Jornal Correio Braziliense

Cidades

PMs e bombeiros pressionam Legislativo para aprovar demandas da categoria

Enquanto a população do Distrito Federal sofre com a violência, os profissionais da Segurança Pública se dedicam à luta política. Dois dias após a Secretaria de Segurança admitir que faltam homens para combater a criminalidade na capital, mais de mil militares deverão se reunir em frente à Câmara Legislativa (CLDF) para cobrar a reestruturação das carreiras. Oficiais e praças do Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar prometem lotar a sede do Legislativo hoje, a partir das 11h, para discutir propostas com o presidente da instituição, o distrital Patrício (PT). Entre as sugestões apresentadas, inclusive, está a redução do número de soldados combatentes para aumentar o número de pessoal nas áreas administrativas.

A ação política das corporações tem se tornado parte do dia a dia dos militares. Impedidos de se organizarem em sindicatos e de fazerem greve, esses profissionais participam cada vez mais ativamente da defesa dos interesses das classes. O lobby da categoria local é forte, principalmente na Câmara Legislativa, onde boa parte dos distritais é oriunda do setor (veja o quadro abaixo) e conquistaram os mandatos com os votos dos colegas de farda. Na última terça-feira, os bombeiros demonstraram a força que têm na Casa e lotaram um auditório em claro sinal de corporativismo. A Polícia Civil, por sua vez, é fatiada em grupos políticos que disputam, ostensivamente, o poder na capital da República.

Se são poucos nas ruas, os policiais militares mostram que estão em número suficiente para incomodar o governo e têm pressionado para fazer valer seus interesses. Eles contam com o apoio, inclusive, do presidente do Legislativo. Eleito duas vezes sob a alcunha de Cabo Patrício, o petista foi preso e expulso, em 2000, da PM após liderar a primeira greve da categoria. Anistiado no ano passado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-cabo deve ganhar nova patente. Enquanto isso, mantém grande influência na corporação. Oficiais o acusam, inclusive, de atuar em favor dos praças ; que existem em maior número (veja quadro ao lado) ; e de tentar colocá-los em lados opostos. ;Estávamos unidos na briga pelo aumento salarial, mas agora há divergências;, afirma o coronel João Vítola, da Associação dos Oficiais da Polícia Militar do DF.

A principal insatisfação deles está na possibilidade de aumentar o número de vagas de oficiais administrativos de 350 para cerca de 900 e, consequentemente, reduzir em mais de mil o número de soldados combatentes ; que trabalham nas ruas. ;Se a sensação de segurança já não é a ideal, a tendência do aumento da criminalidade passaria a ser um perigo real;, afirma Vítola. Segundo o coronel Sérgio Aboud, do Corpo de Bombeiros, o crescimento da atividade política dos militares é natural. ;Antigamente, a gente não votava e não fazia diferença para a política, mas os políticos passaram a ganhar com os nossos votos e passamos a ser importantes no sistema;, explica o coronel.

Mas Aboud garante que as manifestações não atrapalham o serviço prestado à população. Ele menciona, como exemplo, a paralisação dos bombeiros no Rio de Janeiro. ;Eles continuaram atendendo a sociedade nos casos de risco iminente da vida. A gente jamais quer prejudicar a sociedade. Isso é questão de consciência;, afirma. Mas a vocação política já faz parte daqueles que ainda nem entraram para a vida militar. Aprovados no último concurso da PM têm frequentado quase que diariamente a Câmara e feito reuniões com os distritais. Eles pressionam pela contratação dos concursados excedentes. A reportagem tentou contato com Patrício, mas, até o fechamento desta edição, o distrital não retornou.

Esclarecimentos
Um batalhão do Corpo de Bombeiros lotou o auditório da Câmara Legislativa na última terça-feira. O motivo: apoiar o comandante da corporação, coronel Márcio de Souza Matos, enquanto ele prestava esclarecimentos à Comissão de Segurança da Casa. Matos foi convocado a dar explicações, entre outros assuntos, sobre a redução no quantitativo de praças e oficiais que atuam nos programas sociais do governo. Mas o que era para ser uma mera reunião entre representantes dos poderes Legislativo e Executivo, transformou-se num evento genuinamente político, com direito a claque e a transporte gratuito, realizado em pleno horário de expediente vespertino. Doze viaturas foram estacionadas no pátio externo da instituição para levar alguns militares ao local.

Cerca de 500 bombeiros, fardados, agiram como se estivessem numa assembleia da categoria. Gritaram, vaiaram, bateram palmas, levantaram cartazes em apoio ao atual comandante. A mobilização, segundo o chefe de comunicação social do Corpo de Bombeiros, major Mauro Sérgio, foi ;voluntária e espontânea;, e garantiu que apenas ;uma minoria estava matando o serviço;. ;Se alguém faltou ao trabalho, o comandante de cada quartel terá que apurar. Não há como saber quantos eram;, afirmou.

Para o Correio, algumas pessoas admitiram ter faltando ao serviço e, também, ter seguido recomendações da cúpula da corporação para comparecerem ao evento. Um dos manifestantes afirmou que não foi ao curso promovido pelo Comando do Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP) porque não houve aulas na tarde da última terça-feira. A corporação confirmou a informação, mas negou que o fato tenha ocorrido devido ao depoimento do comandante, cuja indicação para assumir o posto foi feita pelo governador Agnelo Queiroz (PT), com o respaldo de deputados petistas. O distrital Aylton Gomes (PR), que também é bombeiro, e liderou o movimento pela convocação de Matos, se disse ;surpreso; com a tropa na Câmara. No início da reunião, o distrital chegou a perguntar quem estava em expediente e vários bombeiros não se furtaram em levantar as mãos e indagar. ;Por quê? Vai ter retaliação?;