O H1N1 antecipou-se e, a 56 dias do início do inverno ; período comum para a circulação do vírus ;, tem deixado marcas indeléveis na capital federal. Cinco pessoas morreram e 65 estão doentes. Há ainda 221 suspeitas. Famílias inteiras estão imbuídas do sentimento de impotência frente à gripe que desafia as autoridades sanitárias. Nas casas onde houve óbitos, lamento e esforço para contornar a dor. Naquelas onde o germe passou, mas não matou, existe o medo de o mal voltar.
Há pouco mais de 20 dias, a servidora pública Leni de Fátima Nogueira Romualdo, 55 anos, perdeu o filho mais velho, o assessor parlamentar Ivo Nogueira Romualdo, 36. A morte atribuída ao vírus desmantelou a família, que mora em Planaltina. O homem deixou esposa e dois filhos, de 5 e 7 anos. Entre a internação e a morte, bastou uma semana. ;Estou vivendo dias de horror;, lamenta Leni.
Ivo permaneceu cinco dias em isolamento na unidade de terapia intensiva (UTI) em um hospital particular do Cruzeiro. O tratamento para diminuir a carga viral e recuperar os danos que o H1N1 causou no sistema respiratório do homem era feito de maneira que a doença recuasse o mais rápido possível. ;Os médicos garantiram que não havia mais perigo. Meu filho não tinha outras doenças e, na manhã do dia da internação, ele trabalhou normalmente;, conta Leni, ao destacar que Ivo sentia calafrios, fraqueza e teve diarreia aguda.
;Insuficiência respiratória causada por pneumonia grave e falência múltipla dos órgãos; é a causa da morte relatada no Boletim de Óbito. Entretanto, a família diz que o H1N1 agravou a situação. ;Fica uma revolta porque todo o tratamento foi para conter o vírus e o documento diz outra coisa;, reclama.
Na casa onde Ivo morava, poucas coisas mudaram de lugar. Os filhos pequenos não sabem totalmente da verdade. Os vizinhos preferem não tocar no assunto. ;Em uma semana, tudo virou de pernas para o ar. Ainda estamos em estado de choque. Agora é meu filho, mas pode ser qualquer um de nós. Isso me deixa sem chão;, conclui a servidora pública.
O Boletim Epidemiológico divulgado na noite de ontem pelo Executivo local reforça o temor de Leni. Há sete dias, a capital federal contabilizava 51 doentes ; 72,6% menos que o divulgado na ontem. Os casos suspeitos aumentaram 14%. Houve a internação de 55 pessoas devido a complicações da doença e uma morte se encontra sob investigação. Ao todo, 12 situações de infecção foram positivas em gestantes, sendo sete críticos.
O documento detalha que oito casos ocorreram em menores de 5 anos; um em criança de 10 a 14 anos; quatro em adolescentes de 15 a 19 anos; 31 em adultos de 20 a 59 anos; e 11 em maiores de 60 anos. Já entre os menos graves, quatro ocorreram em menores de 1 ano de idade; dois, em jovens de 15 a 19 anos; três, entre adultos 20 e 29 anos. Em Ceilândia (9), Asa Norte (8), Taguatinga (4) e Sobradinho (4), a incidência da doença é maior.
Hoje, nos postos do DF, ocorre a campanha nacional de imunização. A Secretaria de Saúde espera receber cerca de 300 mil pessoas, das 7h às 17h.
Sombra do mal
O ápice da gripe H1N1 ocorreu em 2009. Naquele ano, a capital federal registrou 10 mortes e 668 pessoas ficaram doentes. Entre elas, Isabela Momenté. A jornalista de 26 anos esteve 15 dias internada em um hospital particular no Lago Sul. ;Estava tossindo há muitos dias. Numa segunda-feira, eu acordei muito mal. À noite, estava febril. Na época, tinha morrido a primeira pessoa aqui. Procurei o médico, que não fechou o diagnóstico. Na quarta-feira, marquei 41;C de febre. Cheguei no pronto-socorro quase convulsionando;, lembra a jovem, que na época tinha 19 anos.
O pulmão da jovem perdeu a capacidade de oxigenação do sangue. Com pneumonia, Isabel ficou no isolamento. ;Havia um esquema de segurança para entrar no lugar;, conta. A tosse intensa causou complicações. ;Distendi o músculo do abdome de tanto que eu tossi. Três meses depois, e o cansaço severo continuava. Na época, o pneumologista disse que radiografias do meu pulmão identificariam as lesões até dois anos depois;, detalha a moradora do Riacho Fundo.
Com o aumento dos casos em 2016, Isabela está preocupada com o risco de contrair a doença novamente. ;Percebo que não é encarado com a gravidade que a doença demanda. Eu tinha certeza que eu não sairia viva daquela situação. Não existe essa de grupo de risco. Qualquer um pode contrair e ter agravos;, alerta a moça, que, atualmente, peregrina por laboratórios atrás da vacina.
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