Jornal Correio Braziliense

Cidades

Comerciantes da 706 Norte terão que demolir construções em área pública

Comerciantes de sete blocos da SCLRN 706 Norte terão de demolir as construções feitas em áreas públicas. A decisão foi tomada pela 2; Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios e atende, parcialmente, ao pleito da Ação Civil Pública movida há 13 anos pelo Ministério Público do DF contra o Estado e os comerciantes do local. A sentença não estipula um prazo para a retirada, que deve ser feita e custeada pelos donos dos estabelecimentos comercial. O não cumprimento da ordem judicial acarreta em multa diária superior a R$ 2 mil.

A decisão é a última de uma briga judicial que começou em 1998 (leia Entenda o caso). Em 1998, o MPDFT ingressou com ação pedindo o reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Distrital n; 754/94, de autoria do deputado Benício Tavares ; que permitia a regularização de ocupações indevidas de área pública nas regiões administrativas do DF. Além de solicitar a declaração de nulidade dos atos expedidos, o órgão requeria a obrigação de demolir as construções realizadas em áreas públicas e a condenação de comerciantes com indenização pelos danos ao meio ambiente e ao patrimônio público, além da fixação de um valor de multa pelo descumprimento da decisão judicial.

Os comerciantes da região dizem não ter sido notificados. A maioria soube da novidade por meio da imprensa. A notícia gerou revolta. ;Concordo com a retirada, mas por que a determinação vale só para nós, da 706 Norte? Se é para um, tem que ser para todos;, comentou Pilar Bajo, dona de uma mercearia construída pelo pai em 1989. Segundo ela, a ;extensão; existe desde que a loja, localizada no Bloco D, foi inaugurada. Há alguns anos, a família, que mora no primeiro piso do prédio, construiu um segundo andar, feito de alambrado. Pilar se diz tranquila quanto ao desmonte dos puxadinhos. ;Estamos preparados. A estrutura é móvel;, explica.

Polêmica
O comerciante Alberto Mourão, vice-prefeito da quadra, reclama da dificuldade de comunicação com o governo. ;Os procedimentos não são padronizados. Cada órgão diz uma coisa, libera uma coisa. Fica todo mundo perdido, sem entender. Ninguém sabe em que pé estamos. Somos os primeiros a apanhar e os últimos a saber.; O pensamento é compartilhado pelo dono de restaurante Armindo Fortaleza. Desde que deixou o Núcleo Bandeirante para se estabelecer na Asa Norte, Armindo paga Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) referente a uma área de 411 metros quadrados, o que, segundo ele, inclui um local considerado invasão e também o passeio público da dianteira do negócio. ;Este pedaço está incluído na escritura do meu lote. Mas milhares de fiscais e órgãos diferentes já vieram analisar e cada hora um diz uma coisa. Um diz que estou invadindo 10 metros, outros dizem 80. Nem eles sabem direito. Terão que estudar o meu caso com carinho;, diz.

Ele aponta as diversas irregularidades dos prédios próximos e também da quadra vizinha, a SCLRN 705, cujos puxadinhos estão, pelo menos por enquanto, fora da mira da demolição. ;Nenhum prédio respeita o plano original, todos têm as fachadas modificadas. Isso aqui não tem governo que conserte;, alega. Armindo se sente lesado ao ter a edificação contestada enquanto é vizinho de diversas oficinas que, segundo aponta, não têm permissão para funcionar no local.

O promotor Paulo Leite, da Promotoria de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb), explica que há ações judiciais com propostas semelhantes para outras quadras da Asa Norte. ;Há anos esse tipo de ocupação vem acontecendo sem qualquer regulamentação ou respeito à ordem urbanística da cidade. Além da falta de alvará, existe o risco de queda devido à construção precária;, alerta. O promotor afirma que, apesar de ser embasada por uma lei, a ocupação de espaços públicos na Asa Sul também é alvo de ação do MPDFT. Agora, fica a cargo do DF, por meio da Agência de Fiscalização (Agefis), inspecionar e fiscalizar o cumprimento da decisão.

Já o presidente do Conselho Comunitário da Asa Norte, Raphael Rios, gostou da decisão da Justiça. Para ele, é preciso começar a endurecer a fiscalização. ;Isso é um problema muito mais complexo do que imaginamos. Precisamos de pessoas com coragem de tomar as decisões corretas e de não legalizar essas práticas. É preciso entender que ninguém pode fazer o que quer com a área pública. As pessoas têm se apoderado de coisas que não lhes pertencem. Não só no comércio, mas nas casas também.; Ele destaca, porém, que o Estado tem de se fazer presente, mas não apenas por meio da fiscalização. ;É preciso urbanizar a área, dar infraestrutura, iluminação, etc. O poder público tem que estar presente.;

ENTENDA O CASO

Regras definidas
Em 1998, o Ministério Público do DF e Territórios entrou com ação no TJDFT e obteve na 5; Vara da Fazenda Pública do DF uma decisão que determinou a demolição das construções realizadas de forma irregular e a devida volta desses locais a seu estado original. Foi estipulado, ainda, que os comerciantes pagassem indenização pelos danos causados ao patrimônio público e ao meio ambiente. O Distrito Federal não foi condenado. As partes recorreram a instâncias superiores e, em maio de 2010, os autos retornaram ao TJDFT para julgamento do recurso impetrado pelo MPDFT contra a não inclusão do Distrito Federal na condenação de 1; Instância. Nesse meio tempo, em 2005, a Lei 754/94, que autorizava as ocupações irregulares, foi declarada inconstitucional pelo Conselho Especial, tornando nulos todos os termos de autorização de uso de área pública conferidos pelo Distrito Federal a particulares.