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Entrevista: presidente do Cade diz que consumidor de Brasília foi aviltado

Depois da Operação Dubai, que desbaratou um esquema de combinação do valor da gasolina e do etanol, o presidente do Cade revela, em entrevista ao Correio, detalhes das investigações. Ele acredita que o preço nas bombas vai cair 20%

Helena Mader
postado em 06/12/2015 08:00
Depois da Operação Dubai, que desbaratou um esquema de combinação do valor da gasolina e do etanol, o presidente do Cade revela, em entrevista ao Correio, detalhes das investigações. Ele acredita que o preço nas bombas vai cair 20%

Presidente do órgão encarregado de garantir a livre concorrência e de investigar esquemas de combinação de preços, Vinícius Marques de Carvalho acredita que o valor dos combustíveis em Brasília vai cair pelo menos 20% depois do escândalo envolvendo donos de postos na cidade. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) participou ativamente da Operação Dubai, que, em parceria com a Polícia Federal e com o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do MP (Gaeco), desbaratou um suposto esquema criminoso. ;Se, além de desestabilizar o cartel, a gente conseguir implantar medidas estruturais, com uma nova legislação, não tem por que essa queda dos preços não acontecer. A gente espera ter um mercado concorrencialmente mais saudável e com preços mais baixos para os consumidores de Brasília;, afirma.

Vinícius Marques explica que a concentração de mercado no segmento de combustíveis no DF é atípica, o que é lesivo para o consumidor. ;Brasília tem um problema estrutural. Há duas ou três redes que têm 50% do mercado da cidade;, justifica. ;Nos últimos anos, o consumidor de Brasília foi aviltado com o combustível mais caro do país. Está se configurando a hipótese de que isso seja decorrência da existência de um cartel de fato, da combinação de preços;, garante o presidente do órgão. ;É possível que essa estrutura de mercado tenha se mantido assim porque a atuação dos postos foi eficaz em impor seus interesses em detrimento dos interesses da população;.

Em 2002, a Câmara Legislativa realizou uma CPI, que indicou praticamente os mesmos fatos trazidos à tona pela Operação Dubai. Por que o desfecho demorou tanto?
Combater cartéis de postos têm sido uma prioridade no Cade há muitos anos. Quase 40% das condenações que nós temos em cartéis são de postos. Temos hoje cerca de 30 processos com condenação, além de 10 processos pelo menos ainda tramitando. Cartel é algo difícil de provar em qualquer mercado. As pessoas normalmente têm uma avaliação de que, se elas passarem em duas ou três lojas e virem o mesmo preço, isso configura a existência de um cartel. E, como nos postos o preço é transparente, já que você passa na rua e vê o letreiro com os valores, essa sensação aumenta. Quando há mercado como o de combustível, que é um produto homogêneo, com vários pontos de venda, a tendência é que haja mesmo pouca variação de preços. Até em mercados em que há muita concorrência, os preços tendem a ser semelhantes, porque os empresários colocam o valor muito perto do custo. Não é porque preço é parecido que há cartel.

Então como comprovar a existência de um cartel?
Preços parecidos, mas com margem alta de lucro, como é o caso de Brasília, podem representar um indício de cartel. Para condenar, entretanto, é preciso comprovar o acordo. O que acontece aqui em Brasília foi que, como houve CPI, houve processos abertos no Cade há muito tempo, a população e a imprensa inteira falam sobre o assunto, quem comete o ilícito sabe que está na mira e vai tentar não deixar brecha. A investigação tem que ser muito minuciosa e silenciosa. Normalmente, nas primeiras investigações, a gente pede autorização judicial para busca e apreensão.

Em um mercado como o de Brasília, sobre o qual pairam suspeitas de cartel há muito tempo, como investigar as denúncias?
Em casos como esse, é preciso de fato que as investigações sejam mais profundas. Porque senão os empresários pensam em estratégias para desviar as apurações. Nesses casos, a gente lança mão da parceria que temos com as polícias e com o Ministério Público. Com uma investigação criminal, podemos lançar mão de outros instrumentos como quebra de sigilo ou interceptação telefônica. Com essa parceria, a estratégia passa a ser coordenada entre todos. Aqui em Brasília, a atuação conjunta começou a partir de 2012. Entendo a preocupação da sociedade com a demora das investigações, mas foi importante para termos um processo robusto.

Quais são as peculiaridades do mercado de Brasília?
Brasília tem um problema estrutural. Temos duas ou três redes que têm 50% do mercado da cidade. E eu falo em número de postos, nem falo em faturamento, porque ainda não temos esse dado. Quando você tem uma investigação de cartel e há essas condições estruturais no mercado, a preocupação é de, ao mesmo tempo, investigar e coibir. A gente quer, depois ou durante essa investigação, desestabilizar o cartel e ter um mercado competitivo depois. Eu acho que não existe nenhuma outra cidade com mais de 500 mil habitantes em que uma rede tenha quase metade do mercado.

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