Jornal Correio Braziliense

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Normose, um distúrbio da vida moderna que pode ser curado com terapia

Ter um plano de vida e programar o futuro está longe de ser uma raridade. Mas, nos dias de hoje, aquele que só pensa nisso e chega a anular sonhos e vocações pode ser uma vítima da doença. Especialista no assunto vem a Brasília para série de palestras

A sociedade moderna, com o corre-corre, a falta de tempo para o cuidado espiritual e o imediatismo fez com que as pessoas desenvolvessem com mais facilidade algumas doenças psicossomáticas. O pânico e a depressão são duas delas, assim como a normose. A última é uma “prima” menos conhecida e, por isso mesmo, menos identificada, segundo especialistas. “Ela (normose) surge quando o sistema no qual nós existimos encontra-se dominantemente doente, desequilibrado, corrompido, e quando predomina a violência, a competição e o egocentrismo. Uma pessoa adaptada a esse sistema está doente”, explica o psicólogo e antropólogo Roberto Crema, um dos especialistas do assunto no Brasil e que estará em Brasília no fim do mês para uma palestra sobre a área.

O normótico é aquele indivíduo acomodado em uma vida normal, cheia de padrões, e que segue o rebanho pelo simples fato de ser um senso comum. “É um alguém que não se diferencia”, complementa Crema. É como se a pessoa fugisse da possibilidade de ser a protagonista da própria existência para ver a falência de projetos vocacionais. Ele é nocivo a si mesmo e está associado a um sistema também caótico. Na opinião de psicólogos e terapeutas, hoje, a padronização de comportamentos é uma tendência. “As pessoas trabalham horas a fio e esquecem da própria saúde. Isso acaba contribuindo e desencadeando distúrbios emocionais”, exemplifica o especialista em análise do comportamento Eduardo Rios da Costa Carvalho.

O Correio reuniu histórias de diferentes moradores de Brasília que encontraram aquilo que Crema denomina vocação e romperam com a normalidade.


Ter um plano de vida e programar o futuro está longe de ser uma raridade. Mas, nos dias de hoje, aquele que só pensa nisso e chega a anular sonhos e vocações pode ser uma vítima da doença. Especialista no assunto vem a Brasília para série de palestras MODELO A SER SEGUIDO
O pai da parapsicóloga, advogada e educadora Aymara Gentil Penna, 63 anos, era índio e sempre incentivou a filha a ser quem ela quisesse, não parecida com alguém e ter um modelo de vida. “Então, tentar não ser normótica foi muito simples, porque ouvia isso do meu pai desde pequena”, comenta. No entanto, conflitos e olhares de estranhamento nunca faltaram na vida de Aymara por ter escolhido viver longe dos padrões. Quando decidiu se mudar para Brasília para ficar com o marido, que morava havia poucos meses na capital, as pessoas falavam que ela estava maluca. “Fechei o consultório que tinha em Florianópolis, deixei a casa, vendi as coisas e mudei toda a minha vida. Para mim, o maior valor era a relação com ele e minha família”, comenta. Aymara conta que a mudança é um processo que as pessoas fazem ao longo da vida. Para ajudar na caminhada, Aymara faz terapia, cuida da saúde e medita. “Claro que, às vezes, tenho atitudes normóticas, mas é estar atento. Busco não entrar no que é normal, como ficar estressado no trânsito ou quando o avião atrasa”, afirma.


FELICIDADE NA COZINHA
Sem nunca ter escutado a palavra normose, o sous-chef de um restaurante na Asa Sul Guilherme Cruxên, 24 anos, fugiu da normalidade e encontrou o que queria. “Na verdade, vejo exatamente o oposto. Vivia uma vida que não me agradava, nem me trazia felicidade. Hoje, sinto-me mais completo, pois sei que tomei a decisão certa”, afirma. Em 2009, Guilherme começou o curso de mecatrônica na Universidade de Brasília (UnB). Desde o início, ele conta que nunca ficou satisfeito com a engenharia. “Conforme os semestres foram passando, senti a necessidade de buscar outras opções que me fizessem mais feliz e realizado. Sempre gostei de cozinhar. Por meio dos pais de uma ex-namorada, donos de restaurante, comecei a ter contato com o mundo da gastronomia e me apaixonei”, relembra. O estudante largou a faculdade na UnB e começou o curso de gastronomia. A mãe o apoiou desde o início, porque já conhecia os dilemas que o filho tinha com a engenharia. Com o pai, porém, não foi a mesma coisa. “Para ele, foi uma mudança muito drástica e difícil. Ele levou pelo menos um ano para começar a aceitar e me apoiar na mudança”, conta.


VIAGENS PARA SE ENCONTRAR
No currículo, o psicólogo e fotógrafo de viagem Guilherme B. Siqueira Labarrere, 33 anos, carrega mais de 31 viagens para diferentes países, 20 mil quilômetros rodados para conhecer a América do Sul, além de planos para viajar à Nova Zelândia. Tudo isso em, aproximadamente, quatro anos. “Vivia uma vida normal até os 29 anos. Com pequenas aventuras e algumas viagens. Dentro da anormalidade, seguia a normalidade. Tinha um consultório, era casado e planejava ter filhos. Tinha os próximos 30 anos programados”, relembra. Em agosto de 2010, Guilherme se separou. Um fato emocional inesperado fez com que o psicólogo revisse a vida. O marido de uma amiga, que morava em Londres, convidou Guilherme a passar um mês lá. Sem impedimentos, decidiu tirar um ano sabático. Há quatro anos, segundo ele, não existe um dia igual ao outro. “Aprendi quatro línguas e vivo uma vida fora do comum. Eu me fascinei pelo lado humano que fui encontrando e que nunca imaginei encontrar”, comenta.


Serviço
Além da normose — Dos trilhos às trilhas
Seminário com o psicólogo e antropólogo Roberto Crema
Data: 20, 21 e 22 de fevereiro de 2015
Local: Unipaz (SMPW, Quadra 8, Conjunto 2, Área Especial Granja do Ipê)
Informações: 8118-5265 e eventos@unipazdf.org.br


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