A Polícia Civil investiga a morte de um bebê de oito meses no Hospital Regional do Paranoá. Igor Alves da Silva perdeu a vida no último dia 20, depois de chegar à unidade com febre alta. Médicos da emergência injetaram um tranquilizante na criança para entubá-la e, segundo uma funcionária da unidade de saúde, a dose teria sido alta demais para um bebê. A 6; Delegacia de Polícia abriu inquérito ontem para apurar se houve falha e, diante da de autorização dos pais da vítima, fará a exumação do corpo na sexta-feira para verificar se a criança recebeu quantidade inadequada do medicamento. A Secretaria de Saúde informou que o menino morreu por conta de infecção generalizada. A informação consta no atestado de óbito.
A doméstica Maria Gleicivane Alves da Silva, 28 anos, levou o filho ao Hospital Regional do Paranoá na madrugada do dia 18. Ela e o marido, o camelô João Batista da Silva, 26 anos, estavam preocupados, porque Igor apresentou febre alta, que não cessava com remédios. Como a criança não estava com infecção nos ouvidos, nem na garganta, o médico prescreveu um antitérmico. O casal, então, voltou para casa com o bebê.
No começo da tarde do mesmo dia, os pais encaminharam a criança novamente à unidade de saúde do Paranoá. A febre persistia e Maria Gleicivane estava muito preocupada com a saúde do menino. Ele ficou em observação por cerca de cinco horas e, às 21h, recebeu alta. Em casa, tomou sopa e, em seguida, chá de erva-doce. Parecia ter se recuperado.
No dia seguinte, no entanto, a criança continuou a chorar muito. Parecia sofrer de dores no corpo. Maria Gleicivane e João Batista conseguiram um carro emprestado para levá-la outra vez ao hospital. Chovia muito. E o casal estava inquieto diante do persistente mal-estar do bebê. Depois que a criança deu entrada na unidade de saúde, o estado piorou com rapidez. O menino suava muito. ;O lençol ficou todo molhado, e o meu filho estava com o corpo gelado. Naquela hora, comecei a ficar em pânico. Como eu chorava muito, os médicos me pediram para esperar do lado de fora. Mas o meu marido ficou com o Igor;, relembra Maria Gleicivane.
Os profissionais que cuidavam do bebê o colocaram em uma unidade de terapia intensiva (UTI). Como não havia vagas no Hospital Regional do Paranoá, os médicos solicitaram uma ambulância para levar a criança até a unidade de Santa Maria. Enquanto isso, decidiram entubar Igor. Para tanto, deram à criança o medicamento Diazepan, que é usado como tranquilizante, além de recomendado para o tratamento de insônia. Pouco depois, o garoto morreu ; antes mesmo de ser levado à UTI do Hospital de Santa Maria. O óbito foi registrado à 0h58 do dia 20, e os pais realizaram o sepultamento poucas horas depois, no Cemitério Campo da Esperança.
Denúncia
Poucos dias após a morte de Igor, uma funcionária do hospital fez uma denúncia anônima. Segundo ela, os médicos teriam injetado uma ;dose cavalar; de Diazepan no menino, o que teria ocasionado a morte. Diante da informação, os pais procuraram a polícia e registraram ocorrência. Ontem, a 6; DP abriu inquérito para apurar as informações.
O Correio teve acesso ao prontuário de Igor Alves. De acordo com o documento, os profissionais que o atenderam deram ao paciente ;vários bolus (administração intravenosa) com Diazepan;. Mas o prontuário não traz nenhuma referência à quantidade exata de remédio que os médicos aplicaram na criança (leia fac-símile).
A reportagem conversou com médicos, que estranharam a informação inserida no documento. Os funcionários são obrigados a atestar no prontuário a quantidade precisa do medicamento aplicado nos pacientes. No caso de Igor, os médicos do Hospital Regional do Paranoá informaram apenas que deram ;várias doses; do tranquilizante, sem, entretanto, determinar a quantidade. Nenhum representante do Conselho Regional de Medicina foi localizado para comentar o caso.
O delegado-chefe da 6; DP, Miguel Lucena, explicou que vai convocar médicos, enfermeiras e parentes de Igor para prestar esclarecimentos. ;Vamos examinar o prontuário da criança e ouvir todos os envolvidos no atendimento. No atestado de óbito, consta a informação de que o menino morreu por conta de septicemia, que é uma infecção generalizada. Mas vamos apurar os detalhes durante o inquérito;, afirmou. Ele agendou a exumação do corpo com o Cemitério Campo da Esperança para a manhã de sexta-feira. ;Diante da relevância do caso, conseguimos isso em tempo recorde.;
A Secretaria de Saúde informou que, na época da morte, a família não autorizou exames no corpo bebê. ;A direção do hospital esclarece que a equipe médica se propôs a realizar a necropsia logo após o óbito, com o intuito de esclarecer a causa da morte. No entanto, tal procedimento foi negado pela família;, diz uma nota, divulgada pela pasta.
Os familiares de Igor agora esperam ansiosos por um desfecho. Maria Gleicivane diz que a sensação é de revolta, diante da denúncia de suposto erro médico. Ela não liberou a realização de necropsia porque não sabia da possibilidade de falha. ;Eu não autorizei porque achei que não havia necessidade. Mas agora é diferente e acho que a polícia tem que descobrir logo o que aconteceu;, avalia.
Deficit
A falta de espaço em unidades de terapia intensiva é um dos maiores problemas da rede pública. No caso de Igor, não havia lugar na UTI do Hospital Regional do Paranoá e, por isso, os médicos solicitaram a sua transferência para outra unidade com leitos disponíveis. A Secretaria de Saúde garante que vai dobrar o número de UTIs até o fim de 2012.