O imbróglio que envolve três comunidades indígenas e pelo menos oito construtoras do Noroeste desde o início das obras na região parece ter chegado ao fim. Ontem, um acordo firmado entre duas das três etnias ; a Kariri-Xocó e a Tuxá ;, a Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap), a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário do Distrito Federal (Ademi-DF) decidiu que uma área localizada entre o setor habitacional e a Água Mineral será o novo endereço das nove famílias que atualmente vivem em um perímetro de 12 hectares, onde está situado o Santuário do Pajé. Conhecido como Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) Cruls, o local terá o mesmo tamanho do anterior e passará a ser uma reserva indígena com a doação de terreno da Terracap para a União, que, por sua vez, o cederá aos índios.
Embora os representantes tenham chegado a um consenso, uma das famílias não assinou a ata da reunião, na qual constam 12 decisões. Mesmo diante da ausência dela, o presidente da Terracap, Marcelo Piancastelli de Siqueira, adiantou que em breve toda a comunidade será remanejada para a Arie Cruls. ;Conversaremos com essa família. E o mais rápido possível, todos os moradores de lá serão removidos. A Terracap dará todo o suporte e infraestrutura;, declarou. De acordo com o órgão, um Termo de Ajustamento de Conduta em análise entre Terracap, Funai e Ministério Público Federal (MPF) desde 2008, já estudava que os 12 hectares da Arie Cruls passariam a ser uma reserva indígena.
Além das determinações, também foi discutido o retorno das obras da região. Ficou determinado que a partir de amanhã as empresas de construção regressarão às atividades. ;As empreiteiras poderiam ter retornado já hoje (ontem), mas decidimos que, por motivo de segurança, precisaríamos comunicar isso à Secretaria de Segurança Pública do DF antes do retorno, que será na quarta-feira;, afirmou o presidente da Ademi, Adalberto Valadão. Questionado sobre a ordem da juíza Clara da Mota dos Santos, da 11; Vara da Justiça Federal do DF, que proibiu, até 27 de outubro, obras na área reivindicada pelos indígenas, Valadão explicou que a decisão não diz respeito ao adiamento dos trabalhos de edificações das construtoras. ;O documento faz referência a obras de infraestrutura, como a colocação de postes de luz e asfalto;, finalizou.
Sem confronto
Ao contrário da última semana (veja Memória), quando manifestantes chegaram a derrubar cercas das construções e entrar em confronto com policiais militares e vigilantes das empresas, ontem o clima foi de calmaria no local. ;Chegamos a retirar quatro estacas de madeira, mas não teve brigas;, declarou o estudante Jeremias de Paula, 26 anos. O comportamento dos manifestantes é considerado desnecessário pela cacique da tribo Kariri-Xocó, Ivanice Tanoné, 55 anos. ;Não concordo com essa baderna;, pontuou ela.
Segundo a Terracap, os indígenas teriam chegado ao local em 1984. No entanto, a cacique desmente a informação e considera que os primeiros povos se firmaram lá em 1969. ;Chegaram os Tuxá. Em seguida, em 1982, os Funiô, e logo depois os Kariri-Xocó;, descreveu Tanoné. Cláudio Funiô, 47 anos, tem outra versão: ;Viemos de Pernambuco e chegamos em 1959 para ajudar na construção da capital;. Embora a comunidade ressalte que o local é reserva indígena, ontem a Funai voltou a declarar que não considera a região como sendo das etnias. (Colaborou Kelly Almeida)
Homenagem
A Arie é uma área preservada pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) e fica distante 200 metros da Quadra 308 do Noroeste, onde hoje vivem os indígenas. O nome é em homenagem ao líder da expedição que percorreu o Planalto Central, o engenheiro belga Louis Ferdinand Cruls.