A menos de cinco dias da greve programada para começar à 0h da próxima segunda-feira, as negociações entre governo, empresários e rodoviários continuam paradas. De um lado, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Distrito Federal (Setransp-DF) pede um aumento de 62% nas tarifas para alcançar o equilíbrio financeiro. A Secretaria de Transportes, por sua vez, não tinha até ontem nenhuma reunião marcada para resolver o desentendimento entre empresários e empregados, que querem reajuste salarial de 16,69%. Enquanto o impasse permanece, cerca de 30% da frota de ônibus do DF permanecem parados devido ao cumprimento de uma decisão judicial. A paralisação prejudica cerca de 300 mil brasilienses, de acordo com cálculos do Sindicato dos Rodoviários.
Desde segunda-feira, as linhas extras que circulavam para atender à demanda nos horários de pico não contam mais com motoristas ou cobradores para manter os ônibus na rua. Os rodoviários alegam que a medida deve-se ao cumprimento de uma ordem judicial do último dia 25, quando a juíza Rosarita Machado de Barros de Caron, da 3; Vara do Tribunal Regional do Trabalho da 10; Região (TRT 10), julgou procedente ação movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) que pedia pelo fim do acordo de produtividade entre rodoviários e empresários. O benefício era pago aos motoristas e cobradores que realizavam a meia viagem, isto é, que circulavam nos horários de pico para atender a demanda.
Segundo a ação, o Setransp deveria pagar horas extras aos rodoviários, e não a bonificação por produtividade que eles recebiam. O Setransp não soube confirmar se as linhas extras prejudicadas pela decisão judicial correspondem de fato aos 900 veículos que deixaram de circular desde segunda-feira. Por meio da assessoria de imprensa, a entidade limitou-se a afirmar que ainda não sabe como as linhas perdidas serão repostas, ou se a regularização da situação dos rodoviários deve implicar num aumento ainda maior de passagens que os 62% pedidos ao governo.
O cumprimento da decisão judicial foi decidido pelos rodoviários em assembleia realizada no último domingo, mesmo dia em que a categoria votou pela greve no próximo dia 13. A redução da frota do transporte público rodoviário causou um aumento de 10% no número de usuários da Companhia do Metropolitano (Metrô-DF), intensificou o fluxo de carros nas principais vias do DF e criou uma disputa por lugares nos poucos ônibus disponíveis. Para compensar a situação, o Metrô anunciou que colocará mais trens circulando nas horas críticas.
Demora
Até que as empresas de transporte coletivo se adaptem à decisão judicial, a Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans) prometeu multar as companhias que não cumprirem com o itinerário determinado pelo órgão. O DFTrans ainda não fechou o balanço de quantas autuações foram emitidas desde segunda-feira. ;A melhor forma de combater o transporte pirata é colocando ônibus em circulação. Ouve um aumento grande de autuações, principalmente em decorrência do não cumprimento das viagens;, garantiu o diretor do DFTrans, Marco Antônio Campanella.
Ao todo, 84 fiscais são responsáveis por reprimir a atividade, mas desde o início da semana carros de passeio e vans recolhendo passageiros nas paradas lotadas são parte de um cenário comum. O Sindicato dos Rodoviários declarou que não tem responsabilidade sobre o transtorno criado pelo indício de greve, ou pela lacuna de demanda tomada pelo transporte clandestino. A Secretaria de Transportes limitou-se a informar, por meio de assessoria de imprensa, que uma nova reunião entre empresários e governo deve ser marcada ainda esta semana.
Atraso e despesa
Na manhã de ontem as paradas mais movimentadas do DF estavam ainda mais abarrotadas de passageiros. Eles acenavam sem sucesso para ônibus que passavam lotados. Quem tinha sorte de conseguir lugar num dos veículos viajou prensado contra outras pessoas ou contra a porta que nem sempre fechava devido ao número excessivo de passageiros. ;O ônibus que deveria passar às 6h40 chegou com 20 minutos de atraso e nem parou por causa da superlotação;, criticou a faturista Silvana Ferrer, 34 anos.
Mesmo sem as paralisações, a moradora de Ceilândia Norte conta que costuma passar 1h40 dentro do ônibus até chegar ao serviço, na W3 Norte. ;O pior é que nem é muito diferente do normal, porque o ônibus sempre vem cheio do Setor O. Falar em aumento de passagem é injusto, com o sistema de transporte ridículo assim;, reclamou.
O possível reajuste de tarifas para até R$ 4,90 também não foi bem recebido pelos usuários do sistema de transporte público do DF. ;Ontem, tive de pagar a linha integrada do metrô para conseguir chegar ao trabalho, mas como ficou muito caro, hoje eu fui a pé para três paradas atrás de um ônibus. Se houver aumento, terá muito desemprego, porque os patrões vão preferir alguém que more mais perto ou ainda vão descontar a diferença do salário;, especulou Ana Paula Albuquerque, 26 anos, moradora do Recanto das Emas.
Radiografia
Entenda a paralisação e o que querem os rodoviários
; Entre motoristas, cobradores, mecânicos e auxiliares administrativos, são 12.000 trabalhadores exigindo o aumento de salário.
; Eles pedem 16,69% de reajuste, o que equivale à inflação acumulada desde o último aumento somada a 10% de ganho real.
; O último reajuste dado à categoria foi em março de 2010, quando eles ganharam 9% de aumento salarial.
; Hoje, o motorista recebe, em média, R$ 1.293 e o cobrador ganha R$ 670 por mês. Caso o reajuste seja concedido integralmente, eles podem receber R$ 1.508,80 e
R$ 781,28, respectivamente.
; Eles ainda pedem pela manutenção de dois benefícios: o tíquete-alimentação de
R$ 270 e a cesta básica de
R$ 112. Esses benefícios estavam garantidos na convenção coletiva que expirou em 30 de abril.
; Os empresários afirmam que seria necessário um aumento de 62% nas passagens. Se o governo concedesse o reajuste, a tarifa de R$ 2 passaria para
R$ 3,20, e a de R$ 3 custaria R$ 4,90.
; O governo se ofereceu para pagar dois terços da passagem dos estudantes, em vez de apenas um terço. Dessa forma, o subsídio do passe livre passaria de mais de
R$ 3 milhões para
quase R$ 7 milhões.
; A decisão judicial do Tribunal Regional do Trabalho retira 30% dos coletivos das ruas nos horários de pico, o equivalente a cerca de 900 ônibus parados, em uma frota de 2.400 carros.
; Segundo o Sindicato dos Rodoviários, 150 mil passageiros são afetados pela medida.
; Caso a greve comece à 0h de segunda-feira, serão 1.680 carros estacionados durante todo o dia, que representam 70% da frota disponível.