Hospitais lotados, demora no atendimento e falta de remédios são apenas alguns exemplos da interminável lista de problemas que a saúde pública do Distrito Federal enfrenta. O pontapé necessário para a melhoria dos serviços prestados aos pacientes já foi dado, mas especialistas e os próprios representantes do governo alertam a população: não existem soluções milagrosas para colocar fim a décadas de abandono. A inauguração da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Samambaia, a realização de mutirões de cirurgia e de três transplantes de coração, a abertura de 60 novos leitos de UTI e a compra de medicamentos e de material hospitalar são alguns dos avanços registrados nos 100 primeiros dias. Mas a implantação de outras ações estruturais, como o fortalecimento da atenção básica, ainda depende da contratação de pessoal e as melhorias só serão percebidas a médio prazo.
O Governo do Distrito Federal pretende contratar 5 mil profissionais de saúde ; entre eles, 400 médicos de 32 especialidades. Somente com a chegada desses servidores, será possível abrir todas as 14 UPAs previstas, além de garantir um atendimento mais rápido e eficaz aos milhares de pacientes que procuram as emergências dos hospitais públicos diariamente.
Até mesmo na recém-inaugurada unidade de Samambaia, as reclamações sobre a falta de médicos são frequentes. A estrutura moderna e bem equipada depende de mais profissionais para evitar filas de espera. Na última segunda-feira, a dona de casa Kelly Francisca Pereira, 23 anos, levou a filha Débora, 1 ano, à UPA da cidade. A menina tinha febre e havia vomitado durante toda a noite anterior. Mãe e filha chegaram ao local às 10h, mas os atendentes informaram que não havia nenhum pediatra de plantão. ;O primeiro médico só vai chegar às 13h, acho um absurdo não colocarem pelo menos um pediatra durante a manhã;, reclama Kelly.
A dona de casa Aparecida Pereira de Souza, 37 anos, procurou a UPA por conta de constantes problemas de falta de ar. ;Fui ao Hospital de Taguatinga e me encaminharam para cá. Agora, dizem que não tem médico. Moro em Samambaia e fiquei muito feliz com a inauguração da UPA. Mas vejo que ela não resolveu o problema e que a nossa Saúde ainda está muito ruim;, conta Aparecida. Do lado de fora da unidade, não há nem sequer um banco e os pacientes sentam-se no chão para aguardar atendimento.
Eixos prioritários
O secretário de Saúde, Rafael Barbosa, reconhece que o setor ainda enfrenta ;sérios problemas;, mas ele acredita que as primeiras melhorias já podem ser sentidas. O titular da pasta garante que, até o fim do ano, haverá mudanças ainda mais importantes. ;Conseguimos sucesso nos três eixos que colocamos como prioridade. Primeiramente, garantimos reabastecer a rede. Também fizemos avanços na recuperação da infraestrutura e na contratação de recursos humanos;, explica Rafael Barbosa.
Na última sexta-feira, o secretário assinou as notas de empenho para a construção de 10 unidades básicas de saúde da família para abrigar as equipes que atuam na atenção primária. Até o ano que vem, serão construídas 20 unidades. ;No concurso que estamos organizando, vamos contratar vários médicos da família. Hoje, o programa cobre apenas 16% do DF e a nossa meta é atingir a marca de 50% já no ano que vem;, assegura o titular da Saúde.
Com o fortalecimento da atenção primária e os investimentos nos centros de saúde, o objetivo é esvaziar as emergências dos hospitais. Mas com a situação atual da rede, fica difícil convencer um paciente a não procurar o pronto-socorro. A balconista Maria Lúcia Gomes dos Santos, 33 anos, mora na Quadra 8 da Estrutural e já foi seis vezes ao posto de saúde da cidade desde o mês passado. Ela tenta marcar uma consulta para descobrir a causa das fortes dores que sente nas pernas. ;Não tenho trabalhado direito. Não sei se é algum problema grave de circulação e estou muito preocupada;, conta. ;Não consegui até agora marcar consulta. Acho que vou desistir de esperar e procurar logo uma emergência;, acrescenta a paciente.
O professor de medicina da Universidade Católica de Brasília e especialista em saúde pública Roberto Bittencourt acredita que a inauguração da primeira UPA foi importante para mostrar os novos rumos do governo. ;Essa é uma marca no enfrentamento aos problemas estruturais da Saúde. A partir de agora, será essencial fortalecer a atenção básica e integrar o sistema, coisas que seriam impossíveis de ser executadas nos 100 primeiros dias;, garante o especialista. ;Outra coisa fundamental a partir de agora é mudar o modelo de gestão. Não dá para passar quatro anos em estado de emergência;, acrescenta.