Jornal Correio Braziliense

Cidades

MP pede investigação de administradores em esquema de Benedito


Ao apresentar denúncia na última segunda-feira contra o deputado Benedito Domingos (PP), a procuradora-geral de Justiça do DF, Eunice Amorim Carvalhido, requereu o prosseguimento das investigações sobre a participação dos 21 administradores regionais que contrataram, em 2008, empresas ligadas a familiares do distrital para a ornamentação de Natal no Distrito Federal. O inquérito ficará a cargo da Divisão de Repressão aos Crimes contra a Administração Pública (Decap) da Polícia Civil do Distrito Federal que conduz as apurações sobre o caso até o momento. Carvalhido pede que seja apontada a responsabilidade dos gestores que cederam às pressões políticas para fraudarem licitações e beneficiarem o suposto esquema de corrupção.

Todos os administradores prestaram depoimento ao delegado Flamarion Vidal, titular da Decap. A maioria contou a mesma história: disse que participaram de uma reunião com o secretário de Governo, José Humberto Pires, a quem eram subordinados, e ouviram dele o relato de que recursos públicos seriam descentralizados. A intenção do então governador José Roberto Arruda era distribuir o dinheiro de forma que cada administrador pudesse fazer a contratação de empresa responsável pela decoração natalina de sua cidade. Um decreto com as regras foi assinado por Arruda. Vários gestores afirmaram que sabiam do direcionamento da seleção para a empresa de um dos filhos de Benedito, Sérgio Domingos.

Administradores relataram que foram procurados por Sérgio Domingos, já com a proposta de contrato para realizar os serviços. Com a descentralização dos recursos, cada unidade regional teve até R$ 80 mil para aplicar. Por meio de carta-convite, uma modalidade de licitação em que o gestor convida as empresas a apresentar propostas de preços, os administradores tiveram possibilidade de escolher empresas que seriam ligadas ao deputado. De acordo com a Polícia Civil e com o Ministério Público, as prestadoras de serviço agiam em conluio, combinando preços para que sempre vencesse a escolhida pelo grupo. As propostas de preço tinham variações mínimas.

Foi o que aconteceu, por exemplo, na administração de Águas Claras, em que a S4 Produções Visuais, de propriedade do filho de Benedito, venceu a disputa ao propor orçamento de R$ 44.809,00. A MR Produções Visuais se dispôs a assinar o contrato por R$ 44.888,92. O sócio-proprietário da empresa, Marcuzalém Amaral Cunha, também foi denunciado por formação de quadrilha, fraude em licitação e corrupção pela procuradora-geral de Justiça do DF perante o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). O mesmo ocorreu com Sabrina Lima da Silva e Leandro Domingos Silva, respectivamente, nora e neto de Benedito, que representam a LSS Locação e Serviços. Em Águas Claras, a prestadora de serviço apresentou proposta de R$ 44.957,00.

O procedimento teria se repetido em Ceilândia, no Lago Sul, no Lago Norte, no Riacho Fundo 2, no Gama, em Brazlândia, no Recanto das Emas, em Samambaia, no Varjão, em Planaltina, em Sobradinho, em Sobradinho 2, em Candangolândia, em São Sebastião, no Itapoã, no Cruzeiro, no Riacho Fundo 1, em Taguatinga, no Paranoá e no Núcleo Bandeirante. Administradores regionais disseram ter sido pressionados pela cúpula do governo Arruda para contratar as empresas ligadas a Benedito, sob pena de perderem os cargos. Para o Ministério Público do Distrito Federal, esse argumento não livra gestores de acusação de crime.

Parecer jurídico
Além de Benedito Domingos, Eunice Carvalhido incluiu na ação penal Arruda, José Humberto, e os ex-coordenadores de administrações regionais Irio Depieri e Geovani Rosa Ribeiro, que teriam dado a ordem para que os administradores contratassem as empresas. Na apresentação da denúncia, a chefe do Ministério Público do DF pediu ainda uma investigação mais detalhada sobre a participação do então corregedor-geral do DF, Roberto Giffoni, no processo, uma vez que ele teria elaborado um parecer jurídico que respaldou a descentralização dos recursos. A contratação não foi avalizada pela Procuradoria-Geral do Distrito Federal. A denúncia será relatada no TJDFT pelo desembargador Humberto Adjuto Ulhôa.

Na sessão de ontem da Câmara Legislativa, Benedito Domingos não quis falar sobre o assunto ao ser abordado pelo Correio. A defesa de Arruda sustenta que o ex-governador não teve nenhuma ingerência sobre as decisões tomadas pelos administradores regionais, mesmo argumento de José Humberto Pires. Na fase final do inquérito da Polícia Civil do DF, Sérgio Domingos disse à reportagem que tem experiência na prestação de serviços de decoração de Natal. Ele afirma que a sua empresa passou por licitação e venceu por mérito e por ter apresentado proposta de menor preço.

Abertura de processo
O processo tramitará no Tribunal de Justiça do DF e Territórios em virtude do envolvimento do deputado Benedito Domingos, que tem foro especial. Por causa do distrital, os demais denunciados também responderão no Conselho Especial da Corte, integrado pelos 17 desembargadores mais antigos. O processo baixará para um juiz comum na eventualidade de perda do mandato de Benedito.


Cassação em debate

A provável votação do processo por quebra de decoro parlamentar contra o deputado Benedito Domingos (PP) no plenário da Câmara Legislativa já começa a ser tema de debate entre os distritais. O presidente da Casa, Patrício (PT), afirma que, se isso ocorrer, a votação será aberta, conforme estabelece lei de autoria do deputado Chico Leite (PT), segundo a qual todas as deliberações no Legislativo local devem ser conhecidas pela população. ;Temos de fazer valer a alteração à Lei Orgânica do DF aprovada pela própria Câmara;, afirma o distrital.

Apesar da legislação em vigor, o único processo de cassação ocorrido na Casa depois da vigência da norma, envolvendo Eurides Brito (PMDB), foi secreto. Em junho do ano passado, a então deputada conseguiu uma liminar, concedida pelo desembargador Natanael Caetano, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, que garantia sigilo nos votos a serem proferidos pelos distritais, conforme define a Constituição Federal. No caso da peemedebista, o sigilo não evitou que ela tivesse o mandato cassado com o apoio de 16 colegas. Outros três parlamentares se abstiveram e três votaram contra. Eurides aparece em vídeo da Operação Caixa de Pandora recebendo dinheiro das mãos de Durval Barbosa. Ela sustentou que os recursos foram aplicados na campanha de 2006.

Para que Benedito Domingos seja julgado em plenário, no entanto, ainda há um longo caminho. Ele tem até a próxima segunda-feira para entregar defesa prévia na Corregedoria-Geral da Câmara. A partir daí, o corregedor, deputado Wellington Luís (PSC), deverá apresentar um relatório em que recomendará o prosseguimento das investigações na Comissão de Direitos Humanos, Ética e Decoro Parlamentar ou o arquivamento do caso.

A representação contra Benedito se baseou em apuração da Divisão de Repressão aos Crimes contra a Administração Pública (Decap) da Polícia Civil do DF, cujo primeiro relatório foi concluído em janeiro. Desde então, a situação do distrital se complicou com o aprofundamento das investigações e a apresentação da denúncia da procuradora-geral de Justiça do DF, Eunice Carvalhido. A ação penal é uma convicção do Ministério Público do DF de que existem indícios fortes de participação do deputado nos crimes relatados: formação de quadrilha, fraude em licitação e corrupção passiva.

Na denúncia, Eunice Carvalhido pede que o Tribunal de Justiça do DF comunique a Câmara Legislativa sobre a tramitação da ação penal, depois que o Conselho Especial daquela corte deliberar sobre a possível abertura de processo criminal contra Benedito. A sessão que vai julgar o assunto ainda não foi marcada. Depende de relatório e voto do desembargador Humberto Ulhôa. (AMC)

Administrações sob investigação

; Ceilândia
; Lago Sul
; Águas Claras
; Lago Norte
; Riacho Fundo 2
; Gama
; Brazlândia
; Recanto das Emas
; Samambaia
; Varjão
; Planaltina
; Sobradinho
; Sobradinho 2
; Candangolândia
; São Sebastião
; Itapoã
; Cruzeiro
; Riacho Fundo 1
; Taguatinga
; Paranoá
; Núcleo Bandeirante