As despesas com moradia pressionaram o bolso dos brasilienses nos seis primeiros meses de 2011. A inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), fechou o semestre com alta de 4,89%, superando a média nacional de 3,76%. A taxa de água e esgoto e o aluguel residencial puxaram o encarecimento, registrando os aumentos mais significativos, respectivamente de 7,16% e 6,14%. Como o segundo gasto tem um peso maior no orçamento das famílias do que o primeiro, o principal impacto sentido pelos moradores do Distrito Federal foi o do aluguel. No DF, devido aos preços valorizados do mercado, a despesa responde por 4,66% do custo familiar, enquanto no Brasil o patamar é bem menor, de 2,68%.
;Para o orçamento mensal, um reajuste no aluguel realmente faz diferença. No Distrito Federal, mais ainda em razão do peso;, observa Irene Machado, gerente de Pesquisas de Preços do IBGE. De acordo com ela, um dos motivos para o reajuste salgado da locação de imóveis de janeiro a junho é a disparada do Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), da Fundação Getulio Vargas, indexador da maioria dos contratos entre locatários e imobiliárias. Outro ponto que contribui para a alta é a demanda aquecida por moradia. ;É um fenômeno verificado em todas as áreas do país;, informa a pesquisadora.
Apesar de o IGP-M e o mercado movimentado tornarem a alta do aluguel uma dinâmica de abrangência nacional, a inflação de 6,14% dessa despesa no DF superou o índice médio do Brasil, que ficou em 5,87%. O mesmo se deu em relação à variação da taxa de água e esgoto, que no país teve alta de 4,62%, mais modesta do que a local. O aumento de 7,16% no Distrito Federal está ligado ao reajuste de 7,23% sobre a tarifa de água aplicado pela Companhia de Saneamento Ambiental (Caesb) em março deste ano, após ser autorizado pela Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento (Adasa).
Mais distante
Para a vendedora Maricleide Silvano de Souza, 37 anos, os aluguéis mais caros trouxeram uma consequência prática. No começo deste ano, ela mudou-se da Candangolândia para Taguatinga, uma região mais distante da zona central do DF, com a intenção de desafogar o orçamento. ;Há três meses, vivo em uma casa térrea de dois quartos, bem simples, e pago R$ 500. Na Candangolândia, desembolsava R$ 700 por um imóvel parecido. Cerca de metade do meu orçamento vai para o aluguel, pois ganho pouco mais de R$ 1 mil. O que sobra, eu gasto em alimentação, água, luz e na van da minha filha para ela ir à escola pública. Guardar dinheiro, nem pensar. Vai tudo embora;, comenta.
Vindo de Belém (PA), o gerente de vendas César Augusto Pantaleão Silva, 26 anos, surpreendeu-se com os preços de aluguéis do Distrito Federal quando chegou. Nos 10 anos em que vive no DF, testemunhou o crescimento do mercado imobiliário. ;As áreas foram valorizando e quem não tem renda o suficiente tem que ir para mais longe;, diz o gerente de vendas, que, para morar em uma quitinete de 28 metros quadrados em Águas Claras, desembolsa R$ 600. ;É impressionante. Quem tem renda abaixo de R$ 2 mil não consegue mais morar aqui na cidade;, afirma. César tem sorte, pois, para ele, a negociação do reajuste de aluguel é flexível: o imóvel que ocupa pertence a um amigo.
A alternativa é a mesma adotada pelo estudante de direito Demerius Fernandes de Lima Martins, 25 anos. Ele mora na quitinete de um conhecido no Sudoeste e tem abertura para renegociar os reajustes sobre o aluguel de R$ 900. Mesmo assim, o ex-morador de Recife que está em Brasília há cinco anos acha os preços do DF elevados. ;O aluguel é minha maior despesa. Representa uns 20% do orçamento;, conta.
Prática comum
O vice-presidente do Sindicato da Habitação do Distrito Federal (Secovi-DF), Ovídio Maia, explica que as negociações entre locatórios e imobiliárias, ou diretamente com o proprietário, são comuns. Para ele, a prática constitui uma forma de assegurar que os valores do aluguel não se afastarão muito da realidade a despeito de indexadores e períodos de mercado aquecido. ;O dono do imóvel sempre vai preferir manter o inquilino a ter a unidade desocupada. E a imobiliária tem dados suficientes para orientá-lo nesse sentido;, afirma.
Segundo Ovídio, os resultados do IPCA do primeiro semestre não devem levar os brasilienses a encararem o aluguel como o vilão da inflação no período. ;O aumento é medido pela variação do IGP-M em 90% dos contratos. Isso quer dizer que ele simplesmente reflete a pressão inflacionária dos 12 meses anteriores;, diz. O vice-presidente do Secovi, entretanto, admite que outras variáveis, como demanda em alta, devem ser levadas em conta.
Despesas essenciais
O economista Carlos Alberto Reis, professor da Upis - Faculdades Integradas, chama a atenção para o fato de o aluguel ; e muitos dos outros gastos relacionados à moradia ; ser despesa essencial, difícil de ser flexibilizada ou suprimida. ;Nós temos uma procura por imóveis residenciais acima da capacidade de a economia responder a essa demanda. As pessoas precisam morar e, por isso, submetem-se aos preços. No acumulado dos primeiros seis meses do ano, tivemos a soma disso e dos reajustes de contrato na forma da inflação;, analisa. Reis ressalta que a boa notícia é que no segundo semestre deve haver desaceleração, uma vez que o IGP-M começou a perder força.
O economista Adolfo Sachsida, professor da Universidade Católica de Brasília (UCB), destaca que, como nos últimos anos o IGP-M atingiu patamares ainda mais elevados do que os de tempos recentes ; chegou a atingir 10% ao ano ;, durante um período as imobiliárias deram preferência à negociação e o reajuste do aluguel ficou represado. ;Não foi repassado todo o aumento, e agora pode-se estar compensando o preço defasado. Mas é lógico que o aquecimento do mercado também influi.;
Base
O IGP-M registra a inflação de preços desde matérias-primas agrícolas e industriais até bens e serviços finais. É utilizado para a correção da maioria dos contratos de aluguel no país e como indexador de algumas tarifas, como a de energia elétrica. Subiu 3,14% no acumulado de 2011 e nos últimos 12 meses teve variação acentuada de 8,6%.