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Pirenópolis (GO) pode ficar sem pousadas em área rural

A prefeitura quer cobrar de empresários do setor hoteleiro o pagamento da taxa de áreas hoje consideradas rurais. Projeto será apresentado nesta terça-feira em reunião do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente

Um polêmico projeto de resolução do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Condema) de Pirenópolis (GO) coloca em lados opostos donos de pousadas e a prefeitura da cidade. Hoje, os estabelecimentos estão localizados em área considerada rural, mas o poder público pretende transformá-la em área urbana para poder cobrar dos proprietários o pagamento de IPTU (Imposto Predial Territorial e Urbano).
Na manhã de hoje, uma reunião do Condema deve discutir o projeto de resolução. Caso a mudança seja aprovada, além da possibilidade de cobrança de IPTU, a Serra dos Pirineus Área de Proteção Ambiental (APA) ganhará status de Área de Proteção Permanente (APP), o que proibiria novos parcelamentos de terra e qualquer outra construção. No local, somente poderiam haver atividades estritamente rurais, como agricultura, pecuária e extrativismo.
Representantes do setor turístico ouvidos pelo Correio revelam que há intenção, inclusive, de derrubar pousadas e restaurantes como forma de preservar os mananciais, além de proibir a criação de novos sítios. Ameaçados, os proprietários das terras pensam até mesmo em desmatar área verde para formar pequenos pastos de boi e garantir que não seja considerada urbana.

Segundo pousadeiros, a ação é uma retaliação para atingir as pessoas contrárias ao time share, projeto que vende imóveis por meio de cotas. Tratam-se de condomínios ; destinados à moradia e ao turismo. Ativistas se articularam em um movimento batizado de Piri Sem Time Share. O abaixo-assinado na internet contrário às obras contava, até ontem, com a participação de 2.489 pessoas.
O prefeito de Pirenópolis, Nivaldo Melo (PP), negou qualquer existência de reação contra o movimento Piri sem Time Share. ;Estamos simplesmente cobrando que nossos empresários se regularizem para que estejam formalizados não somente no registro, mas que tenham um projeto ambiental e estrutural, que deveria ser exigido na construção e não foi feito nas gestões anteriores. Não há retaliação. Quem me conhece sabe que não faço isso. Essa é conversa da oposição. Não sou político, mas empresário;, disse. ;Queremos ordenar a ocupação.;

Regularização

O secretário de Meio Ambiente do município, Arthur Pereira Abreu Júnior, também negou qualquer tentativa de votar e aprovar o projeto na reunião marcada para as 9h de hoje. Segundo ele, a proposta ainda está em fase de discussão. Para o secretário, a intenção é regularizar atividades que são exercidas de forma ilegal. ;O que está acontecendo é um grande fracionamento de terras na região. Os herdeiros dos grandes fazendeiros estão vendendo terras de 20 mil metros para a construção de um monte de residências contrariando aquilo que a lei determina. O decreto do Incra diz que em zona rural pode ter atividade urbana, como posto de gasolina, hotéis e pousadas, desde que se desmembre a área. O que aconteceu foi a construção de hotéis sem esse desmembramento. Portanto, os proprietários continuam pagando Imposto Territorial Rural (ITR), mas exercendo atividade urbana;, explica.
Segundo Abreu, a discussão em torno de APA e APP tem como objetivo preservar áreas de nascente e evitar que o acúmulo de pessoas chegue aos mananciais. ;O que a resolução quer fazer é manter a proteção que o próprio Plano Diretor e a resolução determinam. Em Pirenópolis, as pessoas nunca observaram as leis e construíram zonas rurais sem normas nem regras, desmatando, construindo e fazendo fossas. Agora, estão preocupados porque terão de se adequar;, alfinetou.
O presidente do Condema, Pedro Ulisses de Morais Pina, tenta amenizar o clima de tensão que se instalou na cidade. Segundo ele, o projeto será apenas apresentado na reunião de hoje. Ele, no entanto, não descarta a votação da proposta. ;A regulamentação trata a questão do parcelamento do solo em zona rural. A proposta é ordenar para não haver vendas clandestinas de qualquer aspecto na zona rural. Tudo está sendo discutido e a nossa intenção é formalizar. Caso consigamos chegar a um consenso, pode ser que o projeto seja votado;, informou. ;Hoje, um terreno de 20 mil metros, parcela mínima que pode ser vendida, é transformado em 10 lotes de mil metros;, destaca.
Um dos colaboradores do movimento Piri Sem Time Share, Filipe Amaral, ressalta que a intenção do poder público é cobrar impostos que há décadas deixaram de ser exigidos por leniência, falta de documentação e cumprimento da legislação vigente. ;O licenciamento ambiental das pousadas passou para a prefeitura e eles começaram a notificar os donos dos estabelecimentos em outubro e novembro do ano passado. Quem movimenta a vida da cidade são as pousadas e os restaurantes. As pousadas em áreas rurais são de bom padrão e algumas, inclusive, se transformaram em reserva ambiental. Essas pessoas vão sofrer com a taxação, porque são terrenos grandes e isso vai mudar muita coisa em uma atividade que não é tão lucrativa. Quem vem à cidade está preocupado com a sustentabilidade;, afirmou Filipe Amaral.
Dona de uma reserva ecológica em via de se transformar em Reserva Particular do Patrimônio Natural e uma das fundadoras da Associação dos Moradores e Amigos de Pirenópolis (AMO Pirenópolis), Jeanne Marie Caraívas questiona: ;Não tem como ser uma atividade urbana se a reserva ecológica tem 360 mil metros dos quais apenas 2 mil metros são utilizados como uso do solo. O resto é floresta que há 30 anos está sendo conservada. A lei fala que somente é considerada propriedade rural aquela que desenvolve pecuária, agricultura e extrativismo. Isso vem na contramão daquilo em que se acredita para defender o meio ambiente;, ressaltou Jeanne.