Estatísticas de trânsito podem ser muito ruins, quando contam as mortes. Ou de esperança, quando somam os sobreviventes. Referência na recuperação de acidentados, a Rede Sarah Kubitschek trabalha com os números de vidas que se envolveram em tragédias e agora demandam cuidados. A partir dos dados de pacientes internados nas unidades do hospital que se tornou referência no tratamento de acidentados, a maior parte deles no trânsito, é possível chegar ao perfil de quem mais se machuca no asfalto. São homens, quase sempre jovens solteiros que não estudaram muito.
Para cada mulher ferida no trânsito, seis homens se machucaram. Eles têm entre 20 e 24 anos. A maioria (62,5%) ainda não assumiu compromisso sério. São solteiros. E interromperam os estudos antes de completarem o ensino fundamental (41,8%). A cada 10 vítimas, oito vivem nas cidades. Acidentam-se, muitas vezes, em rodovias com velocidade entre 61km/h a 100km/h.
Dos pedestres que foram atropelados e chegam para reabilitação no Sarah, 39% tiveram traumatismo cranioencefálico (TCE), ou seja, bateram a cabeça, machucaram o cérebro. São as piores lesões, mudam comportamentos, afrouxam personalidades, amargam temperamentos, cegam, silenciam. De todos os pacientes tratados atualmente pelo Sarah, 24% tiveram TCE.
As pancadas na medula são muito comuns nos acidentes de trânsito também. Paralisam os movimentos da cintura para baixo (paraplegia), às vezes do corpo todo (tetraplegia). Entre os pacientes do Sarah, 57% foram internados com esses golpes que aprisionam os movimentos. O dado faz parte de pesquisas realizadas pelo Centro Nacional de Controle de Qualidade, que monitora as informações de todos os pacientes que deram entrada no Sarah.
Diferentemente do que se imagina, os prejuízos ortopédicos são os de menor incidência: apenas 12% das vítimas do asfalto tratadas na rede Sarah tinham apenas pés ou braços quebrados. Em geral, as consequências de pancadas em desastres no trânsito são muito mais
graves do que o gesso consegue remediar.
Os acidentes com moto são os que mais expõem a cabeça, que protege a memória, as ideias, as sensações, o comportamento. Nesses casos, o tratamento depende muito da plasticidade neuronal, quando uma parte do cérebro assume a função que se perdeu com a pancada. O Sarah trabalha com uma forma alternativa de recuperar casos graves de TCE, ensinando as vítimas a lidarem com as perdas valorizando o que restou. %u201CÉ possível resgatar qualidade de vida em casos seríssimos. Mas é fundamental dizer às pessoas em plena saúde que usem o cérebro para pensar, que não percam a cabeça no asfalto, que avaliem se vale a pena se arriscarem%u201D, convida à reflexão Lucia Willadino, a diretora-executiva do Sarah.