Jornal Correio Braziliense

Cidades

Agefis mapeia pelo menos 70 prédios com área comum fechada no Plano Piloto

Levantamento da Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis) mostra que pelo menos 70 edifícios residenciais do Plano Piloto ferem o tombamento da cidade por terem os pilotis fechados de alguma forma. Desses, 40 ficam nas quadras 100, 200 e 300 da Asa Sul e os moradores já foram notificados para que se enquadrem na lei. Ontem, uma equipe da agência removeu as grades que isolavam o Bloco Q da 408 Sul. O prédio tem apartamentos no térreo e, a exemplo de outros, estava cercado havia três anos. Em reportagem na última quarta-feira, o Correio mostrou o cercamento comum na região. Os moradores justificaram a medida como uma forma de trazer mais segurança, uma vez que convivem constantemente com a presença de usuários de drogas e moradores de rua no local. Mesmo com a resistência e os apelos, a Agefis retirou metade da grade. O gerente de Fiscalização de Obras da agência, Roberto Gonçalves, afirma que o condomínio tem o prazo de duas semanas para fazer o restante da remoção. Segundo ele, nos próximos dias, as equipes retornarão para dar continuidade à operação em outros blocos com as mesmas irregularidades. Um grupo de pessoas que reside no Bloco Q tentou, sem sucesso, convencer os fiscais para que cancelassem a derrubada. Todas elas discordam da ação e afirmam ter enfrentado dramas parecidos como o de Laura Campos, 45 anos. A servidora pública mora em um apartamento no térreo do prédio e conta que só teve tranquilidade depois da instalação da grade. %u201CPassava o dia todo com a janela fechada. Já roubaram uma bolsa de dentro de casa. Toda hora, aparecia alguém pedindo dinheiro ou fazendo arruaça. Não tinha o mínimo de privacidade%u201D, justifica. Os moradores pretendem fazer um abaixo-assinado, a ser entregue na Administração Regional de Brasília, para solucionar o impasse. A Agefis detectou o problema no Bloco Q na última quarta-feira. De acordo com Roberto Gonçalves, os responsáveis pelo condomínio do prédio não foram encontrados no dia, mas, nesse caso, a derrubada pode ocorrer de maneira imediata (veja O que diz a lei). %u201CÉ uma ocupação de área pública. O Estado não precisa intimar antes%u201D, explicou o gerente. Intimações As agressões ao tombamento de Brasília se espalham pelos 1,4 mil prédios das asas Sul e Norte. A 206 e a 208 Sul são as regiões em que o problema é maior, segundo a Agefis. Os dois extremos dos pilotis do Bloco F da 208, por exemplo, estão fechados por barras de ferro e viraram estacionamento particular dos moradores. %u201CA cidade mudou. Sons de carro foram roubados mesmo com as grades, imagine se não elas não estivessem lá? Não é justo bater tanto nas grades, enquanto se regularizam os puxadinhos dos comércios%u201D, reclamou a síndica do edifício, Aurelita Pedrosa, 69 anos. O Bloco F, assim como os outros 10 da 208 Sul, foi intimado pela Agefis a demolir as cercas que fecham os pilotis. Desde o início do ano, o órgão faz uma varredura nas 100, 200 e 300 da Asa Sul. Até agora, segundo Roberto Gonçalves, os fiscais passaram pelas quadras das faixas 2 até a 8. O trecho compreende 229 prédios, conforme as estimativas da Administração Regional de Brasília. Ao todo, foram 40 intimações só na Asa Sul. Mais de 90% deles, no entanto, recorreram das ordens administrativas e não removem as irregularidades, enquanto os recursos não são julgados. Apesar de considerar uma agressão ao tombamento, o urbanista Frederico Flósculo, da Universidade de Brasília (UnB), acredita que as prefeituras comunitárias precisam ser incentivadas a discutir o assunto. %u201CA comunidade insegura é desunida. A cerca é o sintoma do problema, e não o problema. É o sinal de que a superquadra está ficando isolada, perdida no espaço%u201D, avaliou. %u201CA intenção era que o pilotis fosse de circulação absolutamente livre. Temos embargado várias obras, em uma parceria importante com o GDF%u201D, afirmou o superintendente do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Alfredo Gastal. O que diz a lei? A Lei nº 2.105, de 8 de outubro de 1998, trata da construção, modificação ou demolição de edificações no Distrito Federal. O artigo 178 determina que a derrubada total ou parcial da obra será imposta quando tratar-se de edificação em desacordo com as normas e não for passível de alteração do projeto arquitetônico para adequação. Quando a obra se encontra em área pública, segundo o documento, a ação pode ser feita de forma imediata. Já o Decreto nº 10.829, de outubro de 1987, dispõe sobre o tombamento do conjunto urbanístico, arquitetônico e paisagístico de Brasília, conforme o plano original de Lucio Costa. No mesmo ano, a Unesco reconheceu a capital federal como Patrimônio Cultural da Humanidade. Uma portaria do Iphan, de 1992, também protege o tombamento.