postado em 31/08/2013 08:00
;Por que comigo? Por que com a minha família? Por que Deus me escolheu? Como será o dia de amanhã? Percebi que não adiantava ficar triste, chateada ou com raiva. Eu deveria aceitar e seguir minha vida, seguir feliz porque é uma doença que tem cura.; O desabafo é parte do primeiro texto escrito pela universitária Priscila Veiga, de 18 anos, no blog criado para contar detalhes da luta contra o câncer. Em fevereiro deste ano, ela teve a confirmação de que a bolinha que crescia em seu pescoço era, na verdade, um linfoma de Hodgkin.
Dois anos antes, ela chegou a procurar um médico e relatou o problema, mas o diagnóstico a deixou aliviada: dor de garganta. A autoconfiança típica da adolescência fez Priscila esquecer a recomendação: ;Se não sumir, você precisa voltar;. ;A bolinha não doía, mas me incomodava quando usava colares. Dizia que era o meu filho;, lembra. À época, os pais e a irmã viviam em Boa Vista por causa do trabalho do pai da jovem. A aprovação no curso de farmácia da Universidade de Brasília manteve Priscila na capital federal e ela passou a morar com a avó. Em uma visita à cidade, notaram o problema no pescoço da filha. Depois de uma bronca, marcaram uma consulta com um endocrinologista.
De cara, teve que fazer uma punção. Em seguida, foi examinada por um hematologista e, na sequência, um oncologista. Apesar de imaginar que não se tratava de algo simples, ao deixar o último consultório, ficou assustada. ;O médico me disse: ;Ou é a doença da Dilma ou é a do Reynaldo Gianecchini, vamos esperar o laudo da biópsia.;;, lembra. Naquele dia, revelou, sem rodeios, a notícia a alguns amigos: ;Falei para eles, com todas as letras, que estava com câncer;.
Enquanto aguardava o resultado, fez uma viagem com o namorado, Raphael Amaral, de 21 anos, para Buenos Aires. Recebeu a notícia quando estava fora do Brasil: tratava-se de um linfoma de Hodgkin, ou seja, o mesmo enfrentado pela presidente em 2009.
De volta a Brasília, buscou informar-se sobre a doença e o tratamento, sempre com o pensamento de que poderia vencer o tumor. Para tanto, o primeiro passo foi reunir o maior número de informações possíveis, e a internet tornou-se a principal aliada de Priscila. O desafio da menina mobilizou parentes e amigos. ;Todo mundo ligava para saber como eu estava e sobre o tratamento. Fiquei cansada de responder sempre as mesmas coisas e decidi criar um blog em que todos poderiam saber o que acontecia;, explica. A inspiração veio das dezenas de páginas com histórias semelhantes à sua que passou a acompanhar.
A colocação do cateter, a primeira sessão de quimioterapia, as impressões de uma adolescente diante de um tratamento tão complexo. Tudo está registrado lá. Em uma das postagens, Priscila consegue até mesmo ver o lado bom do agressivo tratamento quimioterápico. ;Dar adeus à depilação, aprender a usar perucas e lenços e sempre estar diferente e, o principal, poder dormir ou assistir filmes até enjoar, sem ser julgada ou ficar com peso na consciência.; O linfoma, no entanto, não é o único protagonista dos textos. O blog também tem espaço para assuntos tipicamente juvenis, como receitas de cupcake e dicas de maquiagem. Até um tutorial com técnicas para amarrar lenços ela já produziu.
Apesar de sempre tentar manter o bom humor, o excesso de medicamentos, um problema com um cateter e o ganho de peso abalaram a autoestima da universitária. Enquanto enfrentava os dias mais difíceis, uma demonstração de solidariedade comandada pelo namorado e por três amigos levantou novamente o ânimo dela: todos tinham raspado a cabeça. ;Naquele dia, chorei de emoção.; O medo também acompanhou a menina. Nem mesmo os 90% de possibilidade de cura faziam o temor desaparecer. ;Tinha medo de morrer, de não ter forças para aguentar.;
As aulas na UnB acabaram em segundo plano, mas o câncer trouxe coisas boas. Priscila está mais vaidosa. Depois que raspou a cabeça, em 23 de julho, passou a se enfeitar mais. Anéis, pulseiras e esmaltes agora fazem parte da rotina.
Na semana passada, Priscila fez a última sessão de quimioterapia. Das 16 previstas inicialmente pelo oncologista, só precisou de 12. O corpo dela reagiu bem aos medicamentos e até mesmo a radioterapia foi dispensada.
A partir de agora, ela passará por consultas mensais. ;O blog de uma menina que está lutando contra o câncer; vai continuar. ;Foi bom para eu poder contar tudo o que sentia e acho que pode ajudar outras pessoas.;