Jornal Correio Braziliense

Cidades

Grileiros desafiam fiscalização e vendem Terrenos em áreas fictícias

Três décadas depois da criação dos primeiros condomínios irregulares, os grileiros ainda desafiam a fiscalização, a polícia e a Justiça da capital federal. O parcelamento ilegal do solo é um crime rentável e a certeza da impunidade deixa os bandidos cada vez mais audaciosos. Desde 1; de janeiro, 10 pessoas foram presas no DF pela Delegacia do Meio Ambiente (Dema), acusadas de criar lotes inexistentes para lucrar com a venda dos terrenos. No ano passado, os fiscais do governo demoliram 2,9 mil construções irregulares no DF ; uma média de oito derrubadas por dia. Mas o trabalho dos agentes e da fiscalização não é suficiente para inibir a atuação dos criminosos. Pela internet, uma quadrilha anuncia a venda de lotes em região próxima à QI 29 do Lago Sul. Os detalhes do site impressionam quem busca um terreno próximo ao Plano Piloto por preços mais em conta.


Em Samambaia, a ousadia dos grileiros impressionou os investigadores da Dema. O bando criou uma quadra fictícia, com 508 lotes, divididos em quatro conjuntos, todos demarcados com piquetes. A área de 7,5 hectares ; equivalente a quase oito campos de futebol ;, pertence à Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) e não pode ser comercializada. Até agora, a polícia identificou 258 vítimas do golpe. Alguns chegaram a pagar R$ 50 mil por um terreno. O esquema começou a implodir em 28 de dezembro de 2011, quando a falsa corretora de imóveis Maria das Graças de Jesus Corrêa, 53 anos, foi detida em flagrante enquanto mostrava a área para uma família. Ela é apontada como líder da quadrilha e atuava, há pelo menos três anos, na região.


A suspeita é presidente do Centro de Assistência Social Monte Horebe, uma associação de fachada, criada para recrutar interessados em participar de programas habitacionais do GDF. No escritório da entidade, foi encontrada uma escritura falsa usada para convencer os associados de que as terras pertenciam à associação. O Correio teve acesso à uma cópia do documento forjado. O acusado de falsificar os papéis é João Pereira Gomes, 81 anos, que, segundo a polícia, é um dos grileiros mais antigos do DF. O idoso se passava pelo antigo proprietário da porção de terra e contava ter vendido toda área para a associação por R$ 100 mil, em 3 de dezembro de 2010. Um valor considerado irrisório pelo tamanho do lugar. ;Qualquer um que bate o olho na escritura, sabe que ali tem uma fraude. Ninguém compra mais de sete hectares em Samambaia por R$ 100 mil;, afirmou o chefe da Dema, delegado Haílton Cunha.


A escritura sem valor foi autenticada no Cartório do 1; Ofício de Imóveis de Água Fria, em Goiás. Os agentes que trabalham no caso investigam se alguém do estabelecimento ajudou na fraude ou se João Pereira usou apenas o nome do cartório para dar credibilidade à falcatrua. O grileiro estava foragido até o fechamento desta edição. A tesoureira da associação, Marilda Aparecida Campos, 51 anos, responsável pela contabilidade de todo o dinheiro que entrava na conta da empresa, também é procurada.

Organização

A polícia acredita que o bando comandado por Maria das Graças enganou mais pessoas em outras cidades. O grupo era extremamente organizado, a ponto de pagar um topógrafo para desenhar dois mapas da área, com todos os endereços e conjuntos. Na última quinta-feira, a reportagem acompanhou o trabalho de uma equipe da Dema em Samambaia. No momento da inspeção, cinco pessoas chegaram ao lugar e demonstraram interesse na área. O homem que apresentava o local se assustou ao perceber a aproximação dos policias, mas negou qualquer envolvimento. ;Só parei para olhar. Nem sabia que estavam vendendo lotes por aqui;, despistou. Ele será investigado.


A Terracap informou que as terras griladas em Samambaia são públicas e fazem parte de uma área de relevante interesse ecológico (Arie). Essa classificação impede qualquer parcelamento ou ocupação. Segundo a assessoria de imprensa da companhia, a Terracap já está em contato com os órgãos de fiscalização para coibir qualquer construção no local.

Derrubadas
Além de derrubar 2,9 mil edificações de madeira ou alvenaria durante as operações realizadas ao longo de 2011, os fiscais do GDF removeram 196 mil metros de cerca de arame, além de 2,8 mil metros lineares de tapume e 28 mil metros de muro.

Técnica criminosa
O termo grilagem começou a ser usado para caracterizar o parcelamento irregular de terras públicas por conta de uma técnica adotada pelos criminosos. Eles criavam escrituras falsas e colocavam esses documentos em caixas repletas de grilos. Os insetos mastigavam partes das folhas, o que dava uma aparência de papel envelhecido.