Metade do dinheiro pago em salários no Distrito Federal vai parar na conta bancária de servidores públicos, um seleto grupo que representa pouco mais de um quinto dos ocupados na capital do país. Exatamente do mesmo tamanho, a outra parte dos rendimentos mensais é repartida entre todos os outros contracheques, incluindo o dos funcionários do setor privado, dos autônomos e dos empresários, responsáveis, juntos, por 78% da mão de obra em atividade na capital do país.
A radiografia do mercado de trabalho do DF nas duas últimas décadas reforça a exorbitante concentração de renda na pequena elite brasiliense e explica por que a economia local depende tanto do funcionalismo público. Os números fazem parte da consolidação da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) desde o início da série histórica, em 1992, feita pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e pela Companhia de Planejamento do DF (Codeplan).
O peso do setor público no chamado nível ocupacional vem diminuindo com o amadurecimento da cidade. Em 20 anos, o total de servidores recuou de 31,6% para 22,2% da força de trabalho empregada. O avanço da participação da iniciativa privada no total de trabalhadores, no entanto, não conseguiu mexer muito na distribuição de renda. O dinheiro que corre em Brasília ainda se concentra, em proporção surpreendente, nas mãos dos servidores. São os funcionários pagos pelo Estado os que têm maior poder de compra e mais segurança para fazer investimentos. Nesses mesmos 20 anos, a participação do funcionalismo na renda total da cidade caiu em ritmo bem menor, recuando de 55,3% para 50%.
Reajustes maiores
Enquanto o rendimento médio real dos ocupados do DF cresceu 5,8% no período analisado, o dos servidores saltou 44,1%, quase oito vezes mais. Apesar da discrepância observada entre as carreiras, os salários do funcionalismo em Brasília são os mais altos do país. Quem passou em concurso público ganha, em média, quase 2,5 vezes mais na comparação com aqueles que não trabalham para o Estado.
[SAIBAMAIS]
É a força dessas estatísticas que seduz os autointitulados concurseiros. Leila Ornelas pode ser considerada uma advogada de sucesso. Com 14 anos de profissão, tem o próprio escritório e, apesar da variação natural da renda média, consegue viver muito bem na capital com um dos maiores custos de vida do país, puxado justamente pelos servidores.
Mesmo assim, aos 39 anos, casada, Leila tomou uma decisão: quer passar em um concurso. Para conquistar o objetivo, Leila se dedicou um ano às aulas em cursinho e agora encontra tempo para encarar os livros em casa. ;Meu sonho é a estabilidade. Hoje, não posso fazer planos, não sei como os juízes vão julgar as ações, fico a bel-prazer do Judiciário;, justifica ela, de olho nos cargos de advogada da União ou procuradora, com salários iniciais de quase R$ 15 mil. ;Não saber quanto vou ganhar no fim do mês me angustia. E quero começar a pensar na minha aposentadoria;, reforça.