Jornal Correio Braziliense

Cidades

Conselho Tutelar deve notificar família de aluno que levou remédio à escola

Estudante tomou o medicamento controlado com cinco amigos e três deles pararam no hospital

Um adolescente de 13 anos que levou os remédios controlados da avó para uma escola recoloca em discussão a relação entre as crianças e os medicamentos. O episódio ocorreu no Guará, local em que o menino estuda e próximo ao bairro onde vive, a Cidade Estrutural. Ele levou cerca de 25 pílulas do tarja-preta Rivotril e distribuiu a cinco amigos. Três deles foram encaminhados ao Hospital Regional do Guará (HRGu) apresentando sintomas como sonolência e tontura. A diretora do Centro de Ensino Fundamental 8, onde estudam, pretende fazer ações educativas para evitar novos casos.

[SAIBAMAIS]O professor da faculdade de medicina da Universidade de Brasília (UnB) Rafael Boechat afirma que uma superdosagem do remédio não é letal. No entanto, alerta o perigo de facilitar o acesso de crianças a qualquer tipo de medicação. ;O Rivotril não traz risco de morte, mesmo sendo tarja preta. A aspirina, que todo mundo toma, consumida em excesso, causa hemorragia e até mata;, explica. Por isso, é importante deixar os frascos em lugares de difícil acesso e controlar a quantidade do produto. ;O perigo é que os pequenos têm fascínio por remédios;, completa Boechat.

No caso do Guará, quatro meninos e duas garotas, com idades entre 12 e 16 anos, ingeriram o medicamento na hora do intervalo, segundo a diretora da escola, Maria Amélia Gusmão. ;Um menino começou a passar mal na aula de educação física. Depois, percebi que eram vários com os mesmos sintomas;, diz. O Corpo de Bombeiros e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) foram convocados e chegaram rapidamente. Com a turma ainda na escola, os pais dos alunos foram contactados.

Entre eles, estavam o cozinheiro Rosenilson Rodrigues da Silva, 38, e a artesã Danusa de Castro Souza, 32, moradores da Estrutural. Assim que eles souberam do ocorrido, foram direto para o HRGu. Quando chegaram ao local, a criança estava tomando soro, e, segundo o pai, aparentava estar dopada. ;Parecia que ele tinha tomado pinga durante uma semana. Estava com os olhos baixos, falando manso e cambaleando;, lembra.

A família acha que colocaram o remédio no achocolatado do menino, pois, segundo ele contou para os pais, recebeu as cápsulas de um amigo, mas as jogou pela janela. Com medo que alguém pegasse, foi recuperá-las no exterior do colégio. Quando voltou, sentiu um gosto diferente na bebida. Depois, vieram os sintomas. Nenhum dos dois culpou a escola pelo ocorrido. ;Acho que é dever dos pais orientar os filhos;, afirma Rosenilson.

O remédio levado ao colégio era da avó de um dos meninos. Sônia* responsabiliza as crianças pelo problema. ;Todo mundo sabia que estava tomando uma coisa que não era permitida. Estão todos sem razão;, critica. De acordo com ela, o neto não tinha acesso ao medicamento. ;Meu neto nunca foi de dar trabalho. Foi uma surpresa para a família;, conclui.


Sem acesso

Para dificultar que situações semelhantes aconteçam, o coordenador regional de Ensino do Guará vai implementar ações educativas nas escolas da região. Para Afrânio Sousa Barros, o intuito é mostrar os riscos relacionados à automedicação. ;Nós vamos investir na educação relacionada ao assunto. Os jovens precisam saber recusar aquilo que lhes é ofertado;, disse. ;Convocaremos o Conselho Tutelar para verificar quais são as orientações que esse adolescente recebe em casa, de que maneira ele está exposto a uma situação como essa e qual é a facilidade de obter, na própria residência, um medicamento tarja-preta;, completou.

O Conselho Tutelar do Guará aguarda o comunicado da escola com o nome das crianças e dos adolescentes envolvidos. O conselheiro Jeferson Maximino informou que as famílias serão notificadas pelo ocorrido. ;Vamos responsabilizar os pais desses jovens no sentido de mostrar que o remédio é um produto perigoso e demanda certo cuidado;, explicou.

A psicóloga clínica Juliana Gebrim aponta que o caso foi provocado por uma reação em cadeia. ;Em primeiro lugar, o médico que prescreve uma receita como essa deve alertar os adultos sobre os efeitos colaterais do remédio e orientar o acesso restrito para aqueles que convivem com crianças em casa;, afirmou. Ela classifica o fato como uma negligência e não como um comportamento acidental. ;Quem toma tarja-preta precisa ter cuidado redobrado.;

* Nome fictício em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente