Jornal Correio Braziliense

Cidades

Metade dos 112 mil servidores públicos do GDF tem crédito consignado

Para muitos, a situação fugiu ao controle e a dívida, não raras vezes, consome mais da metade dos rendimentos

O servidor público do Distrito Federal está endividado. Metade dos 112 mil funcionários públicos locais tem crédito consignado contratado atualmente. Dentro desse universo de 56 mil pessoas, muitas atingiram um grau de endividamento problemático. São trabalhadores que gozam de estabilidade e bons salários, mas, mesmo assim, perderam o controle das finanças e, hoje, têm que recorrer a amigos e parentes para fazer face a despesas com as quais anteriormente arcavam com facilidade.

É o caso da técnica em enfermagem aposentada cuja renda é de R$ 5 mil, mas que não pode quitar um aluguel de R$ 1 mil. Ou de uma secretária do Hospital de Base do DF (HBDF) que ganha R$ 3,2 mil, mas deve R$ 120.770 ; o equivalente a três anos de salário. A situação é tão séria que, há 20 dias, o GDF determinou a renegociação dos débitos nos casos mais graves. O BRB alongou de 60 para 90 meses o prazo máximo de parcelamento, e tem a orientação de reduzir ao menor patamar possível o valor das prestações.

As histórias são locais, mas elas se repetem por todo o país. Os servidores públicos são os que se veem envolvidos em situações do tipo com mais frequência. Afinal, como o desconto é em folha, o pagamento é garantido. Outro fator importante é que a possibilidade de um servidor perder o emprego é extremamente remota. Isso faz com que bancos e financeiras liberem mais dinheiro, com menos burocracia, para essa parcela da população.

Bola da neve
Em geral, o endividamento começa com o crédito consignado, modalidade que tem os juros mais baixos do mercado: uma média de 27,1% ao ano, contra 41,9% do crédito pessoal e 165,1% do cheque especial. Por segurança, só 30% da renda podem ser comprometidos. No entanto, antecipações de salário, de Imposto de Renda e de férias são outras vantagens que os bancos oferecem, sendo que servidores costumam ter acesso a elas com mais facilidade do o trabalhador comum. Mais uma vez, há um limite para o teto da dívida. A exemplo do que ocorre com o crédito consignado, o somatório dos demais débitos com desconto em conta-corrente não pode ultrapassar 30% da renda do tomador de crédito. Na teoria, um máximo de 52% do salário líquido original deveria ficar comprometido. Na prática, entretanto, os juros podem fazer com que o débito ultrapasse esse patamar.

Outro fator a ser levado em conta é que esses empréstimos não são a única dívida do tomador de crédito, que frequentemente está preso a outros compromissos. O cheque especial, também debitado automaticamente da conta, está entre eles, bem como o cartão de crédito. Para completar, é comum que, quando o devedor chega a um estágio em que já deve além do que pode pagar, ele saia em busca de dinheiro proveniente de toda e qualquer fonte disponível. Pode ser um banco diferente daquele onde é depositado seu salário, uma financeira que libera empréstimos sem fazer muitas exigências, associações, cooperativas e até agiotas. A essa altura, o endividado está pagando juros sobre juros. E, embora seja difícil acreditar, em alguns anos, uma dívida de R$ 9 mil pode, sim, saltar facilmente para R$ 90 mil.

Cadastro
Em maio do ano passado, o Ministério do Planejamento adotou uma política para evitar a utilização abusiva, por servidores públicos federais, do crédito consignado e de outras modalidades com desconto em conta-corrente. Foi criado um sistema de cadastro, que gerou um código numérico para cada funcionário. Um convênio foi firmado entre o órgão e várias instituições financeiras, que tiveram acesso aos números. Sempre que um servidor tenta obter crédito, a senha é lançada no sistema e é possível detectar se o funcionário já tem o limite de endividamento comprometido com outras instituições bancárias.