;Por que comigo? Por que com a minha família? Por que Deus me escolheu? Como será o dia de amanhã? Percebi que não adiantava ficar triste, chateada ou com raiva. Eu deveria aceitar e seguir minha vida, seguir feliz porque é uma doença que tem cura.; O desabafo é parte do primeiro texto escrito pela universitária Priscila Veiga, de 18 anos, no blog criado para contar detalhes da luta contra o câncer. Em fevereiro deste ano, ela teve a confirmação de que a bolinha que crescia em seu pescoço era, na verdade, um linfoma de Hodgkin.
Dois anos antes, ela chegou a procurar um médico e relatou o problema, mas o diagnóstico a deixou aliviada: dor de garganta. A autoconfiança típica da adolescência fez Priscila esquecer a recomendação: ;Se não sumir, você precisa voltar;. ;A bolinha não doía, mas me incomodava quando usava colares. Dizia que era o meu filho;, lembra. À época, os pais e a irmã viviam em Boa Vista por causa do trabalho do pai da jovem. A aprovação no curso de farmácia da Universidade de Brasília manteve Priscila na capital federal e ela passou a morar com a avó. Em uma visita à cidade, notaram o problema no pescoço da filha. Depois de uma bronca, marcaram uma consulta com um endocrinologista.
Enquanto aguardava o resultado, fez uma viagem com o namorado, Raphael Amaral, de 21 anos, para Buenos Aires. Recebeu a notícia quando estava fora do Brasil: tratava-se de um linfoma de Hodgkin, ou seja, o mesmo enfrentado pela presidente em 2009.
De volta a Brasília, buscou informar-se sobre a doença e o tratamento, sempre com o pensamento de que poderia vencer o tumor. Para tanto, o primeiro passo foi reunir o maior número de informações possíveis, e a internet tornou-se a principal aliada de Priscila. O desafio da menina mobilizou parentes e amigos. ;Todo mundo ligava para saber como eu estava e sobre o tratamento. Fiquei cansada de responder sempre as mesmas coisas e decidi criar um blog em que todos poderiam saber o que acontecia;, explica. A inspiração veio das dezenas de páginas com histórias semelhantes à sua que passou a acompanhar.
A colocação do cateter, a primeira sessão de quimioterapia, as impressões de uma adolescente diante de um tratamento tão complexo. Tudo está registrado lá. Em uma das postagens, Priscila consegue até mesmo ver o lado bom do agressivo tratamento quimioterápico. ;Dar adeus à depilação, aprender a usar perucas e lenços e sempre estar diferente e, o principal, poder dormir ou assistir filmes até enjoar, sem ser julgada ou ficar com peso na consciência.; O linfoma, no entanto, não é o único protagonista dos textos. O blog também tem espaço para assuntos tipicamente juvenis, como receitas de cupcake e dicas de maquiagem. Até um tutorial com técnicas para amarrar lenços ela já produziu.
Apesar de sempre tentar manter o bom humor, o excesso de medicamentos, um problema com um cateter e o ganho de peso abalaram a autoestima da universitária. Enquanto enfrentava os dias mais difíceis, uma demonstração de solidariedade comandada pelo namorado e por três amigos levantou novamente o ânimo dela: todos tinham raspado a cabeça. ;Naquele dia, chorei de emoção.; O medo também acompanhou a menina. Nem mesmo os 90% de possibilidade de cura faziam o temor desaparecer. ;Tinha medo de morrer, de não ter forças para aguentar.;
As aulas na UnB acabaram em segundo plano, mas o câncer trouxe coisas boas. Priscila está mais vaidosa. Depois que raspou a cabeça, em 23 de julho, passou a se enfeitar mais. Anéis, pulseiras e esmaltes agora fazem parte da rotina.
Na semana passada, Priscila fez a última sessão de quimioterapia. Das 16 previstas inicialmente pelo oncologista, só precisou de 12. O corpo dela reagiu bem aos medicamentos e até mesmo a radioterapia foi dispensada.
A partir de agora, ela passará por consultas mensais. ;O blog de uma menina que está lutando contra o câncer; vai continuar. ;Foi bom para eu poder contar tudo o que sentia e acho que pode ajudar outras pessoas.;