Cidades

Pelo menos 30 casas da área tombada de Goiás Velho foram afetadas por chuva

Duas delas sucumbiram e seis continuam de pé graças a escoras. Pontos turísticos estão interditados

Renato Alves - Enviado Especial
postado em 12/01/2011 09:03
Goiás Velho ; As chuvas sobre a região da cidade de Goiás castigam o mais rico patrimônio histórico do estado vizinho do Distrito Federal. O transbordamento de segunda-feira do Rio Vermelho, que corta o município localizado a 310km de Brasília, atingiu ao menos 30 casas da área tombada. Escoras amparam seis delas. Outras duas, com mais de 200 anos, não resistiram aos temporais do início do ano e vieram abaixo. Uma das três seculares pontes de madeira continua interditada por causa do risco de desabamento. Parte do calçamento de pedra também acabou danificada.

As previsões meteorológicas são desanimadoras. As chuvas devem continuar nos próximos 15 dias. Técnicos da Defesa Civil e do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) estão sob alerta e visitam casarões ameaçados para tentar convencer moradores a deixar os imóveis. Pontos turísticos da cidade considerada patrimônio da humanidade estão interditados, sem estimativa de reabertura. O principal deles é a casa onde morou a poetisa Cora Coralina (1889-1985), transformada em museu, à beira do Rio Vermelho.

Apesar da chuva, que ontem caiu em Goiás Velho ; assim é mais conhecido o município ; durante todo o dia, funcionários do museu de Cora Coralina carregaram de volta à casa os objetos pessoais da escritora. Eles haviam sido transferidos às pressas para uma igreja próxima, na manhã de segunda-feira, em meio à enchente do Rio Vermelho, que quase invadiu o casarão. Uma cheia em 2002 (veja Memória) danificou parte desse material, incluindo manuscritos de poesias da autoria. Quase tudo acabou restaurado, em um trabalhou que durou anos.

Com base em um relatório da Defesa Civil, a superintendente do Iphan no estado de Goiás, Salma Saddi, pediu ontem aos curadores do museu de Cora Coralina para mantê-lo fechado por um período mínimo de 10 dias. Ela também implorou para o acervo retornar à Igreja do Rosário, localizada a 100 metros do casarão onde morou a poetisa e hoje é mantido por uma organização não-governamental (ONG) ligada à família dela. No entanto, até o início da noite, tudo continuava na casa de Cora, sem previsão de reabertura do museu.

O chefe do departamento de minimização de desastres da Defesa Civil de Goiás, Luís Renato Lopes, disse que as chuvas estão provocando o aumento súbito de todos os mananciais do estado. Com isso cresce o risco de erosão em estradas, bueiros e pontes. ;As pessoas devem prestar atenção à meteorologia e evitar ficar perto de rios e córregos para não serem surpreendidas pelas águas;, alertou.


Atraso na ponte
Continua complicado o acesso a Goiás Velho. Diferentemente do anunciado, o trânsito na ponte metálica provisória, montada pelo Exército na antiga estrada para a cidade histórica, não foi liberado na manhã de ontem. A estrutura a 200 metros da GO-070 só deve ser aberta aos veículos na manhã de hoje.
A Agência Goiana de Transportes e Obras Públicas (Agetop) chegou a confirmar a liberação do tráfego ao meio-dia de ontem, mas chovia muito no local e a ponte ainda passava por ajustes. Com isso, transferiram a liberação para o fim da tarde, o que também não ocorreu.

A ponte fica no trecho urbano da GO-070 em Itaberaí (GO), a cerca de 40km de Goiás Velho. A rodovia é o caminho usado pelos brasilienses para chegar à cidade tombada. No entanto, a ponte desabou no último dia 4, após as fortes chuvas. Desde então, motoristas enfrentam um desvio de 20km por estradas de terra esburacadas e enlameadas, que aumenta a viagem em até uma hora e meia.

Outra ponte caiu no trajeto entre Brasília e Goiás Velho, para quem escolhe a rota da BR-070. Ela fica entre as goianas Anápolis e Nerópolis, próximo ao Km 16 da GO-222. Sem previsão de reparo da ponte, destruída em 6 de dezembro, moradores da região decidiram passar o dia jogando terra e cascalho no meio das duas metades da ponte que caíram no Ribeirão João Leite.

Alguns motoristas se arriscam a passar pela pista improvisada e perigosa, mediante um pedágio que varia de R$ 10 a R$ 20, dependendo do tamanho do veículo. A outra opção é dar uma volta de mais de 70km.

Planos desfeitos
As dificuldades de acesso afugentam os turistas de Goiás Velho, já raros nesta época do ano devido às chuvas. A ocupação nas pousadas e hotéis do município não passava dos 20% ontem. Como muitos brasilienses, o médico Alexandre Santos, 42 anos, acabou afetado pelos problemas nas estradas. Morador de Goiás Velho há cinco anos, ele aguardava a visita de parentes do DF na virada do ano. ;Minha cunhada e sobrinhos desistiram da viagem ao saber da queda das pontes;, contou.

Para matar a saudade dos familiares, o médico fazia planos de viajar a Brasília no próximo fim de semana, mas também desistiu por causa das pontes caídas e dos longos desvios. Fora o carro dele, a equipe do Correio não encontrou nenhum veículo com placa do DF ontem em Goiás Velho. Os brasilienses são a maioria dos visitantes da única cidade goiana patrimônio da humanidade.

Memória
Rio transborda e destrói
Na virada de 2001 para 2002, Goiás Velho sofreu perdas irreparáveis de construções e objetos centenários com o temporal que caiu por dois dias. O grande volume de água fez transbordar o Rio Vermelho, que corta a cidade, e atingiu todas as construções ribeirinhas, entre elas a casa de Cora Coralina, hoje um museu. O muro da residência foi derrubado e a edificação foi invadida pela correnteza, que levou com ela objetos e anotações pessoais insubstituíveis da poetiza.

A cidade havia recebido o título de Patrimônio da Humanidade em dezembro, menos de um mês antes da inundação. A reconstrução das residências foi motivo de grande briga entre a prefeitura e o instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), pois muitas das adaptações feitas nas casas nos últimos anos não foram mantidas no projeto de restauração.

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