O tratamento de um paciente em sistema de domicílio, conhecido como home care, exige da família a adaptação do ambiente, a reestruturação da casa e o investimento nos cuidados médicos. Mas a dependência dos aparelhos ligados provoca outra despesa de alto custo na residência: a conta de energia elétrica. Diante disso, a filha de uma paciente com doença degenerativa progressiva tenta a inclusão no Programa Tarifa Social de Energia Elétrica, não sem enfrentar dificuldades. Em janeiro, a Companhia Energética de Brasília (CEB) negou o pedido em razão de a renda familiar ultrapassar em R$ 32 o valor exigido para ser beneficiário do programa ; só quem ganha até três salários tem o direito.
Thelma Pessoa Thizen, 39 anos, recorreu à Defensoria Pública, que enviou um ofício ao órgão a fim de tentar o auxílio. Pelo prazo, a CEB tem cinco dias úteis para responder, contados a partir do recebimento da notificação. Caso seja novamente negado, a analista administrativa pretende recorrer à Justiça. A mãe de Thelma, Iara Maria Pessoa Rodrigues, 61, vive desde 2003 acamada, vítima de acidente vascular cerebral (AVC) em duas ocasiões. Em um quadro clínico vegetativo, ela não mexe os membros, respira com ajuda de aparelhos e se alimenta por sonda. Há um ano, entrou em ventilação mecânica.
Para manter a servidora pública aposentada, são utilizados aparelhos de aspiração, nebulização e concentração de oxigênio. Além disso, é preciso um aparelho de no break, em caso de faltar energia. Iara está no tratamento home care desde 2012, quando conseguiu o benefício por força de liminar judicial.
A conta de energia da família passou de uma média de R$ 130 para até R$ 413,61, em dezembro de 2015. Ao procurar a CEB, Thelma recebeu a informação de que o benefício é contemplado apenas para famílias que recebem até R$ 2.640, mas a renda de mãe e filha chega a R$ 2.672 ; ultrapassa apenas 1,21% o limite. Segundo a analista administrativa, a mãe trabalhava no Ministério da Agricultura e recebe aposentadoria no valor de R$ 3 mil, mas paga R$ 1.035 de plano de saúde. ;Não levam em consideração nada disso. Eles pegam o salário bruto para fazer a conta. Não tenho condições de pagar uma energia alta desse jeito. Quem me ajuda é o meu tio, mas ele disse que a situação está ficando inviável. É muito caro;, reforçou.
O benefício da tarifa social de energia elétrica está baseada nas leis federais 10.438, de 26 de abril de 2002, e 12.212, de 20 de janeiro de 2010. No ofício encaminhado à CEB em 10 de maio, a Defensoria Pública explica que o excesso da renda de Iara e Thelma ultrapassa, apenas, o percentual de 1,21%. ;Não é, diante do contexto fático, razoável nem proporcional, que a autora seja excluída do programa;, informou o documento. ;Excluir a autora do programa social é negar vigência aos comandos insertos na Lei Brasileira de Inclusão que vista assegurar e promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e liberdades fundamentais;, aponta o documento.
Bom senso
O defensor público André de Moura Soares analisou que as regras objetivas fixando valores ou determinados limites para programas sociais são importantes, mas não podem ser o único critério. ;Uma pessoa com parente ou algum dependente com deficiência que não demande gasto excessivo de energia elétrica terá o benefício, e é justo, porque tem gastos extraordinários. Mas, diante dessa situação, que fica evidenciado o aumento do gasto energia elétrica justamente por causa da deficiência, é preciso que se aplique o bom senso e que a regra objetiva seja flexibilizada para não cometer uma injustiça;, considerou. ;O que a Defensoria Pública pede, neste tipo de caso, é que se aplique o bom senso;, ressaltou.
Por e-mail, a CEB apenas reforçou que a Tarifa Social de Energia Elétrica está vinculada a uma legislação federal, que, entre as exigências, pede renda mensal de até três salários mínimos. A companhia destacou ainda que o ofício foi protocolado na terça-feira e está sob análise da assessoria jurídica da empresa.