Jornal Correio Braziliense

Cidades

Livro sobre drama de povoado goiano com doença rara é lançado hoje

O povo da Lua conta bastidores da produção de série publicada no Correio sobre pessoas de vilarejo goiano que sofrem com o xeroderma pigmentoso. O trabalho mostra como o setor contribui para dar voz à população esquecida pelo Estado



Uma conversa de bar, um editor atento, um repórter dedicado e pronto: uma grande reportagem toma forma. A história da população do vilarejo de Araras, em Goiás ; que sofre com uma doença de nome difícil ; ficou conhecida em todo o Brasil com a ajuda do bom e velho jornalismo. A série publicada no Correio Braziliense em 2009 cresceu e virou livro: O povo da Lua, de Renato Alves. O subtítulo, na capa da obra, resume o teor: drama real de brasileiros abandonados pelo Estado e obrigados a trocar o dia pela noite por causa de uma doença rara, incurável e letal. Ela será lançada hoje, às 19h, no Ernesto Café Especiais (115 Sul).

Assim, o xeroderma pigmentoso (XP) e o dia a dia de pessoas como Djalma Antônio Jardim, Cláudia Sebastiana Jardim e José Cláudio Machado passaram a ser conhecidos pelo país. Grande parte dos habitantes do lugarejo sofre com o mal que atinge a pele, causa câncer e limita as ações diárias, uma vez que eles não podem ter contato com o Sol. As matérias escritas por Renato Alves, com o sensível trabalho fotojornalístico de Gustavo Moreno e Ronaldo de Oliveira, foram os primeiros passos para que o Estado tomasse conhecimento da situação daqueles cidadãos. Os poderes públicos foram cobrados, e a ação corajosa e incansável de Gleice Francisca Machado fez com que, pouco a pouco, a vida da população melhorasse.

Há de se destacar dois pontos fundamentais na obra: a sensibilidade para contar a história de gente que é vítima não só da doença, mas também do preconceito, e os bastidores de como uma reportagem desse tipo é feita. A primeira questão mostra a seriedade com que o tema deve ser passado adiante e deixa claro, desde o início, que aquelas pessoas não precisavam de pena, mas de ajuda governamental.

Assim, a linguagem direta e sem filtros usada por Renato Alves se ajusta perfeitamente à narrativa. São histórias contadas diretamente da boca de quem sofre com dores, não pode sair ao Sol, é impedido de brincar e precisa conviver com o preconceito. ;Mesmo com uma prótese no nariz, o rosto e o corpo mutilado pelo bisturi, e sabendo que vou carregar essas marcas para sempre, tenho esperança de que um dia encontrarei a cura;, diz Vanda Erestina Jardim. O repórter sabe que não precisa florear, colocar poesia ou literatura nessas falas. Elas estão ali e informam absolutamente tudo o que o leitor precisa saber.

A sensibilidade também é essencial na hora de fazer as imagens da história. O livro publica algumas fotos de Gustavo Moreno e Ronaldo de Oliveira. Elas, sim, passeiam entre a objetividade de uma prótese usada para cobrir as deformações e a sensibilidade de um contraluz, mostrando a força do inimigo Sol, tão forte e implacável no interior goiano.

;Autoridades;
Para Renato, a principal dificuldade veio no primeiro contato com os moradores de Araras. Não só o fato de tratar diretamente com a doença que mancha a pele e arranca pedaços do corpo. Mas, principalmente, a constatação do abandono pelo Estado e da esperança que aquelas pessoas depositavam nos profissionais da imprensa. ;Para eles, éramos a equipe do jornal, as primeiras ;autoridades; a darem atenção àquela comunidade;, aponta Renato, hoje, coordenador de reportagem da Editoria de Cidades do Correio e também autor do livro O caso Pedrinho, sobre o sequestro do menino em um hospital de Brasília.

[SAIBAMAIS]Então, entra a segunda parte fundamental da obra: os bastidores da reportagem. Muitas vezes, as pautas aparecem por e-mail, telefonemas e até cartas. Mas elas não precisam de meios tão formais. Afinal, as melhores histórias estão na rua, no dia a dia, em uma fila de hospital, em uma conversa de bar. Dessa forma, José Carlos Vieira, editor de Diversão & Arte do jornal, ficou sabendo do caso daquelas pessoas que não podiam viver sob o Sol e morriam de câncer por isso. Atento, Zé, como é carinhosamente conhecido, passou a pauta para o colega.

O leitor, então, fica sabendo como são feitas as pesquisas, a viagem e o dia a dia de uma equipe de reportagem. E da importância da publicação de séries como essas. ;Comprovando o poder do jornalismo comprometido com a solução de problemas e com a vida das pessoas, o trabalho de Renato (...) levou, sete anos depois, à radical mudança nas condições de vida daqueles doentes;, aponta Clara Arreguy, editora e coordenadora de produção da Outubro Edições, responsável pelo lançamento do livro. Prova cabal de que o jornalismo está vivo, muito além de listas, bizarrices e vídeos fofos, e se adapta a qualquer tipo de plataforma.

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Lançamento de O povo da Lua
Horário: hoje, às 19h
Local: Ernesto Café Especiais (CLS 115, Bloco C, Loja 14)