Ultrapassar os 20 pontos permitidos por lei na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) ou dirigir embriagado não significa, necessariamente, que o infrator será penalizado no tempo certo. Hoje, devido à falta de pessoal do Departamento de Trânsito do DF (Detran-DF), o número de processos parados na autarquia chega aos 50 mil, estatística que agrega a falta de serviço de 2007 até os dias atuais. Entre eles, 40 mil são referentes a condutores que, de tanto infringir as regras, excederam a pontuação máxima. Todos transitam livremente pelas ruas da cidade. Outros 10 mil documentos estagnados não punem aqueles que desrespeitam a lei seca. Desse total, 7,3 mil foram notificados, mas ainda aguardam resposta de recursos. O restante ainda não recebeu em casa o comunicado para contestar a sanção.
Após receber a autuação, os motoristas têm 30 dias para fazer a defesa prévia. Em seguida, podem recorrer à Junta Administrativa de Recursos de Infrações (Jari) e, em terceira instância, ao Conselho de Trânsito do Distrito Federal (Contrandife). O problema é que, em vez dos 45 dias previstos para passar em cada local, os processos relacionados à embriaguez ao volante têm se estendido por mais de um ano. Só o Contrandife, por exemplo, está com as atividades paradas desde 27 de abril deste ano por não ter realizado nova eleição para compor o quadro do conselho. Hoje, apenas o presidente recebe os recursos, mas não há meios de analisá-los. Os novos integrantes devem começar a atuar amanhã.
Pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o Detran tem até três anos para julgar um processo e cinco para autuar os infratores. Caso isso não ocorra, a punição prescreve. Jorge* já vê seu caso se prolongar por quase dois anos. Autuado em uma blitz, em agosto de 2009, por suspeita de dirigir com o nível de álcool no sangue acima do permitido, o rapaz de 21 anos continua ao volante e não acredita que sua situação seja regularizada tão cedo. ;Entrei com três recursos e eles foram negados. Na segunda-feira, encaminhei o último e vou aguardar resposta. É bom por um lado porque posso continuar a dirigir normalmente. Mas, por outro, é ruim porque não tenho como me planejar para o ano que ficarei sem dirigir, caso o último recurso não seja aceito.;
Tanto tempo de impunidade pode provocar uma descrença da população acerca da aplicação das leis, segundo o especialista em psicologia social e do trânsito da Universidade de Brasília (UnB) Hartmut Gunther. ;Muitas pessoas falam que é preciso educar em vez de punir. Mas o que os cidadãos estão aprendendo? A se comportar de maneira inadequada por não ver consequências pelos atos de outros;, ressalta Gunther.
Morosidade
O diretor-geral do Detran, José Alves Bezerra, alega que a morosidade é reflexo da falta de pessoal. Dos 955 funcionários em todo o quadro do órgão, apenas três são responsáveis pelo protocolo, autuação, classificação e análise dos processos. Por meio de um levantamento feito há 10 anos, chegou-se à conclusão que mais 645 empregados seriam suficientes para suprir as necessidades do local. Porém, na época, a frota de carros do DF era de 688 mil veículos. Hoje, o número de automóveis emplacados já ultrapassa 1, 2 milhão. ;Ainda este mês, perderemos mais um dos nossos funcionários. Ele passou no concurso de procurador e vai assumir em junho. Então, serão apenas dois no setor de análise de processos;, afirma Bezerra.
* Nome fictício a pedido do entrevistado
Punições
A Lei Federal n; 11.705/08 prevê que quem dirige sob influência de álcool deve ter o direito de dirigir suspenso por um ano, além de pagar multa de R$ 957,70. O condutor flagrado tem a carteira de habilitação apreendida e, após resgatar o documento no Detran, é aberto um processo administrativo para imputar a ele as devidas sanções.