O governo local nunca conseguiu colocar em funcionamento um sistema de transporte público decente no Distrito Federal. Mas o histórico de gastos com a frota oficial demonstra que o GDF não economizou com a própria necessidade do deslocamento de seus integrantes. Para que eles se locomovam, o Executivo queima uma média de R$ 20,6 milhões por ano. Significa dizer que cada dia útil custa aos cofres públicos R$ 78,9 mil. Nos últimos cinco anos, o volume de dinheiro aplicado na manutenção da frota de carros oficiais alugados do DF chegou a R$ 103,2 milhões. São veículos usados não apenas para as áreas fins ; como os que atendem a hospitais e a escolas ; mas também aqueles colocados à disposição de secretários, administradores, prerrogativa que, até pouco tempo, também era oferecida a 95 subsecretários da administração local.
Investigações a que o Correio teve acesso demonstram a existência de brechas abertas para o exagero. Contratos sem licitação, reajustes abusivos e infrações penduradas na conta do Executivo são alguns dos exemplos que encarecem a provisão da frota oficial.
Em um dos casos apurados, ficou patente que condutores de veículos alugados pelo governo não dão a mínima para as regras de trânsito estabelecidas pelo próprio Poder Público, o que, além de ser um contrassenso, tem reflexo nas finanças do governo. Motoristas que dirigiam para autoridades e deveriam dar o exemplo ignoravam pardais e barreiras eletrônicas. Entre setembro de 2008 e julho de 2010, funcionários do GDF levaram 312 multas, a maioria delas atribuída aos mesmos condutores. O exagero chamou a atenção de gestores, que abriram uma sindicância para investigar o caso. As apurações, ainda em curso, dão conta que um mesmo funcionário chegou a cometer em um só dia cinco infrações (Leia mais na página 27).
O GDF dispõe atualmente de 1,7 mil carros, dos quais 939 são alugados de diferentes empresas (confira quadro). Desde 2007, o volume de dinheiro empregado para cobrir os contratos de aluguel só aumenta. Dados do Sistema Integrado de Gestão Governamental (Siggo) ; que registra a movimentação financeira da administração direta ; revelam a evolução desse tipo de despesa. Com o dinheiro que o governo bancou com os aluguéis de carros ao longo dos últimos cinco anos, R$ 58,2 milhões, poderia ter comprado e somado ao seu patrimônio, pelo menos, 230 ambulâncias ou 2 mil carros populares avaliados em R$ 30 mil cada.
Em vez disso, só em 2007, o governo derramou R$ 10,5 milhões em contratos de locação de veículos, sendo R$ 9,2 milhões somente para Linknet, em um convênio que, à época, não estava respaldado por licitação. A empresa ; que atua prioritariamente na área de informática ; é uma das investigadas na Operação Caixa de Pandora por suspeita de integrar um esquema de corrupção no GDF cuja engrenagem seriam contratos direcionados, que acabavam selados em virtude da dispensa de concorrência pública.
Em termos de cifras para custear o aluguel da frota oficial não há grandes diferenças entre 2007 e 2008, ano em que o governo pagou outros R$ 10,7 milhões pelo serviço. O que mudou foi a saída da Linknet desse mercado no DF. Os contratos migraram para outras seis firmas, que, por meio de licitação, começaram a atender ao governo: Brisa Locadora LTDA., Loc de Veículos Caxangá, Ita Empresa de Transportes, Rosário Locadora de Veículos e Disbrave Locação de Veículos LTDA. Juntas, essas firmas receberam, em 2010, R$ 15.167.543,00.
Só nos primeiros seis meses deste ano, o GDF empregou nos aluguéis dos carros mais R$ 7.941.694. O valor, no entanto, poderia ser R$ 1 milhão mais alto. Não foi porque a Secretaria de Transparência glosou, para a Disbrave, um aumento considerado abusivo. Um reajuste apontado como justo pela atual gestão giraria em torno de 11%. Mas a correção negociada em 2008 aumentaria em quase um terço o valor do contrato, o que acabou chamando a atenção de auditores em um processo do controle interno do governo. ;Um reajuste dentro dos limites legais é natural e aceitamos pagar, mas havia um claro exagero com o qual não estamos dispostos a arcar;, avisou o secretário de Planejamento, Edson Nascimento.
A decisão de negar o pagamento acima dos 11% provocou a reação da Disbrave, que anunciou a intenção de recolher a frota de 470 veículos modelo Gol 1.0 à disposição do governo. No último dia 12, no entanto, a Procuradoria-Geral do DF conseguiu uma liminar que obriga a empresa a manter os serviços até o encerramento do contrato, que vence em outubro. A decisão proferida pelo juiz Giordano Resende Costa, da 6; Vara de Fazenda Pública, leva em conta o princípio da continuidade, segundo o qual a interrupção de serviços essenciais, como os prestados na área da saúde, poderia trazer prejuízos para a população.