De todos os incêndios florestais, quase a totalidade, ou 99%, é provocada pelo homem de forma intencional ou acidental. O tempo seco, o vento forte e a baixa umidade do ar no Distrito Federal contribuem para o alastramento das chamas e, ao mesmo tempo, dificultam o combate às labaredas. Na maioria das vezes, no entanto, o fogo começa quando alguém decide queimar o lixo ou joga a guimba de cigarro próximo à vegetação. Além disso, a disputa por terras, a grilagem e a especulação imobiliária estão entre os motivos que levam o cidadão a queimar o cerrado. Só este ano, 32.407 hectares do bioma foram consumidos no DF. A área queimada é 290,6% maior do que os 8.296 hectares perdidos ao longo de 2010. E os prejuízos para a fauna, a flora e a saúde da população ainda são incalculáveis.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio) pediu à Superintendência da Polícia Federal que apure as causas do incêndio ocorrido na Floresta Nacional de Brasília (Flona) e em outras cinco unidades espalhadas pelo Brasil. O presidente do instituto, Rômulo Mello, ressalta que a reserva foi criada para evitar loteamentos. ;Isso implica em conflito de interesses, inclusive imobiliários. Temos entre seis a oito situações de incêndios criminosos, mas é preciso aguardar a perícia dos órgãos de segurança;, disse.
Mello defende uma punição mais rigorosa e uma atuação preventiva por parte do Estado e da sociedade. ;No combate, há uma ação integrada das instituições. Mas é importante alertar que o Estado e a sociedade devem se empenhar na prevenção. Em função de uma atitude criminosa, vemos o investimento do Estado ser literalmente queimado;, diz. Na opinião dele, as multas fixadas entre R$ 500 e R$ 5 mil para quem comete crime ambiental são brandas.
No DF, faltam dados consolidados sobre quantos incêndios florestais foram criminosos e, desses, se houve identificação e indiciamento dos autores. A titular da Delegacia Especial do Meio Ambiente (Dema), Eliana Clemente, informa que a Polícia Civil não investiga todos os casos, mas somente os registrados pelos bombeiros. Esses, por sua vez, só denunciam à polícia quando suspeitam de incêndio criminoso. ;Temos que fazer o levantamento. Até porque, qualquer delegacia pode investigar esses casos;, informa a delegada. A punição para quem provoca queimada em mata ou floresta é de dois a quatro anos de reclusão. ;Mas o juiz pode aplicar uma pena alternativa, dependendo das circunstâncias e do seu entendimento;, ressalta Eliana Clemente. A assessoria de imprensa da Polícia Civil informou que poderia passar as estatísticas, mas precisaria de tempo para consolidar os dados.
Sem perícia
As causas e os responsáveis por boa parte dos incêndios florestais jamais serão conhecidos. Além de nem todos serem investigados pela polícia, o Corpo de Bombeiros não faz perícia de todos os casos. ;Mandamos a perícia quando há o interesse institucional ; para descobrir falhas, retroalimentar o sistema, treinar peritos e testar conhecimento e equipamentos ; ou em casos de interesse público, quando há dano ao patrimônio público, à flora e a fauna;, detalha o major Sérgio de Oliveira Francisco, comandante do Centro de Comunicação Social do Corpo de Bombeiros do DF.
De janeiro ao último dia 12, a corporação atendeu 3,1 mil ocorrências de incêndio florestal, ou 9,8% a mais que os registros de 2010. Mesmo não tendo feito a perícia de todos os casos, o major Sérgio de Oliveira afirma que, via de regra, 99% deles começam quando a vegetação entra em contato com fósforo, isqueiro e fogueiras. As descargas atmosféricas, curto-circuito e a combustão espontânea respondem por 1% dos causas. ;Não cabe ao Corpo de Bombeiros apurar a responsabilidade nem a conduta da pessoa. Isso é com a polícia;, explicou o major Sérgio de Oliveira, alertando que, em tempos de seca, a prevenção deve ser uma iniciativa de todos (veja quadro).
Há quatro anos, a eficácia do plano de prevenção e combate a incêndios florestais no DF foi tema da dissertação de mestrado defendida por Robson de Oliveira Lagares, no Centro de Desenvolvimento Sustentável (SDS) da Universidade de Brasília (UnB). O estudo apontou a necessidade de aprimoramento das ações de combate e prevenção de queimadas. Era preciso melhorar a estruturação, bem como aprimorar os dados estatísticos para possibilitar a avaliação permanente da política pública.
A reportagem fez contato com a assessoria de imprensa da Polícia Federal para saber se a investigação solicitada pelo ICMBio teve início e também para pedir um balanço dos incêndios investigados pela corporação ao longo dos últimos anos. Até o fechamento desta edição, não obteve retorno.
Colaboraram Luiz Calcagno e Thalita Lins