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Com pouco pagamento em dinheiro, comércio tem dificuldade em passar troco

Este ano, o Banco Central colocou em circulação 419 milhões de novas unidades


Joseane de Oliveira, auxiliar de um armarinho" /> 

 

Seja de 5, 10, 25, 50 centavos, seja de 1 real, as moedas estão sumidas. As de 1 centavo, então, nem se fala. Há anos não são vistas por aí. Se procurar, até se acha uma ou outra na bolsa, mas, na praça, tem sido artigo de luxo. Para ter algumas no caixa, o comerciante tem feito de tudo: promoção para incentivar o cliente a trocar uma quantia de dinheiro, acordo com vigias de carro e até assumido uma margem de prejuízo. Largadas no fundo das gavetas, dos bolsos ou dos cofrinhos, elas fazem falta, prejudicam o comerciante e ajudam a aumentar a inflação, em tempos em que a economia não anda tão cordial com o brasileiro.

Desde o começo do ano, o Banco Central disponibilizou 419 milhões de unidades de novas moedas. Parece muito, mas, na prática, não é. Tanto que estão em falta. Um dos motivos, de acordo com o BC, foi a redução na produção desde 2014, por conta da crise financeira, que forçou também a redução nas despesas públicas. O Banco Central tem tido que administrar os estoques para atender às demandas em âmbito nacional.


Em uma rede de supermercados da cidade, vale até comprar o dinheiro. O cliente que levar de R$ 100 a R$ 150 em moeda ao estabelecimento, sai de lá com o dinheiro em cédulas de papel e ainda leva uma caixa de bombom. O objetivo é fazer com que as pessoas tirem as moedas de casa e dos cofres. “Tem bastante gente que traz, mas, mesmo assim, não conseguimos ter a quantidade que precisamos. Hoje (ontem), por exemplo, estamos sem moeda alguma nos caixas. Às vezes, o cliente até fica bravo, pois não temos troco. Acaba que pagam com o cartão”, contou o gerente do mercado, Sérgio da Silva, 49 anos.

O cartão ajuda nessa hora; porém, também é um dos motivos que atrapalham a movimentação de dinheiro. Segundo levantamento da Associação das Empresas de Cartões (Abecs), os brasileiros movimentaram R$ 509 bilhões em compras com cartões de crédito e débito no primeiro semestre do ano, o que representa um crescimento de 10,2% em relação ao mesmo período de 2014. As compras com cartões de crédito somaram R$ 324 bilhões (alta de 10,1%) .

Em um comércio do Sudoeste, a reportagem acompanhou os pagamentos feitos pelos clientes. A maioria não tinha dinheiro na carteira. Em uma situação, a cliente deixou de pagar com uma nota de R$ 20, pois a conta tinha dado R$ 10,49. Por não ter moedas e por não querer troco picado, preferiu acertar a conta com o cartão. “Às vezes, a pessoa tem até preguiça de procurar. Mas, quase sempre, principalmente as mulheres, têm umas perdidas na bolsa”, diz Víctor de Oliveira Lima, 41, sócio-proprietário de um restaurante.

Desde que abriu o estabelecimento, há três anos, é preciso esforço para manter o caixa com moedas. Uma das táticas é colocar um aviso no balcão, com um pedido educado: “Precisa-se de moedas”. Alguns se sensibilizam. “Com os mais íntimos, eu mesmo peço. Mesmo assim, tenho que ir ao banco todo dia, pegar fila, para conseguir algumas. E tem dia que nem o banco tem moeda.”

Entre 2014 e 2015, a redução do suprimento de moedas é de 38%, em comparação com os anos anteriores. Até 2014, o BC colocava em circulação 1,6 bilhão de unidades ao ano, em média. Em 2015, a previsão é de entrada em circulação de um total de 1 bilhão de novas moedas. Em 2014, o fornecimento foi de 1,03 bilhão de unidades. Tem quem tente ajudar. A aposentada Rosária da Costa Moraes, 70, quase não usa cartão. Sempre leva uma bolsinha cheia de moedas e notas de dinheiro trocadas. “Já mexi com comércio e sei como é difícil. Além disso, quando se compra à vista, com dinheiro, você ainda pode pedir desconto.”

Jeitinho

A auxiliar de um armarinho Joseane de Oliveira, 28, desenvolveu uma estratégia. Como o comércio vende pequenas coisas, é essencial ter dinheiro trocado. “Quando chegam aqui com cédula alta, sempre peço, com jeitinho, para ver se tem moeda na bolsa. Também agradeço.” Já na padaria, quando o cliente não pode ajudar, a solução é improvisar. “A gente vai ao estacionamento e tenta trocar com os vigias de carro. Ou, então, vamos às igrejas”, afirmou o gerente Robert da Silva Sousa, 29.

Segundo o economista Flávio Augusto Corrêa Basílio, especialista em fluxo de capital, uma das respostas imediatas da falta de moeda circulante é a remarcação dos preços. Para não sair no prejuízo, muitas vezes ocasionado pela impossibilidade de cobrar os centavos de dinheiro em moedas, o comerciante vai achar uma saída. “Para produzir moeda, há um custo fiscal e o banco está economizando. Para o comércio, as transações ficarão mais onerosas e eles reajustarão o preço para cima.”

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