeno, e recebeu mais informações.
Em busca do sonho de ser mãe, Luciana enfrentou uma viagem de 13 horas para conhecê-lo. Devido à falta de estrutura da cidade em comportar visitantes por um longo período, a fase de convivência com o pequeno foi intensa, mas também acompanhada por psicólogos. Terminada a fase de convivência, voltou para Brasília já com o filho. A transferência do processo do menino também aconteceu, e um ano e quatro meses depois, a nova certidão já estava nas mãos da nova mãe.
;Acho que o Gabriel já tinha entrado na minha cabeça quando soube dele. No mesmo dia, já estava pensando que, se não fosse buscá-lo, alguém chegaria na minha frente.; Segundo Luciana, a adaptação foi um pouco difícil, mas a família teve um papel fundamental. ;Eles incluíram o Gabriel na família de uma forma que eu me surpreendi. No aniversário dele, os primos deram uma medalha de ;melhor primo do mundo; e, pra mim, isso foi incrível.;
A aceleração do processo de decisão do futuro jurídico da criança é importante para que ela não perca a oportunidade de fazer parte de uma família, mas Walter Gomes ressalta a importância de uma mudança na cultura da adoção. ;Nós temos que sensibilizar as famílias sobre a realidade da adoção. Mostrar que o mais importante não é acolher uma criança, mas acolher um filho, porque pode ser que a família venha a ser muito feliz por acolher um filho que chegou com 15 anos, por exemplo. Quem disse que, só adotando uma criança pequena, a família será feliz?;.
Luciana relata que muitas famílias escrevem ou relatam nos encontros de pais habilitados que ;estão cheias de amor para dar às crianças;, mas que não conseguem adotar. A esses pais, ela aconselha repensar as exigências. ;O amor não acaba porque o filho não está dentro daquele padrão estabelecido. Eu poderia não ter adotado o Gabriel, e Deus me livre de viver sem esse menino.;
A conta que não fecha
- De acordo com dados estatísticos do Conselho Nacional de Justiça, das 7.195 crianças cadastradas, apenas 2.440 são brancas, o equivalente a 33,91%. Dos 38.200 pais cadastrados, cerca de 7.870 só aceitam crianças brancas, cerca de 20,6% do total.
- A preferência por crianças mais velhas é quase insignificante. Só 0,16% dos possíveis pais aceitam adolescentes a partir dos 14 anos, por exemplo. Mas eles correspondem a 8,8% dos cadastros disponíveis. Crianças nos 3 primeiros anos de vida são apenas de 3% a 4% do total, mas têm preferência da maioria.
- No Centro-Oeste, 600 crianças encontram-se cadastradas para adoção.