A Escola Classe 303/304 Norte amanheceu mais atraente, ao se transformar em uma grande biblioteca. Ontem, havia livros em todos os corredores. A leitura era oferecida a qualquer um que se aproximasse, de graça. O desejo e a curiosidade eram o passaporte para uma viagem rumo ao universo de escritores. Em estandes, os criadores das obras expostas recepcionavam os alunos e os convidavam para embarcar. O cenário faz parte do projeto Vitrine de autores, idealizado pela Diretoria Regional de Ensino (DRE) do Plano Piloto e do Cruzeiro.
O objetivo, além de despertar o interesse pela literatura, é valorizar os professores das salas de leitura, pequenas bibliotecas montadas em colégios públicos. Cada uma das escolas envolvidas ;abraçou; o trabalho de um escritor brasiliense. Após a leitura, crianças de várias idades confeccionaram painéis, fizeram desenhos e abordaram, de diferentes maneiras, o que aprenderam com o tema. O resultado pôde ser visto ontem, no pátio da escola.
Para tirar esse programa do papel, a regional contou com o apoio da Casa de Autores, organização fundada para fomentar o trabalho de escritores de Brasília. Os 24 autores que compareceram passaram por uma verdadeira sabatina com os pequenos leitores. Os exemplares publicados por eles são usados em diversas escolas. Os estudantes ficaram empolgados ao ver de perto aqueles que só conheciam por nome.
Queriam saber como nascem as ideias, por que os escritores escolheram a profissão, se as histórias contadas nos livros têm algo de real e até se jacarés podem voar ; como viram em um dos livros apresentados ;, entre dezenas de outras curiosidades. Além de conversar sobre as publicações, alguns escritores contaram histórias e fizeram encenações.
Pelo menos mil crianças da EC 303/304 Norte e de outros centros de ensino visitaram a exposição. A aluna do 7; ano da EC 306 Norte Karen Bezerra, 16 anos, conheceu dois escritores dos quais já tinha lido obras. ;Depois disso, os livros ficaram ainda mais legais. Soube como foram feitos. Gosto muito de ler. Acho interessante como as histórias trazem coisas sobre a vida da gente. Fico inspirada;, disse a adolescente, que prefere romances a qualquer outro estilo.
Daniela Mendes, 12 anos, colega de sala de Karen, confessa que sempre escolhe livros de autores internacionais, campeões de vendas, como Crepúsculo, sobre vampiros. Ontem, pela primeira vez, ela teve contato com trabalhos de brasilienses. ;Abri meu pensamento para o que é feito aqui. Nem sabia que tinha tanta coisa.; Beatriz Alves, 11 anos, aluna do mesmo colégio, era uma das mais empolgadas. ;Nunca tinha visto nada parecido. Livros levam a gente para um mundo mais interessante. Quando encontro uma história de que gosto muito, não consigo parar. Deixo de ver televisão e tudo;, relatou.
Diálogo
Os autores comemoraram a boa recepção dos leitores infantis. A escritora Rosângela Rocha lançou o livro 3 contra 1, na ocasião. A publicação aborda o bullying. ;Não existe quem nunca tenha sofrido com isso. Eu também fui vítima, quando era pequena. Tirava notas muito boas e ficava excluída da turma por conta disso;, lembrou a autora. ;Ninguém está livre: nem o gordonem o magro nem o baixo nem o alto. O que é contestado é a individualidade. A intenção é ensinar o respeito às diferenças;, esclareceu.
Rosângela também assina o livro A festa de Tati, sobre uma menina com necessidades especiais. Os pais da personagem organizam um churrasco de aniversário para ela, mas acontecem fatos inesperados. ;O tema é delicado, tratado com naturalidade, humor e leveza. Leva os leitores a uma reflexão sobre o preconceito.; As crianças quiseram saber se Rosângela tem deficientes físicos na família e o que a motivou a tratar do assunto. ;Expliquei que não foi por isso, mas porque a deficiência pode acontecer com qualquer pessoa, faz parte da vida.; A EC 416 Sul, uma escola inclusiva, recentemente ganhou o Prêmio de Orgulho Autista e escolheu os livros de Rosângela para trabalhar no projeto.
Temas diversos foram apresentados aos pequenos durante a exposição. O escritor Álvaro Modernell abordou educação financeira, assunto de boa parte de seus oito títulos publicados, com 100 mil exemplares vendidos. ;A abordagem é humanista. Quero ensiná-los a serem felizes no uso do dinheiro. Para isso, eu entro no mundo deles e não o contrário;, explicou. Os meninos e as meninas ouviram atentamente conselhos sobre a importância de economizar para comprar brinquedos, por exemplo.
Lucília Garcez, com 17 livros publicados, apresentou exemplares com temas diferentes, como a arte e a preservação ambiental. ;A gente escreve sozinha e nunca sabe como será a recepção do público, o resultado. Ver as reações deles, o prazer de ler, me deixou muito feliz. Paulo Freire já defendia esse encontro entre autor e leitor;, destacou.
Os educadores também se beneficiaram com a ação. Cássia Roberta Andrade, 46 anos, professora da sala de recursos da EC 303/304 Norte, elogiou a atividade: ;Nada funciona melhor que o corpo a corpo. Ninguém melhor que o autor para explicar o próprio trabalho;. Cássia não vê dificuldade em promover a paixão pela leitura. ;Faço vozes dos personagens, expressões faciais, tudo para que eles se interessem. Basta ensinar que leitura é, antes de tudo, um prazer.;
Apoio à produção local
A Casa de Autores foi fundada em janeiro de 2009. Desde então, reúne brasilienses. É um espaço de discussão e reflexão sobre o fazer literário, da elaboração à publicação. A casa também contata editoras, avalia originais de cada autor e promove lançamentos e oficinas em feiras literárias, escolas e livrarias. Cuida, ainda, de contratos e direitos autorais.