Recém-empossado no cargo de diretor-geral da Polícia Civil, o delegado Onofre de Moraes promete tratar as investigações de sequestro relâmpago e roubo com restrição de liberdade como prioridade, independentemente de os delitos serem tratados de forma diferente na esfera penal. Em entrevista ao Correio, ele garantiu que a Delegacia de Repressão ao Sequestro (DRS) será fortalecida, principalmente no fim do ano, quando há uma maior circulação de dinheiro na cidade devido ao pagamento do 13; salário.
Agentes da unidade especializada devem percorrer à paisana os pontos onde os sequestradores costumam atacar mais. ;Se for roubo (com restrição) ou sequestro (relâmpago), a vítima sofre do mesmo jeito. Temos um mapeamento com os locais mais visados pelos criminosos. Nossos policiais vão estar no meio da população apurando e prontos para agir caso algum cidadão seja abordado;, disse.
A discussão em torno do que deve ser considerado roubo com restrição de liberdade ou sequestro relâmpago é vista por especialistas como algo pouco importante para a sociedade. Para a Secretaria de Segurança Pública, apenas 16 das 470 ocorrências em que pessoas foram mantidas reféns por bandidos este ano podem ser qualificadas como sequestro relâmpago. Os 454 restantes foram computados como roubo com restrição de liberdade. A distinção entre os dois crimes ocorreu após a incorporação de um parágrafo ao artigo158 do Código Penal Brasileiro (leia O que diz a lei).
O advogado criminalista e conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Antônio Alberto Vale Cerqueira avalia que modificar a legislação penal não causa impacto algum nas ruas. Na opinião dele, o mais eficaz seria criar políticas públicas de segurança capazes de inibir a atuação de bandidos que praticam delitos dessa natureza. ;Mudar a lei não adianta. O que traria benefícios seria o Executivo adotar mecanismos eficazes para diminuir a impunidade, pois, no Brasil, o que faz as estatísticas de violência se manterem em patamares tão elevados é a certeza de impunidade;, critica.
Entendimento
Ele concorda que há diferença entre os dois delitos, mas que, para efeitos de punição, pouca coisa muda. ;O verbo do crime de extorsão é constranger, enquanto o do roubo com restrição de liberdade é subtrair um bem. No roubo, o bem está ao alcance do agressor. Um exemplo é quando ele entra no seu carro, leva seus pertences e te abandona em algum lugar. Já o delito para ser tipificado como sequestro relâmpago, a vítima deve ser constrangida a fornecer informações para o criminoso ter sucesso na ação. Na extorsão, necessariamente deve haver contribuição da vítima no sentido de ela fornecer seus dados bancários.;
O professor de direito penal da Universidade Católica de Brasília (UCB) Carlos André Bindá Praxedes reforça o que Cerqueira diz. Segundo ele, para haver roubo com restrição de liberdade é fundamental que a vítima permaneça um tempo ;juridicamente relevante; em poder do criminoso. ;Se ele aponta uma arma no semáforo, pede seu celular, você entrega e vai embora, é um roubo simples. Agora, se ele entra no carro e restringe a vítima por tempo juridicamente relevante, que pode ser 10, 15 ou 20 minutos, dispensa a pessoa e foge com carro é, sim, roubo com restrição;, defendeu.
O especialista ressaltou ainda que, devido às proximidades entre os dois delitos, é muito comum que promotores e até magistrados não acompanhem o entendimento do delegado relator do inquérito policial. ;É muito comum juízes condenarem por sequestro relâmpago mesmo quando o inquérito aponta para roubo com restrição de liberdade, e vice-versa. Isso acontece devido à similaridade dos delitos;, finalizou.
Mortes
O comportamento do servidor público Júlio César Moreira Barbosa, 41 anos, mudou bastante depois de acompanhar de perto o drama de amigos que sofreram sequestros relâmpagos, inclusive o caso que resultou na morte de um casal, há 13 anos. Na ocasião, os estudantes Gabriela Adler e Flávio Martins, 22 e 24 anos, respectivamente, conversavam no estacionamento da Universidade do Distrito Federal, no carro da mãe da jovem, quando foram sequestrados. Mesmo após entregarem dinheiro, cartões e senhas, foram assassinados brutalmente às margens da BR-040. Flávio levou dois tiros na cabeça e Gabriela, três.
Há um ano, Júlio teve outro colega levado por criminosos, na 305/306 Sul. Sorte que dessa vez os bandidos se levaram apenas os bens da vítima. ;A sensação de segurança em Brasília piorou muito. Entendo que a violência é um fenômeno nacional, mas aqui o crescimento desordenado contribuiu substancialmente para que crimes como esse se tornassem banais. Já presenciei dois casos, um deles acabou em tragédia. Por isso, procuro não facilitar para não ser surpreendido;, disse.