Ana Dubeux, Ana Maria Campos, Denise Rothenburg
postado em 21/04/2016 07:10
Brasília chega hoje aos 56 anos num momento mais tranquilo para Rodrigo Rollemberg (PSB), em seu segundo ano de mandato, mas num turbilhão político nacional na Praça dos Três Poderes. Por isso, a principal missão do governador do Distrito Federal no momento é ajudar a criar um clima de paz entre os moradores da capital.
Em uma entrevista ao Correio, Rollemberg fala sobre a polêmica divisão de grupos pró e contra o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff nas manifestações do último domingo. Uma separação que ele rejeita ser tratada como muro. O governador conta que a ideia considerada polêmica saiu da sua própria cabeça e foi colocada em prática pelas forças de segurança. Pela tranquilidade com que os protestos ocorreram no último domingo, ele acredita que tomou a decisão certa. A depender do ambiente nas votações do impeachment no Senado, as divisórias devem retornar à Esplanada.
Sobre o futuro de Dilma Rousseff, Rollemberg acredita na aprovação da admissibilidade do processo de impeachment, o que levará ao afastamento da presidente do cargo. Quando o assunto é a possível delação premiada do ex-senador Gim Argello (PTB-DF), que teria arrecadado dinheiro de corrupção para bancar a chapa adversária à sua em 2014, Rollemberg desconversa. ;Isso é assunto para a Justiça;, diz.
O governador confessou, ainda, que no primeiro ano de gestão atuou internamente e destacou a intenção de ir agora mais para a rua. ;Foi muito importante esse olhar (para dentro do governo), esse controle do gasto, essa estratégia de ampliação da receita, mas tenho convicção de que agora nós devemos governar mais para fora;, ressaltou. Negou, no entanto, estar trabalhando num projeto de reeleição. ;Estou muito concentrado na perspectiva de ser um bom governador e entregar uma cidade melhor do que recebi. E para ser um bom governador é fundamental estar em contato com a população;, frisou.
O muro virou um símbolo da divisão do país. Vai continuar para as próximas fases do impeachment no Senado?
A divisória que colocamos na Esplanada foi um instrumento para garantir a livre manifestação das pessoas, a integridade delas e do patrimônio público. Mostrou-se bem-sucedida. Pela primeira vez na história, nós tivemos uma manifestação de 80 mil pessoas com opiniões divergentes em um ambiente extremamente radicalizado. O esquema de segurança montado permitiu que as pessoas pudessem se manifestar livremente com segurança. Essa divisão que tomou conta do país não foi feita por nós. Nós, como responsáveis pela segurança, tivemos de tomar providências para que as pessoas pudessem se manifestar livremente sem problemas e foi o que aconteceu.
E vai continuar?
Provavelmente, sim. Se a expectativa para a votação no Senado for de um número grande de pessoas, com opiniões divergentes, em um ambiente de pouca tolerância política, como estamos vivendo, devemos manter todo o esquema de segurança que foi muito bem-sucedido.
O senhor já foi senador e conhece bem aquela Casa. Acha que eles vão optar pela continuidade do processo?
É provável que sim. Vai depender muito do momento que se der a primeira votação. São dois momentos: o primeiro é o da admissibilidade da continuidade do processo, e nesta fase é preciso apenas de 41 votos. Nesse sentido, é muito provável que o Senado aprove. Em relação ao julgamento propriamente dito, vai depender muito dos acontecimentos das próximas semanas e dos próximos meses. Mas é claro que o fato de a admissibilidade produzir o afastamento imediato da presidente criará dificuldades para o seu retorno. No entanto, como temos um ambiente de muita instabilidade, qualquer previsão seria muito arriscada.
O senhor conviveu com o ex-senador Gim Argello no Senado. Imaginava que ele estaria enrolado a ponto de o juiz Sérgio Moro decretar a prisão dele? Em algum momento, suspeitou que pudesse ter alguma coisa errada naquela CPI da Petrobras?
Em relação à CPI da Petrobras, não. Eu tive um momento, digamos assim, com o senador Gim Argello, em que apresentei um candidato alternativo à sua candidatura no Tribunal de Contas. Isso acabou inviabilizando a sua ida para o TCU, mas não tive nenhum conhecimento desses acordos relativos à CPI da Petrobras.
Esse acordo que levou à prisão do ex-senador Gim Argello financiou uma candidatura de toda uma chapa que concorreu contra a sua na campanha de 2014. Eles tinham muito dinheiro na campanha? Já havia essa suspeita de que o dinheiro poderia ser fruto de corrupção?
Esse é um assunto da Justiça. Vencemos as eleições com todas as dificuldades. Tivemos oportunidade, na ocasião, de dizer quais eram os interesses que estavam representados em cada candidatura, e isso é passado. Está nas mãos adequadas, que são as mãos da Justiça.
Na sua opinião, Gim tem perfil para fazer uma delação premiada?
O que a gente está percebendo é que muitas das pessoas envolvidas estão utilizando desse artifício para obter a redução de pena. Não tenho condições de julgar se o Gim fará ou não delação.
Um dos presos nessa operação, que é uma etapa da Lava-Jato, Valério Neves, era o braço direito da presidente da Câmara Legislativa, Celina Leão (PPS). Ela está fazendo uma campanha grande a favor da Lava-Jato e contra a presidente Dilma Rousseff . Acha que, de alguma forma, aquela prisão a constrange?
Essa pergunta tem que ser feita para a presidente da Câmara. Tem que se conhecer quais razões levaram à prisão e qual é o envolvimento dele. A versão que tive conhecimento, e publicada pela imprensa, é de que ele teria ido à empresa para apontar quais seriam os partidos beneficiários da doação. Não podemos dizer de antemão que o partido que tenha recebido um recurso de doação de uma empresa soubesse da origem daquele recurso. Temos de ter muita cautela e, por isso, considero importante registrar que isso está nas mãos adequadas. Quem tem condições de avaliar essas questões é a Justiça. Com qualquer prejulgamento, poderíamos estar cometendo uma injustiça.
Voltando à questão do muro, como foi tomada a decisão de se fazer a divisão? Como o senhor avalia o resultado desse trabalho?
Previa, desde o início, que teríamos momentos muito tensos com a situação política no Brasil. E decidi que a minha maior responsabilidade era garantir que as pessoas pudessem se manifestar livremente e garantir a integridade física delas e do patrimônio. Isso me levou a tomar uma decisão que hoje considero correta, embora tenha sido incompreendida por muita gente ; a de que não deveria explicitar uma posição sobre o impeachment. O fato de não manifestar uma posição me dava condições melhores de dialogar com os diversos lados buscando garantir a segurança em um momento muito delicado da história do nosso país.
Houve muita pressão?
Tinha como grande desafio o dia da votação do impeachment, porque nossa expectativa era de que tivesse algo em torno de 100 mil pessoas com opiniões diferentes em um ambiente extremamente radicalizado. Isso poderia resultar em uma confusão envolvendo centenas de milhares de pessoas. Então, tomamos todas as precauções. Em determinado momento, depois de um fim de semana muito preocupado e refletindo sobre isso, convoquei a secretária de Segurança, o comandante da PM e o chefe da Casa Militar e submeti a eles a ideia de fazer uma divisão no centro da Esplanada que pudesse comportar de um lado o movimento pró-impeachment e de outro lado o movimento anti-impeachment. E aí veio a competência das nossas forças de segurança que desenvolveram essa ideia da forma mais adequada possível. Nós resistimos a todas as pressões que vieram de todos os lados no sentido de buscar modificar o nosso protocolo de segurança.
O senhor falou em pressão de todos os lados. Poderia citar quem mais pressionou?
Da Câmara dos Deputados, o presidente, Eduardo Cunha, nos solicitou por duas vezes que liberássemos o gramado em frente ao Congresso. Recebi quatro parlamentares também fazendo a mesma solicitação e, para todos, disse que era impossível, pois nós entendíamos que seria muito arriscado deixar concentrar muita gente em um ambiente tão apertado. De membros do governo federal, o pleito (foi) para deixar o acampamento do MST permanecer ao lado do Teatro Nacional. E a gente tinha definido desde o início, em comum acordo com a direção dos movimentos, que ninguém poderia acampar na área da Esplanada dos Ministérios. Na véspera, alguns grupos ligados à força sindical e ao movimento pró-impeachment tentaram fazer. Não deixamos e encaminhados para o Parque da Cidade. No domingo, foi o grupo dos sem-terra, que, após muito diálogo, nós conseguimos convencê-lo a fazer a transferência para o Mané Garrincha.
Houve até um desentendimento entre a Força Nacional e a PM...
Houve um desentendimento pontual porque a Força Nacional entrou em ação para dar segurança ao movimento sem autorização do Governo de Brasília e ela não poderia atuar sem a solicitação do governo. Pedi, então, ao comandante da PM para que fosse ao local e determinasse a imediata retirada da Força Nacional, e assim foi feito.
A repercussão do muro foi de um símbolo da discórdia nacional. Isso, de alguma forma, o incomodou?
Tinha muita segurança de que não havia alternativa melhor que aquela. Estamos vivendo um ambiente da crítica muito fácil. Ouvi muitas pessoas, algumas até com responsabilidade e notoriedade, fazendo críticas. Só respondia: ;Aponte uma alternativa melhor;, e nenhuma foi capaz de mostrar uma opção melhor do que aquela que se mostrou muito bem-sucedida.
Com o resultado que o muro trouxe, esse mesmo modelo pode ser aplicado em manifestações futuras caso haja um número expressivo de pessoas em outros protestos na Esplanada?
A gente fez aquilo por necessidade, mas o nosso desejo é que não precise fazer isso. O nosso desejo é ter uma cidade e um país que as pessoas possam conviver com opiniões divergentes de forma respeitosa sem se confrontarem nas ruas. O problema é que tivemos, no dia da posse do ex-presidente Lula (como ministro-chefe da Casa Civil), uma demonstração do que poderia acontecer se não tivéssemos tomado essa providência.
Depois, as pessoas entraram em um clima de humor em relação ao muro...
Achei muito bacana vários posts que tivemos nas redes sociais, das pessoas regando as flores, das pessoas jogando vôlei; Foi interessante quando visitei o Centro Cultural do Conic, ao longo desta semana, e uma menina falou bem assim: ;Só não gostei daquele muro, tira aquele muro;. E respondi: ;O que que eu ponho no lugar?;. Ela falou: ;Põe flores;. Eu desejo que, um dia, a nossa cidade seja assim, mas ainda não é.
Houve um público menor do que o esperado no dia da votação. O senhor atribui isso ao muro ou ao receio de confronto?
Essa questão é para ser vista pelos analistas políticos, porque não foi só em Brasília. Em todas as unidades da Federação, houve um número menor de pessoas, tanto pró-impeachment tanto contra o impeachment.
No aniversário de Brasília do ano passado, a cidade estava um caos. Sente -se mais a vontade agora?
Nós assumimos o Governo de Brasília na pior situação de todas as unidades da Federação. Salários atrasados, 13; salário atrasado, horas extras atrasadas, antecipação de férias atrasada. Um rombo de R$ 6,5 bilhões entre dívidas do governo anterior e buracos no orçamento de 2015, o que nos obrigou a tomar medidas duras ao longo de 2015. Foi um ano muito austero, ainda mais agravado pela crise econômica que nós tivemos no país em 2015. Isso deu resultados. Hoje, Brasília está em uma situação muito melhor do que a maioria dos estados. Estados importantes, como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul estão atrasando e parcelando salário. Nós estamos pagando os servidores em dia, o 13; dos aniversariantes do mês em dia, pagamos antecipação de férias dos professores no quarto dia do ano ; coisa que não acontecia há muito tempo ;, estamos pagando os prestadores e fornecedores de serviço do nosso governo praticamente em dia, estamos pagando parte da dívida que herdamos... Portanto, estamos organizando a cidade. Nós não estamos ainda em uma situação folgada, porque temos uma realidade econômica nacional muito grave. Mas o ambiente está muito melhor, e a gente espera superar esse ambiente político radicalizado, essa intolerância que tomou conta da política para que possamos resgatar o alto-astral, a alegria, e para que o país possa viver um outro momento. Eu sempre fico pensando nos ditados populares. Um deles é que depois da tempestade vem a bonança, e eu estou esperando a bonança.
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