As fortes chuvas de fim de ano ameaçam a estrutura dos imóveis centenários da cidade de Goiás (GO), também conhecida como Goiás Velho, distante 310 km de Brasília. O município, que comemorou 10 anos do título de Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade, sofre com as enchentes causadas pelo Rio Vermelho, que corta o centro da cidade. A força da água já assolou o lugar por duas vezes na última década e expõe a falta de investimento para com a infraestrutura local.
Segundo a a superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no estado de Goiás, Salma Saddi, a época de chuvas é sempre sinônimo de preocupação para a cidade histórica. "Monitoramos o nível de água do rio todos os dia nesta época do ano", conta. Ela afirma que o descaso com o Rio Vermelho pode causar sérios problemas se as águas continuarem a subir. "As trombas d;água são normais, mas o rio acaba encontrando a situação perfeita para causar danos. Existem construções pelas margens e muito lixo", completa.
De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a cidade enfrenta as fortes chuvas desde o início do mês. A previsão é que os temporais continuem a cair no município também durante toda a próxima semana. Os militares do Corpo de Bombeiros de Goiás Velho afirmam, no entanto, que os níveis de água ainda não representam sinal de ameaça.
Patrimônio ameaçado
Na última enchente do rio, em janeiro deste ano, duas casas centenárias foram completamente destruídas e 50 outras construções foram danificadas. As chuvas intermitentes deixaram ainda 123 pessoas desalojadas e várias pontes interditadas com risco de desabamento.
Na virada de 2001 para 2002, menos de um mês após o tombamento da cidade, os estragos foram ainda piores. Quarenta casarões tombados pelo órgão ligado à ONU, inclusive o da poetisa Cora Coralina, sofreram sérios danos. Vinte e três lojas à beira do rio foram destruídas. Calçamentos de pedras e postes históricos também viraram ruína.
A secretária de Turismo e Cultura da cidade, Mara Veiga Jardim, afirma que a prefeitura de Goiás tem tomado cuidados para que o estrago não se repita. "Como costumamos dizer aqui em Goiás, o rio já está lambendo a ponte, e a prefeitura está atenta ao nível da água", explica, se referindo ao fato de as águas do Rio Vermelho já estarem atingindo a parte inferior das pontes.
Uma das medidas tomadas é a derrubada de um paredão de concreto, resto de um supermercado que foi levado por uma das enchentes. A construção foi feita às margens do rio. De acordo com ela, o governo do estado deve enviar, ainda na próxima semana, o equipamento para que o muro seja derrubado. A demolição foi aprovada pela Justiça.
Segundo a superintendente do Iphan, o paredão de concreto está longe de ser o maior problema. Os destroços de 14 construções demolidas em um aterro ao longo da Avenida Beira Rio continuam no local e favorecem as enchentes. "Várias pesquisas apontam também que o desmatamento da área próxima ao rio é um potencializador das cheias", explica. "Se a cidade não se mobilizar pela causa, as medidas oficiais vão ser em vão", completa.
Salma afirma ainda que o Iphan, em parceria com o Governo do estado, está em processo de criação de um Comitê Gestor da Bacia do Rio Vermelho,que objetiva minimizar as causas das enchentes e evitar os danos aos prédios históricos.
Construções frágeis
A secretária de Cultura da cidade de Goiás explica que um dos maiores problema da cidade é a estrutura das casas, muito antigas e, geralmente, feitas de pau à pique, taipa e tijolos de adobe, que têm como matéria-prima barro e palha. "Esse tipo de casa não aguenta o excesso de chuva e a umidade, o que pode causar danos irreparáveis", conta Mara.
A superintendente do Iphan discorda que a arquitetura simples seja um problema. "As casas sofridas são as mal conservadas. Não temos problemas com as residências de proprietários que tomam os cuidados necessários", afirma Salma."Os donos de casas consideradas como patrimônio têm direitos, mas também têm deveres", completa.