Atrair empresas para o Distrito Federal por meio de incentivos fiscais será uma das prioridades do novo governo para a área econômica. O avanço dos setores de comércio e serviços para os arredores do Plano Piloto, observado na última década, como o Correio mostrou na série de reportagens que termina hoje, é um caminho sem volta, na avaliação do secretário de Desenvolvimento Econômico, José Moacir de Sousa Vieira. Para conter o desemprego e ajudar a distribuir a renda na capital do país, chegou a hora, defende ele, de ampliar a base industrial.
Em entrevista concedida após os nove dias de matérias que trouxeram o perfil econômico de 12 regiões administrativas, o secretário disse que o governo está atento ao fenômeno apresentado na série. ;O que ainda está muito centralizado no Plano é o trabalho;, ponderou. Ele avisou que não terá medo de buscar investimentos para o Entorno. ;O que muitos veem como problema, vejo como solução. Podemos, por um lado, até perder em impostos, mas certamente ganharemos com mais emprego e renda para a população do DF;, comentou.
O secretário José Moacir mora em Ceilândia e é dono de uma das principais redes de materiais de construção do DF. Formou-se em administração de empresas pela Universidade Católica de Brasília (UCB) e, antes de pedir demissão e montar o próprio negócio, foi servidor público do Conselho da Justiça Federal. Sem filiação partidária, chegou ao Executivo por indicação do amigo e deputado distrital Chico Vigilante (PT). ;Sou empresário, sei que minha responsabilidade é muito maior. Mas quando se está em um time que torce para tudo dar certo, a chance de desempenho ser melhor aumenta;, afirmou.
Moacir explicou que, no governo de Agnelo Queiroz (PT), a secretaria de Desenvolvimento Econômico vai trabalhar em sintonia com as de Ciência e Tecnologia e a recém-criada de Micro e Pequena Empresa e Economia Solidária. Os dados produzidos pela Companhia de Planejamento (Codeplan), garantiu o secretário, serão usados para impulsionar a economia local. ;Teremos muitas novidades. Muitas grandes empresas já estão interessadas em vir para cá;, completou. Confira os principais trechos da entrevista:
A série do Correio mostrou que a riqueza do DF não se concentra mais no Plano Piloto. O governo tem consciência dessa mudança?
Como morador e empresário de Ceilândia, percebi esse fenômeno antes mesmo de assumir a secretaria. Não há mais fronteiras. A economia do DF, de fato, não depende mais do Plano Piloto. As cidades estão cada vez mais independentes, e essa é uma tendência natural, até mesmo por conta do trânsito intenso. Grandes redes nacionais e internacionais, inclusive, estão presentes em várias delas. O que ainda está muito centralizado no Plano é o trabalho.
Onde empregar os cerca de 190 mil desempregados que existem no DF? Os setores de comércio e de serviços, as grandes forças da economia local, conseguirão absorver esse contingente?
Temos um problema de qualificação profissional. Devido ao alto poder aquisitivo, a mão de obra exigida no DF também é elevada, por menor que seja a função. Além de investir nesse ponto, vamos nos preocupar com os municípios vizinhos. Temos que dar as mãos para os governos federal, de Goiás e de Minas Gerais e atrair indústrias para o Entorno. O que muitos veem como problema, vejo como solução. Podemos, por um lado, até perder em impostos, mas certamente ganharemos com mais emprego e renda para a população do DF.
Que tratamento será dado aos polos industriais dentro do DF?
Vamos agir com cautela. Temos mais de 20 Áreas de Desenvolvimento Econômico (ADEs) e elas estão precárias, por omissão do setor público, mas também por desvirtuamento dos projetos originais por parte dos empresários. Faremos, por exemplo, uma mudança radical no Polo de Modas do Guará. Foram entregues 470 lotes para micro e pequenas empresas de confecção atuarem ali. Quem se transformou em especulador imobiliário será tratado como tal: vamos cancelar os incentivos e colocar os lotes à venda. Quem montou seu negócio dentro do que foi pensado, receberá todo o apoio.
O governo está mesmo disposto a abrir mão de impostos e oferecer incentivos fiscais em nome da criação de emprego e renda?
Sem de dúvida. Incentivo fiscal é importante, mas segurança jurídica é muito mais. Vamos buscar as duas coisas. Nossas decisões serão respaldadas pela equipe jurídica do DF. Em governos anteriores, alguns benefícios deixaram de observar normas legais, talvez pela pressa e mesmo pela pressão empresarial. Ficaremos atentos a isso, para evitarmos transtornos mais à frente.
Em relação ao incentivo que os atacadistas perderam no ano
passado ; o Regime Especial de Apuração do Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços ;, há algo que possa ser feito de imediato?
Vamos buscar uma solução, mas com respaldo legal. Queremos atrair empresas, mas precisamos oferecer a elas segurança jurídica. Não sairemos atropelando as leis para encontrar medidas paliativas. Estamos à disposição para discutir ações definitivas em relação a esse assunto e também quanto a alvarás, escrituras e puxadinhos.
O desenvolvimento do agronegócio no DF tem esbarrado em uma questão básica: os produtores não são donos da terra. Como o governo pretende resolver isso?
Há um grupo de trabalho na Terracap (Companhia Imobiliária de Brasília) cuidando disso e não demoraremos a ter novidades. Resolvido esse ponto, o setor vai caminhar bem porque, sem a titularidade da terra, por exemplo, o DF tem perdido todos os anos recursos do FCO (Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste) direcionados para a agricultura.
É possível pensar a economia do DF além do setor terciário ou o nosso PIB (Produto Interno Bruto) estará sempre atrelado a comércio e serviços?
Um dos nossos desafios é justamente quebrar esse paradigma. No primeiro momento, precisamos aumentar a competitividade das indústrias locais por meio de incentivos fiscais. O segundo passo será aumentar a base industrial. Já temos visitas agendadas e vamos trazer empresas de outros estados para cá, mesmo que em formato de filial ou centro de distribuição. Acredito que a mudança de governo por si só será capaz de atrair novos investimentos. Nenhuma empresa séria do Brasil queria se instalar no DF no meio daquela confusão política.
A economia local consegue caminhar sem o funcionalismo público?
Isso é uma questão cultural. O sonho dos jovens que moram no DF é diferente de quem vive em outros centros urbanos. Os cursinhos preparatórios para concurso estão lotados, enquanto não se encontra a mesma motivação em cursos técnicos, por exemplo. Também é papel do governo e do setor produtivo ajudar a mudar isso e mostrar ao jovem que existe sucesso fora do serviço público.
Há promessas de mudanças na Companhia de Planejamento (Codeplan), mas, de maneira geral, o DF ainda carece de dados oficiais básicos sobre a economia das cidades. É possível tomar alguma medida sem informações precisas?
Só tomaremos decisões com base em dados técnicos, e não em achismos. Quando assumi, buscamos indicadores e, além da dificuldade em encontrá-los, o que existia era defasado. Vamos trabalhar com a Codeplan. Precisamos conhecer os pontos fracos e fortes da economia do DF. Por conta da falta de dados, percebemos que muitas vezes o próprio setor não tem ideia da importância dele.
Cidades do DF têm novo perfil
; Os limites do consumo caíram no Distrito Federal. Na última década, as riquezas locais deixaram de se concentrar no Plano Piloto. Moradores das cidades que rodeiam o centro do poder não precisam mais se deslocar tanto para adquirir bens e contratar serviços. Ao longo de nove dias, o Correio apresentou o perfil econômico de 12 regiões administrativas: Taguatinga, Águas Claras, Ceilândia, Samambaia, Planaltina, Sobradinho, Guará, Santa Maria, Riacho Fundo, Recanto das Emas, São Sebastião e Gama. As reportagens, feitas com base em entrevistas com empresários e moradores e os poucos dados oficiais disponíveis, mostraram o que mudou em 10 anos, indicou as carências que persistem e apontou tendências de investimentos. Apesar de terem enfrentado processos de crescimento semelhantes, as localidades possuem características próprias.
Veja reportagens anteriores
» Novos eixos do desenvolvimento econômico
» A autosuficiência de Taguatinga
» Guará cresce em ritmo frenético
» Samambaia, a preferida do mercado imobiliário
» Novos paraísos do varejo de Rua
» Gama, ponto de encontro do Entorno
» Eixo norte em desenvolvimento
» Comércio chega aos arranha-céus
» Ceilândia, modelo de ascensão social
» Santa Maria - Investimento inibe criminalidade
» São Sebastião - Varejo tira as drogas de cena