A servidora pública Gisela Elias, 46 anos, enfrentou o drama de ter o carro clonado duas vezes em três anos. Entre dezembro de 2007 e outubro de 2008, ela sofreu com o transtorno e neste ano voltou a fazer parte da lista de brasilienses vítimas do golpe. Levantamento da Delegacia de Repressão a Furtos de Veículos (DRFV), obtido com exclusividade pelo Correio, revelou que no ano passado foram registradas 980 ocorrências por modificação de sinal identificador, duas vezes mais que o número de casos de 2009 (leia quadro). Só no primeiro mês de 2011, pwlo menos 113 carros acabaram clonados no Distrito Federal.
O delegado Moisés Martins, titular da DRFV, avaliou que a tendência é de que a modalidade criminosa continue em ascensão. Ele atribuiu a escalada ao maior interesse da comunidade em informar os casos à Polícia Civil do Distrito Federal, além da maior quantidade de carros apreendidos durante as operações. ;Há cerca de quatros anos, a pessoa que tinha o veículo clonado procurava o órgão de trânsito para simplesmente resolver a questão da notificação. Hoje, tanto o Detran (Departamento de Trânsito) como a Polícia Civil orientam que a primeira providência a ser tomada é registrar a ocorrência. No ano passado, fizemos seis grandes operações e todos os veículos das quadrilhas eram adulterados;, destacou.
Na opinião do delegado, as investigações dos crimes de modificação de sinal identificador teriam mais subsídios se as fotos dos pardais identificassem o rosto do condutor com maior qualidade. Ele acredita que essas imagens são essenciais à polícia, pois 70% das infrações que dão origem às suspeitas de clonagem são oriundas dos registros fotográficos. ;As fotografias que são encaminhadas para a delegacia não nos dão alicerce para a investigação. Isso deveria ser uma cláusula de contrato. Dizem que isso ocorre porque essas fotos iriam de encontro ao direito individual das pessoas. Eu não vejo desse jeito. O interesse da coletividade está acima do direito individual;, avaliou Martins.
Sofrimento
O segundo drama de Gisela com a clonagem de veículos vai engrossar as estatísticas da DRFV em 2011. Ela recebeu no último dia 6 uma notificação de autuação do Detran por dirigir acima do limite de velocidade da via. Entretanto, a servidora, proprietária de uma picape Strada, não passou pela BR-040, às 11h11, em 27 de dezembro de 2010. Além de desconhecer o local, Gisela trabalhava no dia e na hora em que a infração foi cometida. O carro dela estava no estacionamento exclusivo para funcionários. ;Na primeira vez em que clonaram meu carro, por acaso meu pai encontrou o outro veículo e conseguimos resolver o problema. Dessa vez, além de desconhecer esse endereço, os faróis e as grades dianteiras da picape que estão na foto da notificação são diferentes da minha;, reclamou.
Para tentar localizar o outro veículo, Gisela, moradora do Lago Sul, vai espalhar cartazes pelo DF e entregar cópias das ocorrências nos postos da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para que o veículo possa ser localizado o quanto antes. ;Já fiz a defesa prévia no Detran. Sou obrigada a comprovar minha inocência. Essa situação não é nada fácil. Sofri bastante da última vez;, lamentou.
Cinco multas registradas na Paraíba
O servidor público Jaime Melo, 45 anos, faz parte da lista dos brasilienses que registraram a clonagem do carro na DRFV em 2010. Ele comprou uma Pajero usada em julho de 2009 e, seis meses depois, foi surpreendido com duas notificações de trânsito que chegaram de Campina Grande (PB). Uma por falta de cinto de segurança e outra por estacionamento irregular. Entretanto, ele e o automóvel nunca foram até a tal cidade. O morador do Guará manteve o carro estacionado na garagem enquanto o clone passeava pela Paraíba. O servidor público procurou a Polícia Civil do DF para registrar uma ocorrência. Também recorreu das infrações.
Em março de 2010, ele recebeu uma terceira notificação, também enviada de Campina Grande. Desta vez, a multa era por estacionamento em fila dupla. Encaminhou, assim, novo recurso ao Detran. Os processos também foram enviados à Superintendência de Trânsito e aos Transportes Públicos de Campina Grande, que, por meio da Secretaria de Recursos Administrativos, entendeu como procedente a defesa apresentada. O órgão pediu que Melo desconsiderasse as notificações. Até o fechamento desta edição, os recursos protocolados no Detran ainda no primeiro semestre de 2010 continuavam em análise.
O tormento que Melo que enfrenta, no entanto, aumentou com a chegada de mais duas notificações, fechando em cinco o total de multas. A primeira infração foi cometida em dezembro do ano passado, também em Campina Grande, por estacionar em local proibido. Já a segunda ocorreu em janeiro de 2011 na BR-101, no Km119, que passa pela cidade de São José de Mipibu (RN). A autuação foi da PRF. O condutor, identificado como Daniel Raiff Lima e Silva, dirigia sem cinto de segurança. Melo não o identificou.
Multa retirada
As multas do servidor público acumulam R$ 553,31 e somam 23 pontos na carteira de habilitação dele. ;Não recebi nem a notificação da última infração cometida em Campina Grande. Só me encaminharam a multa. Postaram a carta na data limite para a defesa prévia. Já as respostas dos recursos dizem para desconsiderar a notificação, mas não tiram o registro do sistema. Já tentei de tudo. Não sei o que fazer. Eu não cometo o crime e tenho que provar a minha inocência. Além disso, posso perder a carteira de habilitação. Também vou pagar o IPVA deste ano e não vou receber o documento. O carro vai ficar na garagem;, lamentou.
O Detran esclarece que as multas ainda aparecem no sistema porque foram cadastradas no Registro Nacional de Infrações de Trânsito (Renainf) pelo órgão responsável da Paraíba. E somente o agente público do estado onde foi praticada a infração pode retirar a multa dos arquivos, para que, em seguida, o Detran-DF finalize os recursos em andamento. A Superintendência de Trânsito e Transportes Públicos de Campina Grande não foi localizada para prestar esclarecimentos.
Fique atento
Confira algumas dicas da Polícia Civil do DF para o caso de suspeita de veículo clonado:
; Em geral, o cidadão percebe que o veículo foi clonado quando recebe multas de trânsito de locais em que não esteve.
; Em primeiro lugar, é preciso registrar uma ocorrência policial;
; O segundo passo é procurar o Detran e entrar com recurso contra a multa;
; O dono do veículo verdadeiro deve colocar no recurso o máximo de evidências que comprovem a clonagem. Detalhes como adesivos e até documentos que comprovem que o carro estava em outro local quando recebeu a multa são importantes;
; Quando isso ocorre, a fiscalização do órgão é alertada e tenta rastrear o carro por meio dos locais das multas ou encaminha informações para o estado no qual as infrações foram cometidas.