Jornal Correio Braziliense

Cidades

Apreensão de anabolizantes cresce até 60% no DF, diz Polícia Federal

Especialistas alertam para os riscos à saúde a partir do consumo dessas substâncias

O caminho fácil para alcançar padrões de beleza leva homens e mulheres a correr riscos de saúde e a se envolver com o crime. A cultura da valorização do corpo e os excessos para ganho de massa muscular resultam em consumo de substâncias que prometem resultado rápido, mas causam complicações e podem, inclusive, estar associadas ao tráfico. É o caso dos anabolizantes, substâncias que integram a lista de remédios controlados. Eles precisam de registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e dependem de prescrição médica para serem vendidos. Mas, ao contrário das regras regidas pela Portaria n; 344/1998 da Anvisa, muitos são ingeridos de forma proibida.

Desde 2013, a Polícia Federal registrou aumento de 50% a 60% de apreensões desses produtos. Levantamento da Delegacia de Repressão a Entorpecentes da Polícia Federal (DRE/DF) mostra que o Brasil é um dos países que mais vende anabolizantes. No DF, há um ano e meio, a Delegacia de Crimes Contra a Propriedade Imaterial (Dcpim) intensificou as ações. Desde o ano passado, a Polícia Civil investiga 14 flagrantes. Diferentemente dos suplementos, que funcionam como reposição alimentar, o comércio das ;bombas; ; que podem ser injetáveis ou em comprimidos ; é proibido, mas acabam sendo encontradas de forma velada em comércios e em sites ; essas substâncias só devem ser vendidas em farmácias e drogarias.

Alguns dos componentes encontrados nas fórmulas são enquadrados como entorpecentes, psicotrópicos e imunossupressores. A maioria deles é importada e, segundo a Polícia Federal, os países que mais ofertam são Estados Unidos, Rússia, China, Inglaterra e Paraguai. ;É uma prática que atinge todos os níveis sociais, especialmente a classe média alta. É um comércio que gera dinheiro. Um frasco é vendido a R$ 700 aqui ; fora do Brasil, ele custa a metade do preço. As vendas são feitas especialmente pela internet e em lojas, em uma espécie de mercado negro;, explica o titular da DRE/DF, delegado Kel Lúcio Souza.

As vigilâncias sanitárias locais fazem a fiscalização dos produtos em farmácias e drogarias. Além disso, a Anvisa conta com um Sistema de Gerenciamento de Produtos Controlados, por meio do qual esses comércios precisam informar o movimento de vendas dos produtos e de todos os medicamentos de uso controlado. ;No Brasil, as pessoas veem a substância sendo vendida na internet e acham que é autorizada ou regular, mas as informações circulam. Não é algo lícito, porque, se fosse, estaria exposto em lojas em fácil localização, o que não acontece;, alerta o delegado.

Segundo o investigador, empresários e autônomos trazem os anabolizantes de fora do país para empreitadas individuais. ;Gera lucro; por isso, atrai o aventureiro e o empresário que não quer trabalhar regulamentado. Quem vende suplementos não precisa atuar ilicitamente no mercado com anabolizantes, pois o risco é grande. Quem consome pode até não compreender o mal que faz e o tamanho prejuízo, mas a desinformação quanto à ilegalidade é quase inexistente;, diz Kel Lúcio.

Autorização
A titular da Dcpim, delegada Mônica Ferreira, detalha que, em alguns casos, essas substâncias são falsificadas. Essas ocorrências nem passam pelo controle de vigilância da Anvisa. ;Não se sabe nem se o produto é confiável. Não são utilizados só de forma ilegal para aumentar massa muscular, mas há médicos que prescrevem. A carga vem, inclusive, de outras unidades da Federação. E, com os anabolizantes, há remédios proibidos;, revela.

Entre as apreensões feitas pela Dcpim, há anabolizantes, remédios para disfunção erétil e até Cytotec, abortivo proibido no Brasil. ;Quando se dedica à ilegalidade, tudo atrai. Inclusive estabelecimentos que vendem produtos legais possuem os ilegais escondidos. Compram pela internet, mandam fazer rótulos, as tampas são adquiridas junto dos frascos e conseguem selar o produto;, detalha Mônica.

A farmacêutica da Diretoria de Vigilância Sanitária do DF, Luciana Zanetti, denuncia que, esporadicamente, hospitais e clínicas podem fazer uso de anabolizantes, mas não é frequente encontrá-los em unidades hospitalares. ;A fiscalização da Vigilância Sanitária é no controle. São verificadas as entradas dos produtos, as notas fiscais, a prescrição, a compra e a venda. Por serem considerados medicamentos, só podem estar em locais em que há permissão de comércio desse tipo de produto. Lojas de suplementos e academias não são estabelecimentos autorizados;, ressalta.

Segundo Luciana, que atua na Gerência de Medicamentos e Correlatos dentro da Vigilância Sanitária, os estabelecimentos que vendem ilegalmente anabolizantes podem ser autuados pelo órgão, e o produto, apreendido. ;Muitas das vezes, essas ações acontecem em parceria com a polícia, porque, se os estabelecimentos não têm autorização para comprar esses produtos, então quem vendeu? Em alguns casos, eles são uma ponta de todo outro contexto. Em certas circunstâncias, podem ser clandestinos e frutos de roubo de carga. A abrangência é de acordo com a gravidade;, destaca.

Vício
O nutricionista esportivo Daniel Novais alerta que anabolizantes comprados no mercado negro, como faz a maior parte dos consumidores, não têm nem mesmo a garantia se as informações presentes no rótulo fazem parte da substância. ;Não existe sequer uma vigilância. O que se consegue com um ano de musculação atinge em um mês com anabolizantes. Acaba sendo um vício químico e psicológico, como se fosse uma droga psicoativa;, conta.

Entre outros efeitos, essas substâncias podem causar doenças neurológicas, isquemia cerebral, problemas no sistema digestivo, desordem do ciclo circadiano, dependência, falência do fígado, insuficiência cerebral e insuficiência cardíaca. Segundo o coordenador de cardiologia do Hospital Santa Lúcia e conselheiro da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Lázaro Fernandes de Miranda, dependendo da idade da pessoa, a substância pode ocasionar alteração na estrutura óssea, infertilidade e hipertrofia do músculo cardíaco. ;Nós constatamos com frequência nos prontos socorros jovens que chegam usando esse tipo de produto com intenção de aumentar massa muscular e modelar o corpo com rapidez, mas, ao contrário, percebemos um músculo que é hipertrofiado, mostrando uma supermodelagem, mas enfraquecido;, afirma.

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