Relatório preliminar de uma auditoria em curso no Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans) revela o descontrole no uso da frota de carros oficiais por parte de funcionários do GDF que deveriam dar o exemplo. Entre setembro de 2008 e julho de 2010, assessores vinculados à Secretaria de Transportes cometeram 312 infrações de trânsito. Em alguns períodos, os condutores foram multados por 15 dias seguidos e há registros de cinco multas cometidas pela mesma pessoa em menos de sete horas. A maior parte das penalidades foi aplicada por excesso de velocidade. E o mais grave, os responsáveis penduraram a conta no governo.
A investigação para apurar o volume de multas registradas em carros oficiais foi aberta a partir de uma notificação apresentada pela empresa Rosário Locadora de Veículos ao DFTrans em 27 de julho de 2010. No documento, a firma que presta serviços ao GDF desde 2009, reclama o pagamento de infrações de trânsito no valor de R$ 34.074,67. A quantia foi paga ao Detran pela própria empresa, que, na qualidade de dona dos veículos, optou por quitar o débito para evitar problemas em seus negócios. A Rosário, no entanto, tenta até hoje reaver o dinheiro das multas do DFTrans, órgão com o qual assinou o contrato para o aluguel de 41 carros.
Diante da cobrança, o DFTrans instaurou uma investigação interna para apurar os responsáveis pelas multas. A comissão sindicante descobriu, por exemplo, que, dos R$ 34 mil em infrações cometidas em menos de dois anos, R$ 12 mil são de ocorrências referentes a três Vectras (placas JII-1156, JHH-4545 e JHD-5361) e dois Corollas (JHB-0281 e JHB-0431). No relatório preliminar da sindicância (veja fac-símile), consta que esses carros eram utilizados somente pelos motoristas Afonso A. de Moura e Carlos A. de Souza, ambos da Secretaria de Transportes, e que ;as multas aplicadas a tais veículos, indubitavelmente, cabem a um ou ao outro;.
Os dois motoristas, segundo apontam as investigações, trabalhavam para o ex-secretário de Transportes Alberto Fraga. Em julho de 2009, por exemplo, os pardais flagraram 10 infrações de trânsito, sendo todas referentes ao Corolla JHB-0281, que atendia a Fraga. Em agosto daquele ano, foram mais 13 multas, sendo nove desse mesmo veículo. Em setembro, outras 12 multas. Novamente, todas atribuídas ao Corolla placa JHB-0281 e, em dezembro, outras 13, sendo 12 do mesmo carro que ficava à disposição do ex-secretário. Em fevereiro de 2010, o Detran aponta mais 16 multas. Desse volume de infrações, cinco foram cometidas em apenas um dia, 9 de fevereiro, às 9h14, 11h25, 11h56, 14h28 e 16h07, portanto, em menos de sete horas. Mais quatro multas ocorreram em 23 de fevereiro, às 15h53, 20h48, 21h17 e 21h26. Fraga deixou o GDF na primeira semana de março de 2010.
Evidências
A partir das evidências de abuso, a sindicância ainda em curso chamou algumas pessoas envolvidas no processo para prestarem depoimento. Uma delas foi o executor do Contrato n; 6 de 2008, Celso Marinho da Silva, a quem cabia atestar o serviço contratado pelo DFTrans à locadora Rosário. Ele admitiu aos investigadores que não fez qualquer registro de ocorrência sobre veículos no Sistema de Identificação Automática de Veículos, o SIAV. Perguntado sobre o motivo de não ter registrado as multas cometidas por servidores autorizados a dirigir os carros alugados, alegou que a locadora Rosário não enviava, em tempo hábil, as notificações de infração de trânsito para que a autarquia identificasse os condutores infratores.
Celso Marinho alegou ainda que, no segundo semestre de 2009, recebeu uma quantidade volumosa de multas já quitadas pela Rosário, que, à época, pediu o ressarcimento dos valores. Ele afirmou ter encaminhado os ofícios à Secretaria de Transportes e à Secretaria de Ordem Pública para que os órgãos identificassem os motoristas e providenciassem o pagamento à empresa. A versão de Celso Marinho, no entanto, foi contestada por Silmara Aparecida Zani, responsável destacada pela locadora Rosário para tratar do convênio com o DFTrans. Segundo ela, as multas foram informadas a autarquia em tempo hábil. Em depoimento, Silmara afirmou também ter os protocolos de entrega desses documentos, que comprovariam sua versão.